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COLUNA TIRO LIVRE

Sobre volantes e ídolos

O Galo traz em sua trajetória muitos exemplos de volantes que ganharam tanto ou até mais espaço na memória - e na saudade - da torcida quanto goleadores, maestros e arqueiros de renome

postado em 03/02/2017 12:00 / atualizado em 03/02/2017 18:37

 Juarez Rodrigues/EM/D.A Press

A contratação de um atacante de renome costuma encher os olhos dos torcedores. Antes mesmo de o camarada vestir a camisa do clube, os gols que ele (teoricamente, pelo menos) deve marcar já estão no imaginário coletivo. Um armador também mexe com os aficionados por futebol, especialmente os que valorizam a plasticidade das jogadas – nos pés do chamado maestro recai a esperança dos lances geniais, do toque de criatividade, dos passes certeiros. De um grande goleiro são esperadas as defesas milagrosas, e cada intervenção salvadora sedimenta seu caminho rumo ao rol dos ídolos. Zagueiros logo ganham a atribuição de xerifes e para cair nas graças dos torcedores basta garantirem a limpeza da área, seja na base da técnica ou do chutão mesmo. Mas e de um volante? É possível um sujeito cuja missão principal é destruir as jogadas ganhar não somente as disputas, mas também o coração da torcida? Pode o carregador de piano alimentar a expectativa de vitórias? Pois Elias, que começou efetivamente ontem sua caminhada no Atlético, pode crer que sim. E a explicação está na própria história do alvinegro.

O Galo traz em sua trajetória muitos exemplos de volantes que ganharam tanto ou até mais espaço na memória – e na saudade – da torcida quanto goleadores, maestros e arqueiros de renome. São jogadores dos mais variados estilos, que dominaram aquele espaço entre as intermediárias esbanjando elegância ou brigando por cada palmo do gramado como se estivessem no último jogo de sua vida. Muitos deles reuniram até mesmo essas duas características, como Zé do Monte, ícone dos anos 1950 e um dos capitães mais emblemáticos do clube.

Cronologicamente falando e apenas para citar alguns, dessa lista fazem parte Vanderlei Paiva, um dos campeões brasileiros de 1971; Cerezo, que usava a camisa preta e branca como uma segunda pele e dono de um estilo clássico, retrato fiel daquele que um dia foi chamado futebol-arte; Elzo, um leão em campo, legítimo representante da raça cantada e decantada pelos atleticanos; Moacir, prata da casa moldado por ninguém menos que Telê Santana; Doriva, que virou ídolo da torcida pela entrega incondicional ao time; Gallo, o capitão cujo sangue foi até marca de conquista; Gilberto Silva, outro representante do jogo bonito, limpo e eficiente; e, mais recentemente, a dupla Leandro Donizete e Pierre, lutadores incansáveis e eternizados pelos títulos.

Elias chega sob grande expectativa, da torcida e dos críticos. Exigiu que o presidente Daniel Nepomuceno cortasse um dobrado para trazê-lo e, não por acaso, é considerado o maior reforço do Atlético nesta temporada. Sua contratação foi debatida em rede nacional. A torcida foi buscá-lo no aeroporto. Teve recepção de ídolo. Tudo isso construído em cima do que ele já mostrou ser capaz de fazer. Em cima do que ele pode produzir.

Agora, o volante vai sentir a contrapartida desse processo: terá de mostrar serviço para corresponder a toda essa demanda idealizada. Até o técnico Roger Machado já admitiu que espera um crescimento da equipe com a entrada dele. Todas as análises do desempenho alvinegro feitas por cronistas e torcedores neste início de ano passaram, invariavelmente, pela ressalva: “Ah, mas ainda tem o Elias para entrar”. O time está marcando mal? “Mas ainda tem o Elias”. A saída de bola está falha? “Mas ainda tem o Elias”. Faltam opções na transição da defesa para o ataque? “Mas ainda tem o Elias”.

Elias, o Messias? Nem tanto. Aliás, muito distante disso. Sozinho, nada poderá fazer. Para brilhar, terá de integrar um sistema consistente de jogo, com defesa e ataque atuando de forma mais coletiva, harmoniosa e compacta, o que não se viu no Atlético em todo o ano passado e parece ainda ter ficado de herança nesta temporada. Há vícios sérios a serem corrigidos por Roger, e Elias pode ser fundamental nessa missão. Seria o atalho perfeito entre a expectativa criada pela sua chegada e a realidade que a torcida espera ver concretizada.

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