Fred Melo Paiva
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DA ARQUIBANCADA

Notícias do Estado Atleticânico em véspera de decisão

"No Estado Atleticânico, todo cruzeirense será bem-vindo. Faremos uma campanha para atraí-los: "Venha realizar seu sonho de gritar Galo". O problema é controlar o fluxo migratório"

postado em 06/05/2017 12:00

Bruno Cantini/Atlético
Acabo de me exilar do Brasil. Infelizmente, não havia fundos o suficiente para ir pra Cuba ou Miami, então me exilei do Brasil no Brasil mesmo. Encontro-me neste momento numa pequena vila no Sul da Bahia. Pensei em criar aqui uma guerrilha, derrubar o governo e instaurar uma ditadura. Mas aqui tem tanto atleticano, mas tanto atleticano, que tenho refeito os planos de acordo com as circunstâncias.

O negócio é criar um inocente Consulado do Galo e, a partir dele, cooptar os nativos e fundar o Estado Atleticânico – um país independente do Brasil, uma galocracia fundamentalista, o tão sonhado caminho de Minas para o mar sem a necessidade de invadir e tomar o Espírito Santo. Tudo isso com hino do Galo, bandeira do Galo, uniforme do Galo. Como as vacas da Índia, os galos daqui serão animais sagrados – e nem mesmo o chester será abatido no Natal, por tratar-se da espécie Gallus Gallus.

Pois bem, enquanto esses planos não se concretizam, o jeito é botar um bombril na antena pra sintonizar o Galo no longínquo Brasil. Na última quarta-feira, tão logo os satélites responderam aos sinais emitidos pela versátil palha de aço, me aparece um cruzeirense prestigiando o Atlético em Santa Cruz de la Sierra. Um cruzeirense! Vestido a caráter! No Estado Atleticânico, todo cruzeirense será bem-vindo. Faremos uma campanha para atraí-los: “Venha realizar seu sonho de gritar Galo!”. O problema é controlar o fluxo migratório. Vamos precisar da ajuda de Trump pra construir um muro na fronteira com Minas Gerais. O cruzeirense de Santa Cruz de la Sierra matou de inveja os seus pares em Belo Horizonte, que têm pagado ingresso apenas para ver o Galo, mas ainda não tiveram a sorte de assistir a um baile como o ocorrido na Bolívia. Amanhã, quem sabe?

O cruzeirense de Santa Cruz de la Sierra teve orgasmos múltiplos: 5 contra 1. Era pra ser 5 a 0, ele deve ter se lamentado. Mas não é com um pênalti fajuto que vamos gastar nossa sorte, nossos milagres de São Victor.

Na quarta, vendo Rafael Moura em campo, me lembrei dos tempos das vacas magras, quando dizíamos ser melhor recrutar qualquer um na arquibancada a apostar nos Mixiricas. He-Man só comprova que a tese estava certa: tivéssemos colocado mais torcedores em campo, não teríamos passado por tantos perrengues. E não é só Rafael Moura: Marcos Rocha, também torcedor, voltou a jogar. Mas impressionante mesmo é Otero, nosso anão de jardim bolivariano. Morde como Donizete, chuta como Éder Aleixo. Só não é o melhor achado do futebol mineiro na década porque a gente não achou, a gente comprou.

O Galo está classificado para as oitavas da Libertadores com uma das melhores campanhas da competição. Como cético de meia tigela, ateu não-praticante, começo a vislumbrar sinais de algo transcendental: não é milagre, é o Atlético Mineiro ganhando duas de 5 contra o mesmo adversário, igual 2013. Melhor ataque, igual 2013. Agora faltam 8 jogos, com boa chance de decidirmos todos em casa. Há poucas semanas estávamos no mato sem cachorro. De repente, parece que temos a faca e o queijo na mão. E o cachorro! Se o Galo ganhar uma segunda Libertadores, eu juro que viro hippie na Bahia. O que mais vou desejar nessa vida além de vender umas maricas de durepoxi pra pagar o PF no boteco da esquina?

Já na “Libertadores do Cruzeiro”, naming right do Campeonato Mineiro, estamos a um empate do título. O Galo em curva ascendente, o Cruzeiro em trajetória declinante, penando pra fazer gol em casa no time B da Chapecoense – que, dadas as circunstâncias trágicas, é na verdade o time C ou D. Pra superar a diferença, o Cruzeiro deve jogar com dois homens de amarelo abertos pelas pontas e um 12º elemento-surpresa atuando pelo meio, também de amarelo (esquema parecido com o do Corinthians, Barcelona e Real Madrid). “Benvenuto, Benevenuto!”, saudaram os italianos acostumados a chafurdar no barro preto.

Faz quase dois anos que o Galo não ganha um João e Cruzeiro. Mas foram jogos que nunca estiveram valendo. Agora tá valendo. E quando tá valendo, tá valendo – essa é a lei, a emenda constitucional aprovada por R10. Se o Galo for campeão, lanço amanhã mesmo a pedra fundamental do Estado Atleticânico: uma pedra de gelo no meu Old Eight, sucedida por várias outras, porque não haverá Old Eight que sobreviva à nossa sede aqui neste enclave atleticano prestes a declarar sua independência.