Mais Esportes
None

ESPECIAL JOAQUIM CRUZ

Conheça a trajetória do medalhista olímpico Joaquim Cruz pelas ruas de Taguatinga

Mesmo após 33 anos morando nos Estados Unidos, o campeão olímpico reforça a importância da infância nas ruas de Taguatinga para a formação como atleta

postado em 04/08/2014 09:52 / atualizado em 06/08/2014 11:27

Gustavo Marcondes /Correio Braziliense , Lorrane Melo /Correio Braziliense

Yuugi Makiuchi/CB/D.A Press

Joaquim Cruz não disfarça a nostalgia quando fala da infância nas ruas de Taguatinga. “Nunca esqueci, e nem quero esquecer da minha origem”, afirma, com bastante seriedade na voz, quando perguntado sobre a importância da cidade em sua formação como atleta. Primeiro e único brasileiro campeão olímpico em uma prova de pista no atletismo — título que completa 30 anos nesta semana —, o medalhista de ouro nos Jogos de 1984 revive até os mínimos detalhes das brincadeiras de criança, nos anos 1970, para explicar como se tornou um fenômeno do esporte mundial.

Vindo de um país sem tradição no atletismo de pista, ele saiu do anonimato para, em pouco mais de um ciclo olímpico, vencer os 800m rasos em Los Angeles. “Minha infância foi muito importante no processo que me tornou um campeão. Desde antes da escola, nas ruas, nos campos de terrão que nós mesmo construíamos”, recorda Joaquim Cruz.

“Tímido”, lembra a irmã Elita, Joaquim pulava de galho em galho “igual ao Tarzan” na mata do Parque Ecólogico Lago do Cortado — atrás da casa da QNJ 47, onde morou até mudar para os Estados Unidos, alguns anos depois —, moldando caráter e corpo de atleta. “Passei muitos anos caminhando quilômetros pelo cerrado”, orgulha-se o campeão.

Em 1974, quando entrou na escola, encontrou a estrutura esportiva do Sesi de Taguatinga. Por ser o mais novo dos seis filhos de dona Lídia de Carvalho Cruz, Joaquim foi, naturalmente, um dos mais protegidos. E até os 14 anos, precisava que alguém o acompanhasse aos treinos. Mas o atletismo viria um pouco mais tarde. O começo foi no basquete.

A decisão
Luiz Alberto de Oliveira foi quem insistiu para que Joaquim investisse na pista. “No começo, ele gostava mais do basquete, por causa dos amigos, do jogos coletivo”, relembra o técnico que, pouco depois, o treinaria nos Estados Unidos. “Mas, depois, viu que teria mais chances de representar o Brasil por meio do atletismo”, explica.

Mas a decisão foi sofrida para Joaquim. A primeira experiência com o atletismo, nos Jogos Escolares Brasileiros (JEBs) de 1977, foi traumática. Apesar de ter ficado em terceiro nos 1.500m, terminou a prova sentindo muitas dores pelo cansaço físico. “Nunca mais quero saber disso”, disse o garoto de 14 anos ao treinador.

Givaldo Barbosa/CB/D.A Press - 19/10/1984
“Ele fugia da corrida. Por fazer muito esforço, achava que ia morrer toda vez que acabava a prova”, conta Elita — que coleciona trofeus de provas de corrida de rua —, rindo do irmão, que se escondeu por uma semana do treinador.

O que convenceu Joaquim a dedicar-se às corridas foi o gosto pela vitória. Em 1978, ganhou duas provas do Brasileiro de Menores. O resultado o levou ao Sul-Americano, em que ele conquistou três ouros: 400m, 800m e 4x400m. “Ele queria muito representar o Brasil. E poder ouvir o Hino Nacional três vezes na mesma competição mexeu com ele”, explica o ex-atleta Ricardo Vidal, diretor do Instituto Joaquim Cruz, em Brasília.

Sucesso
Nos dois anos seguintes, o brasiliense de Taguatinga conquistou uma série de vitórias, que culminaram no recorde mundial juvenil no Troféu Brasil de Atletismo de 1981, no Rio de Janeiro. A marca lhe rendeu o convite para estudar e treinar na cidade de Provo, nos Estados Unidos. Em 1983, iria para a Universidade do Oregon consolidar-se como um dos melhores meio-fundistas do mundo.

Os Estados Unidos aperfeiçoariam a máquina de correr que havia sido moldada em terra candanga. “Quando cheguei lá, tinha a explosão dos tempos de basquete e a resistência de tanto correr pelas ruas de terra. Eles até se surpreenderam”, recorda Joaquim. Hoje, aos 51 anos, ele mantém o mesmo corpo esguio de 1984, quando tinha 21 e desfilava sem camisa pelo Oregon — um dos momentos, inclusive, estampa em foto a sala da nova casa da família Cruz em Brasília, ainda em Taguatinga.

Treinador da equipe paralímpica norte-americana, o ex-atleta corre durante os tempos livres em San Diego, onde vive, e tenta, vez ou outra, colocar algum parente na raia. “Mas agora a gente tem essa infeliz da internet”, comenta a mãe, dona Lídia, que depois de criar seis filhos e 13 netos encontra barreiras na educação dos 18 bisnetos e três tataranetos. “Criança, hoje, não brinca na rua. Passa o dia com os botões. É por isso que a gente não tem outro Joaquim Cruz”, teoriza.