Fred Melo Paiva
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DA ARQUIBANCADA

Tá na hora de as coisas voltarem ao normal

Quando eu era pequeno não existia o Atlético perder para o Cruzeiro. Você podia até tropeçar num Uberaba da vida, numa Caldense

postado em 01/04/2017 10:00

Sidney Lopes/EM/D.A Press

Hoje é dia de Atlético e Cruzeiro, o clássico dos clássicos, mundialmente conhecido como João e Crüzeiro – inclusive com o trema que, como sabem os linguistas, é um sinal ortográfico que advém do verbo tremer.

Hoje é dia de ver o Galo de Ouro, a Seleção do Povo na Libertadores. Sim, a “Libertadores do Cruzeiro”, novo naming right para o velho campeonato estadual, antes chamado “Rural” por aqueles que agora não alcançam nem uma finalzinha sequer. Hoje é dia de ver a Massa contra o Tímido Povo. Dia de assistir à subversão da matemática: durante 105 minutos, fica provado que 10% pode ser maior do que todo o resto. Senão no tamanho físico, pelo menos na alma e no gogó.

O Cruzeiro tem medo do Atlético. Mas, sejamos justos, isso não é exclusividade das novas gerações. É desde sempre. João e Crüzeiro é o único derby do Brasil a possuir não exatamente um freguês, mas um cliente VIP. Cujo nome, inclusive, acabou sendo trocado depois de uma derrota humilhante para o arquirrival, passando de Yale para Ipiranga, ou de Ipiranga para Palestra, não sei bem – e não me peça pra olhar no Google, senão os algoritmos vão começar a me mandar coisas do Cruzeiro, e isso ninguém merece.

Não é apenas a desigualdade dos números de vitórias e derrotas que denuncia esse medo indisfarçável e ancestral. Ídolo do Cruzeiro, o lateral Paulo Roberto Costa entregou a rapadura numa entrevista à beira do campo, nos anos 1990, depois de um clássico com vitória do Galo. Disse ele em delação, premiada com vários vídeos no YouTube: “O Cruzeiro treme quando vê esse escudo”. Se o Paulo Roberto falou, é porque é. Eu acredito!

Com o intuito de combater o impeachment da presidente Dilma, denunciar o golpe de 2016 e, agora, protestar contra as reformas de Temer, sindicatos e movimentos sociais se uniram num grande grupo chamado Frente do Povo Sem Medo. O Cruzeiro é isso, só que invertido: é a Frente do Medo Sem Povo, liderada pelo Vicentinho que não é o do PT. E que também não é Vicentinho, mas Vicintin, possivelmente uma versão em mineirês.

Nesta semana, Vicintin tava igual o Temer no Palácio da Alvorada, tremendo de medo de um certo fantasma que, dizem as boas línguas, tratava-se do fantasma da democracia. Temer apressou-se em fazer as malas e se mandou pro Jaburu; ele, Michelzinho e sua conferidora de preços no supermercado.

Não podendo dar no pé como fez o temeroso presidente, Vicintin usou as armas que pôde para combater seu medo atávico do fantasma alvinegro. Na impossibilidade de proibir o próprio time do Atlético de entrar em campo, vetou as crianças que acompanham os jogadores do vestiário ao gramado. Mandante do jogo, proibiu também bumbos e bandeiras do Galo, que certamente lhe apavoram desde a infância. O Atlético recorreu, e bumbos e crianças e bandeiras vão para o jogo. Vicintim deve encontrar-se neste momento escondido debaixo da cama, munido de alho e crucifixo.

Que bobagem a minha, achei que esse medo todo tivesse de alguma forma arrefecido: faz tempo que a gente não ganha do Cruzeiro. Tá na hora de as coisas voltarem ao normal! Quando eu era pequeno não existia o Atlético perder para o Cruzeiro. Você podia até tropeçar num Uberaba da vida, numa Caldense, mas com o Cruzeiro eram favas contadas. Eu me lembro da primeira vez que vi o Atlético perder pro Cruzeiro no Mineirão. Era criança e fiquei assombrado: olhava aquilo como se um disco voador tivesse pousado no gramado. Depois, como sempre, as coisas voltaram ao normal.

(Brinque, tire uma onda, leve na esportiva. Mas não mate nem morra por causa de futebol. #Paz)

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