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COLUNA TIRO LIVRE

Caça ao culpado

Ao se demitir um técnico, o dirigente tira de seus ombros a responsabilidade de escolhas ruins

postado em 16/06/2017 12:00 / atualizado em 16/06/2017 17:50

Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press

Quando a fase está ruim. Quando os planos não saem conforme imaginado. Quando o curso da vida muda sem que a gente tenha desejado. Quando a maré vira – pra pior. Geralmente, nesses casos, é iniciada uma insana busca por culpados. O dedo, pronto para ser apontado para aquele que se atreve a desconstruir nossos sonhos, a nos jogar para o poço da desilusão. No futebol, funciona mais ou menos assim: o time entra em crise e logo um exército se posiciona, a postos para o fuzilamento. O principal alvo? Sempre ele, o treinador. O cabeça é, normalmente, o primeiro a ser decapitado. Tendo ou não razão, não importa. É ele o mentor intelectual da derrocada.

É a saída mais fácil para todo mundo, vamos combinar. Ao se demitir um técnico, o dirigente tira de seus ombros a responsabilidade de escolhas ruins. Os jogadores têm seus erros atenuados. A torcida renova sua esperança. Na dança das cadeiras, troca-se apenas o dono do assento. E o próximo já chega sabendo que logo será sua vez de se levantar e sair de mansinho.

Mas nem sempre os caminhos mais fáceis são os que levam para os melhores destinos. Saber se posicionar em um momento de crise, saber como administrá-lo sem passionalidade é um desafio, na vida e, principalmente, no futebol. Ter humildade para admitir as falhas, mais do que sinal de grandeza de espírito, é prova de inteligência. Ninguém está imune aos erros, mas são poucas as pessoas dispostas a reconhecer isso.

Vejamos o cenário atual de Atlético e Cruzeiro, que embora façam campanhas bem diferentes no Campeonato Brasileiro têm em comum a instabilidade. Por vezes, dentro de uma mesma partida. Difícil dizer que a culpa é tão somente dos comandantes, Roger Machado e Mano Menezes – embora eles tenham sua parcela de contribuição na irregularidade.

A última partida dos dois times, na quarta-feira, evidencia bem o fato. No Independência, o Galo buscou o gol diante do Atlético-PR de forma desordenada, quase desesperada. O semblante dos jogadores era de angústia, depois de cada oportunidade perdida. Foram praticamente 90 minutos de um futebol ofensivo, mas ruim, que não passava confiança. A falha de Felipe Santana foi a brecha que o Furacão esperava para chegar à meta de Victor. Não bastasse esse panorama desanimador, o árbitro ainda anulou gol legítimo de Rafael Moura. Ao fim do jogo, vaias. Nas redes sociais, desde então, seguidos “Fora, Roger”. Vejam a equação: busca desordenada pelo gol + falha de Felipe Santana erro da arbitragem. Não dá para pôr o débito apenas na conta do treinador. Ele é uma peça da engrenagem. Existe, acima e abaixo dele, uma estrutura tão responsável quanto.

No Itaquerão, diante do Corinthians, o Cruzeiro foi moroso no primeiro tempo e valente no segundo. Como o Atlético, criou chance para marcar e falhou – uma delas incrível, com Ábila, que em outras ocasiões, em condições muito mais difíceis do que aquela, marcou. A defesa praticamente abriu um corredor para Balbuena, no lance do gol corintiano. E o árbitro ainda ignorou um pênalti no centroavante argentino, que teve a camisa puxada na área. A equação: erro de Ábila cara a cara com o gol posicionamento equivocado da defesa falha da arbitragem. Também não é possível ignorar tudo isso e reclamar apenas de Mano e suas escolhas.

Há casos, sim, em que a troca de comando é necessária. Em que o treinador não mais consegue extrair o melhor de seus jogadores. Mas mesmo quando a saída é essa, é preciso analisar as outras facetas do problema, afinal, futebol é um esporte coletivo, e essa definição, por si só, já basta como argumento.

Tanto no Atlético quanto no Cruzeiro é preciso um acompanhamento mais firme e presente dos dirigentes. Nada de dar murro em mesa, autoridade não se exerce assim. É mais uma questão de assumir sua parcela diante da crise, ou de se posicionar para evitar que ela se instale. E isso é o tipo de atitude que não precisa (e nem deve) ser pública. Da mesma forma que é preciso que os jogadores façam o mea-culpa e tenham mais a oferecer, que façam por onde se aprimorar individualmente – é cada erro, inclusive de fundamento, que em alguns casos fica complicado defender. E aos treinadores, que também têm culpa, que parem de inventar moda. Normalmente, as emendas saem bem pior que o soneto.

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