Libertadores 1997
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LIBERTADORES 1997

Bastidores da Libertadores e do Mundial 97: Ricardinho, Nonato e Célio Lúcio na íntegra

Título do Cruzeiro completa 20 anos neste domingo, 13 de agosto

postado em 13/08/2017 08:04 / atualizado em 13/08/2017 20:10

Leandro Couri/EM/D. A Press
Na Toca da Raposa I, histórico centro de treinamentos do Cruzeiro, os campeões Ricardinho, Nonato e Célio Lúcio concederam entrevista exclusiva ao Superesportes e ao Estado de Minas e contaram em detalhes os bastidores do título da Copa Libertadores de 1997. Da pré-temporada com Oscar Bernardi ao momento em que o capitão Wilson Gottardo ergueu a taça, em 13 de agosto, clube viveu turbulência, precisou trocar o comando e se reforçar. O trio também revela ao torcedor histórias engraçadas de um grupo muito unido. Por fim, eles fazem uma análise da preparação malsucedida para o Mundial de Clubes no Japão, onde o Cruzeiro acabou perdendo o título para o Borussia Dortmund da Alemanha em 2 de dezembro: 2 a 0.

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Vinte anos se passaram desde aquela conquista e a impressão é de que a dimensão do título fica ainda maior a cada ano que passa. Vocês pensam dessa maneira?
 
Nonato: "É porque no momento em que você ganha um campeonato importante igual aquele, você não... tipo assim... não cai a ficha que vai ficar marcado para o resto da vida na história do clube. Aí vai passando o tempo, a cada ano a imprensa ligando para você dar entrevista, a cada aniversário, então isso é muito gratificante para a gente."
 
Ricardinho: "Eu tinha 20 anos na época. Você não vê a dimensão daquele título, né?! Você está ali jogando, se divertindo, e de repente se depara com um campeonato tão importante como a Libertadores... a gente tinha um time bastante unido e conseguimos ganhar. Você vê a dificuldade que é: o Cruzeiro tem quase 100 anos e só tem dois títulos da Libertadores. É um título que todo mundo procura. Graças a Deus deu certo naquele ano."
 
Célio Lúcio: "A gente estava numa época do Cruzeiro que ganhava título todo ano. Supercopa, Copa do Brasil... então, no instante em que a gente ganha a Libertadores, a gente acha que é mais um título normal da carreira. E não é assim. E passam os anos, e aí a gente valoriza mais a importância desse título. Ficaremos marcados nas páginas do Cruzeiro pelo resto da vida, por um título difícil de ser conquistado. E a valorização aumenta com o tempo. Quanto tempo o Cruzeiro... se está fazendo 20 anos dessa conquista, a gente vê como é difícil conquistar uma Libertadores. A importância, a cada dia que passa, é maior."
 
Depois da conquista da Libertadores, o que mudou na vida de vocês jogadores?
 
Nonato: "Eu cheguei mais cedo (ao clube), o Ricardinho ainda era da base. A gente começou a impor um certo respeito na vida do Cruzeiro a nível internacional quando ganhamos as duas Supercopas. São dois títulos internacionais. Em 93 veio a Copa do Brasil. Em 95 veio a Copa Master e a Copa Ouro. Ali os clubes da América do Sul começaram a ver o Cruzeiro com outros olhos. Depois, com a conquista da Libertadores, o respeito foi maior. Aí só foi crescendo a cada ano, cada vez mais. O Cruzeiro foi bicampeão brasileiro, ganhou a Tríplice Coroa, o respeito só foi aumentando."
 
Ricardinho: "Quando você ganha uma Libertadores, tudo muda. Em termos de contrato, de respeito, com a imprensa, com a torcida, outros jogadores de outros clubes te veem de outra maneira. É um clube bem significativo em nível internacional. Isso fica marcado no jogador, e com certeza eleva seu patamar. A gente só vê depois que para de jogar futebol. Por onde você passa – às vezes a gente vai para o exterior –, e o pessoal sempre fala da Libertadores e sabem que o Cruzeiro ganhou a Libertadores. Então é gratificante, e o respeito é muito maior."
 
Célio Lúcio: "Como eu trabalho na base e a gente viaja muito para o interior e outros estados do Brasil, a gente vê esse carinho especial do torcedor. O torcedor vem, abraça, às vezes chora, é até emocionante para a gente. Isso nos dá alegria maior, porque ficamos marcados no Cruzeiro para sempre. Não tem preço essa conquista da Libertadores. Conseguimos muitos títulos na década de 1990, mas a Libertadores marcou positivamente."
 
O Cruzeiro tinha um time copeiro, que havia conquistado Supercopa e Copa do Brasil com uma base semelhante à da Libertadores. Qual o peso disso para o título de 1997?
 
Nonato: "Sem dúvidas pesou. Mas os reforços que vieram ajudaram muito também. Vitor, bicampeão mundial e da Libertadores. Palhinha também, Ailton, Wilson Gottardo – que havia sido campeão brasileiro em 1995 com o Botafogo. Quer dizer, isso deu um suporte maior. Uma coisa é reforçar o elenco por reforçar. Quando você traz jogadores de peso é diferente. Isso foi importante. Perdemos a primeira para o Grêmio, no Mineirão, e as outras duas para o Alianza e o Sporting Cristal. Na volta tínhamos de ganhar as três. Se não me engano fazia 50 anos que o Cruzeiro não ganhava do Grêmio no Olímpico. E nós conseguimos ganhar do Grêmio. E ganhamos aqui do Alianza e do Sporting Cristal e conseguimos nossa classificação."
 
Ricardinho: "Jogar ao lado de caras vencedores une muito o grupo. O fato de os caras que vieram de São Paulo já terem conquistado títulos expressivos, e os do Cruzeiro também – Supercopa, Copa do Brasil – e o Paulo Autuori era um cara que agregava muito também, passou muita confiança para o elenco produzir o máximo. Quando você está com jogadores que gostam de ganhar a partida, que gostam de ser campeões, tinha que dar liga, tinha que dar certo. Entrávamos em cada jogo com vontade de crescer. Foi assim até o final."
 
Célio Lúcio: "Essa questão também é válida no futebol. Existem atletas e existem atletas vencedores. O Ricardinho falou bem, o Nonato também. No grupo do Cruzeiro houve isso. Trouxe o Vitor, campeão de tantas competições no São Paulo; já tinha o Nonato aqui, campeão de quase tudo também; o Ricardinho... agrupou muito o elenco. Fizemos uma fase inicial terrível, mas, pela experiência dos atletas, o time não se abateu e conseguiu a classificação. Daí para frente houve o crescimento normal, né?! Aí se define com experiência e com técnica de cada jogador que a gente tinha. E há uma questão muito importante na Taça Libertadores, que é a competitividade. O Cruzeiro conseguiu reunir atletas técnicos e competitivos. Isso foi primordial para a conquista desse título em 1997."


 
Qual o papel do técnico Paulo Autuori na recuperação do Cruzeiro no torneio?
 
Nonato: "A importância do Paulo foi fundamental. Estreamos no Campeonato Mineiro, se não me engano, contra o Guarani de Divinópolis. Aí na quarta-feira perdemos para o Grêmio e o Oscar foi mandado embora. Veio o Paulo Autuori. Tivemos dois jogos seguidos fora pela Libertadores e perdemos os dois. Ali foi fundamental. O Paulo nos chamou para uma reunião, e todo mundo falou: ‘num grupo de quatro, a gente ficar fora para dois clubes peruanos não tem a mínima condição. Temos que dar um jeito de vencer. Se a gente se classificar, vamos chegar à final e ser campeões."
 
Ricardinho: "Naquela época houve dois fatos interessantes para mim. O Paulo Autuori é um cara que sabe levar bem o grupo, conversa bem e passa motivação. E os jogadores experientes que a gente tinha na época também: Nonato, Gottardo, Palhinha... esses caras sabiam ler muito bem os jogos. Às vezes você estava numa situação difícil no jogo e esses caras conseguiam ajeitar o time dentro de campo. E interessados em ganhar, não somente em jogar. Sempre passavam essas coisas para nós jovens. Aliando isso tudo, o time deu liga depois que passou da primeira fase. A gente também tinha o Dida, que era um cara fantástico e que fazia a diferença. Não só ele, como outros setores faziam a diferença. Juntando tudo isso, o mais interessante é que todos queriam vencer. Quando todos querem vencer, você consegue algo relevante. Foi o que aconteceu na época."
 
Célio Lúcio: "Mudança de treinador geralmente faz mudança diferente. Com o Paulo não foi diferente. Ele trouxe as ideias novas dele, a equipe soube assimilar o que queria e graças a Deus já conseguimos as vitórias assim que ele chegou. Aí volta a confiança novamente. Aí a equipe começou a ter confiança, acreditou mais no trabalho do Paulo e consequentemente vieram as vitórias e a classificação. Quando passou pelo mata-mata, aí já é uma característica pura do Cruzeiro: um time competitivo, com grande rotatividade nessa questão de mata-mata, então as coisas foram dando certo, foram caminhando, e conseguimos chegar a essa final e conquistamos esse título que marcou muito e não vamos nos esquecer nunca."
 
Ricardinho: "Em 1996 havíamos sido campeões (da Copa do Brasil). O time estava muito bem, estava entrosado, e a gente começou 1997 não tão bem depois do Campeonato Mineiro e passando pela Libertadores. Então alguma hora tinha que dar certo, alguma hora o time tinha que encaixar. A gente estava propenso a isso. Assim que o Paulo chegou, a gente ajeitou a equipe e conseguiu a sequência na Libertadores."

 
Ricardinho, como foi para você tendo apenas 21 anos participar de uma decisão tão importante pelo Cruzeiro?
 
"Tive muita sorte de ter começado aqui com o seu Ênio Andrade e no meio de vários jogadores importantes. Tinha o Toninho Cerezo, o Luisinho, o Eder, o Paulo Roberto... eu entrei no elenco nessa época. Eram jogadores experientes, que passavam coisas positivas para a gente. E assim que comecei a jogar na equipe principal, recebia muitos conselhos de jogadores que estavam jogando. E assim que entrei no time, conseguimos ser campeões do Mineiro e da Copa do Brasil. Isso aumenta a confiança. E você encaixar no meio de tantos jogadores importantes num clube importante como o Cruzeiro te faz criar uma responsabilidade e uma maturidade muito grandes. Quando você começa a vencer, você tem o gosto e não quer parar mais. Foi em cima de tudo isso que eu consegui aos poucos ter essa maturidade e ganhar boa sequência."
 
E a lida com a condição de favorito contra o Sporting Cristal?
 
Nonato: "Minha maior preocupação era justamente isso: o fato de sermos favoritos demais. A gente tinha obrigação de ganhar, pois nenhum clube peruano foi campeão da Libertadores – principalmente naquela época. Hoje a facilidade (para os clubes pequenos) é maior, a parte física toma conta e você consegue dar uma nivelada por aí. Mas naquela época não, naquela época um time brasileiro contra um time peruano a obrigação de vitória era de 99%. E o jogo não foi tão fácil, a gente não teve muitas chances de gols. Aos 27, se não me engano, teve aquela falta que o Solano bateu, o Dida soltou e depois o Julinho chutou e o Dida conseguiu defender com o pé. Então a maior dificuldade minha foi o favoritismo. Aquela pressão de ser obrigado a ganhar foi o mais complicado."
 
Ricardinho: "Assim que conseguimos passar pelo Colo Colo veio aquele favoritismo natural, pois era um clube brasileiro contra um peruano. A gente se sentiu pressionado sim. Acho que no primeiro jogo até jogamos melhor lá no Peru, mais dentro do que a gente estava prevendo. Acho que aqui dentro estávamos mais ansiosos..."
 
Nonato: "Poderíamos ganhar em Lima, tivemos mais chances de ganhar lá do que aqui."
 
Ricardinho: "Lá a gente se sentiu mais confortável para jogar melhor e ganhar o jogo. Aqui eu não sei se foi ansiedade ou pressão, a situação toda do jogo, a gente não jogou o que vínhamos jogando durante toda a competição. Naquele jogo não fizemos um jogo para chegar realmente e ser campeão. Depois fizemos o gol e melhorou a situação."
 
Célio Lúcio: "Tivemos uma situação parecida na final do Campeonato Mineiro de 1997, que foi contra o Villa Nova. Foi mais ou menos parecido com a final da Libertadores, em que éramos considerávamos favoritos, mas sabíamos do grande adversário do outro lado. E a pressão veio toda em cima da gente. Para mim, pessoalmente, o jogo mais difícil da minha carreira foi contra o Villa, em termos de responsabilidade e pressão que vêm toda em cima da gente. E na Libertadores, como disseram Nonato e Ricardinho, a gente se sente mais à vontade jogando fora de casa, pois a pressão da torcida fica para o adversário. Quando a gente joga em casa, com o torcedor todo ao nosso lado, a pressão vem para o nosso lado também. Há essas situações que precisamos saber administrar. Só a gente que esteve lá que sabe como é difícil jogar sob pressão. Mas graças a Deus tudo correu bem e conseguimos o resultado."

 
O fato de o Cruzeiro já ter conhecido o Sporting Cristal na fase de grupos contribuiu para que o elenco não deixasse subir à cabeça o favoritismo colocado pela opinião pública e pela própria história dos clubes na Libertadores?
 
Célio Lúcio: "Eu não pensaria desse jeito (que o Cruzeiro teria facilidade). A Libertadores é totalmente diferente. Equipes de menos expressão chegam e são campeãs. Eu, propriamente, não pensei. E a equipe era madura, estava preparada para isso. Tanto que Ricardinho e Nonato falaram que lá tivemos mais chances, mas a gente sabia que aqui eles tinham capacidade de inverter. A pressão viria toda para o nosso lado e isso faz diferença. Você joga em casa e tem o apoio da torcida, mas a cobrança também é maior. A gente soube administrar isso, a questão do respeito foi grande e creio que por esse respeito conseguimos o bicampeonato."
 
Qual o caso engraçado mais marcante do time de 97?
 
Nonato: "O caso mais marcante é do Donizete (Oliveira). Chamamos ele de ‘sabichão’. Ia falar de carro, ele entendia; de música, ele entendia; de avião, ele entendia... ele entendia de tudo. E era metido, hein?! Disse assim: ‘quero ver amanhã! Quero ver quem vai ralar amanhã!’ Aí eu falava assim: ‘Donizete, tomou a bola? Na hora que você ver Nonato ou o Palhinha, você toca. E volta para marcar depois. Só isso que você tem que fazer!’. Aí ele dizia: ‘Tá bom! Então monta um time com só Nonato e Palhinha’. Aí eu respondia: ‘Não, meu filho, cada um tem que saber a sua função. E sua função é correr, tomar a bola e entregar para mim ou para o Palhinha. Deixa que o resto a gente resolve. Que aí o Palhinha vai meter a bola no Marcelo na cara do gol, que aí tudo vai dar certo’. O cara que a gente mais zoava era ele. Teve um episódio da discussão do túnel do vestiário (do Estádio Nacional de Santiago), aí a gente já estava no vestiário e ele começou a discutir com o Basay (atacante do Colo Colo). Os dois saíram na porrada, só estava ele e aí ele apanhou um bocado."
 
Célio Lúcio: "Foi legal, que aí a gente viu se ele era macho ou não (risos). Essa questão de ser sabichão, a gente até brincou com ele: ‘você não bate em todo mundo, você não era o cara?’. Aí ele abaixou a bola. Foi um fato que eu lembro mais."

 
O Cruzeiro enfrentou duas disputas de pênaltis e tinha o Dida, um grande especialista em defender cobranças. Isso deu confiança?
 
Ricardinho: "Em pênaltis a parte psicológica é fundamental nessa situação. Lembro-me especificamente daquele jogo contra o Colo Colo, em que estávamos nas semifinais. Foi para os pênaltis. Lembro-me que eu era o primeiro a cobrar o pênalti. Daquele tempo até chegar o primeiro a cobrar, o juiz tem que falar com torcida, não sei o quê, e aí você fica um minuto antes de cobrar o pênalti. Você caminhando do meio do campo até chegar para cobrar o pênalti, se pensar muita coisa, não sabe onde chuta a bola. A gente tinha um time bem treinado e um excelente goleiro. Na ocasião, todos fizeram os pênaltis e o Dida defendeu bem. Conseguimos ir para a final."
 
Célio Lúcio: "Com o Dida ao nosso lado a confiança aumenta também. Ele estava numa fase espetacular, vinha de algumas conquistas em que se destacou muito também e com certeza o clima era favorável para a gente na batida dos pênaltis, a confiança era grande. E os nossos batedores eram jogadores experientes, maduros e se prepararam para os pênaltis."

 
Qual a lembrança de cada um sobre o gol do Elivélton?
 
Nonato: "Quando tem que acontecer, não tem jeito. Já estava no certo tempo do jogo, e o batedor oficial de escanteios era o Palhinha. Eram trinta e poucos minutos do jogo, e o Palhinha estava do outro lado. Aí pensei: ‘não vou esperar o Palhinha sair do outro lado para bater o escanteio. Eu mesmo vou bater’. E sendo sincero: não foi um escanteio bem batido. A bola viajou demais, viajou muito. Aí o zagueiro tira e a bola sobra para o Elivélton, que nunca tinha dado um chute de perna direita, e ele acerta o chute de perna direita. Teve uma ajuda do goleiro, que dava para defender."
 
Célio Lúcio: "Eu acabei vendo do banco, pois não joguei na final. Foi na diagonal para a esquerda, o banco ainda era baixo. Só me lembro que o Elivélton chutou, a torcida vibrando, a bola entrando... o Teotônio, que era nosso massagista, abraçando todo mundo, foi aquela festa. Não deu para ver o lance com a bola chegando ao gol. Só vi o Elivelton chutando e depois o pessoal correndo e se abraçando. Era a concretização da vitória."
 
Ricardinho: "Eu tinha acabado de ser substituído pelo Da Silva, que entrou no meu lugar. Estava chegando ao banco quando aconteceu o lance. Quando virei, teve aquela explosão do gol, todo mundo correndo. Eram 30 minutos (do segundo tempo). Foi marcante. Quando é para ser campeão..."

 
Existia um pacto para tornar o ambiente mais agradável? Muito se comenta que vocês dividiam a premiação em dinheiro com os funcionários do clube...
 
Nonato: "Quando comecei a fazer parte da liderança do Cruzeiro, não apenas pelo fato de eu ser o capitão, disse que a gente não precisa só dos jogadores. A gente precisa daquele cara que corta a grama, da cozinheira... então criei uma caixinha que em cada jogo que a gente ganhava, a gente pegava 5% do bicho de cada jogador e distribuía para quem não fazia parte. A gente sabia que para o roupeiro e para o massagista um bicho de uma competição feito a Libertadores poderia ser 10 vezes o salário deles. A gente jogava por eles também."
 
Ricardinho: "Foi bacana a iniciativa na época feita pelo Nonato. Individualmente, falávamos com o roupeiro: ‘se eu fizer o gol, te dou tanto’. Isso cria uma energia positiva, todo mundo querendo vencer. É importante e nos torna mais fortes. Foi o que aconteceu."
 
Célio Lúcio: "Até hoje tem um funcionário aqui (na Toca da Raposa I) da nossa época. Quando cheguei em 2011, ele veio e me deu um abraço. Eu não estava lembrando muito porque ele chegou em 1996 ou 1997. Mas aí ele falou esse detalhe: ‘poxa, na época de vocês era muito bom, pois a gente ganhava um bichinho, vocês contribuíam com a gente’. Isso me deixou muito feliz. Quando você valoriza todos – não só da comissão de futebol –, de todas as áreas que a Toca tem, as coisas boas começam a acontecer. Nada é por acaso. Todos os títulos que a gente ganhou não foram por acaso. A Libertadores não foi por acaso. Costumo dizer que as conquistas a gente fez por merecer. Às vezes a bola bate na trave e influencia. É um todo. Aí as pessoas falam: ‘mas foi muita coincidência, vocês ganharam três jogos depois’. Tinha que ser assim. A gente fez por merecer, estávamos fazendo alguma coisa de bom. E o grupo era compromissado, sério, com jogadores experientes e todos em busca de um só objetivo. Não tinha vaidade, deixamos para trás, éramos jogadores maduros e acostumados a ganhar títulos em outros clubes e no próprio Cruzeiro. Era um time humilde e com objetivo de ganhar mais um título no Cruzeiro."
 
Nonato: "Tanto que não tinha esse negócio de vaidade que no sábado, no tradicional rachão, tinha o time dos paulistas contra o time do Nonato. Aí era Vitor, Palhinha, Ailton, Donizete, Gilmar... todos no mesmo time. Não tinha esse negócio de vaidade. Quem estava de fora poderia achar: ‘poxa, olha lá, está tendo rivalidade’. Não, era numa boa. Quando terminava, na hora da concentração, um zoava o outro: ‘olha lá, é a quarta que o seu time perde direto’. Tudo numa boa."

 
Nonato, você começou a Libertadores como capitão, mas perdeu a faixa para o Gottardo. Houve algum tipo de ressentimento?
 
"O lance foi o seguinte. O Gottardo estreou contra o Democrata de Valadares. Esse jogo eu não joguei porque estava machucado. É a primeira vez que vou contar em público. Aí o Gottardo entrou como capitão. E na quarta-feira a gente tinha um jogo contra o América de Cali (Nonato faz uma confusão: na verdade, o rival era o El Nacional, do Equador, pelas oitavas de final). E o Paulo Autuori optou por colocar o Wilson Gottardo como capitão. Aí no jogo seguinte, num Cruzeiro x Atlético, como eu estava voltando de contusão, o Paulo, para dar uma sequência de jogos para mim, me colocou para jogar. E me pôs de capitão. Aí falei com o Benecy (Queiroz, supervisor de futebol do clube): ‘deixa ele, é melhor continuar’. Gottardo era de confiança do Autuori, tinha sido campeão brasileiro no Botafogo em 1995. Achei mais que justo continuar. Nunca tive problema e nem discussão com relação a isso."

 
Por que o clima de união da Copa Libertadores não foi repetido no Mundial contra o Borussia Dortmund, em dezembro (o Cruzeiro foi derrotado por 2 a 0)? Faltou harmonia?
 
Nonato: "Na realidade, o que desestabilizou aquele elenco para o Mundial não foram as contratações dos quatro jogadores (o lateral-direito Alberto, o zagueiro Gonçalves e os atacantes Donizete Pantera e Bebeto), mas sim a sequência do Campeonato Brasileiro que fizemos com o Nelsinho (Baptista). A 30 dias do Mundial, nem o Dida, que era titular absoluto, tinha comprado a passagem da esposa dele. Ninguém sabia quem ia viajar. O ambiente ficou de um jeito meio louco. O Wilson Gottardo, que tinha sido capitão (da Libertadores), não viajou. O Alberto, que foi contratado para jogar, não jogou e ficou no banco. Aí ele botou o Gonçalves no lugar do Gelson Baresi. E para poder colocar o Donizete Pantera e o Bebeto, ele não ia tirar o cara que fez o gol da final, que foi o Elivélton. Aí ele achou melhor me tirar e improvisar o Elivélton. Coincidentemente, os dois gols foram pelo lado esquerdo (de defesa), em cima do Elivélton."
 
Ricardinho: "Eu acho que naquela transição de mudança de treinador – o Paulo saiu para o Flamengo – o time se perdeu um pouco. Não sei se foi pela saída do treinador, se foi pela chegada do novo treinador, se foi a saída de algum jogador. Se a gente conseguisse manter aquela base da Libertadores e se o Autuori tivesse continuado, a possibilidade (de título) seria maior. Teríamos um time mais entrosado, um grupo na mão. E os jogadores que vieram com certeza iriam agregar e ajudar. Mas o clima de incertezas, como disse o Nonato, nos fez perder a confiança. A gente tinha um grupo bom. Mas essa transição foi mal conduzida. Não conseguimos nos ajustar rápido, fomos mal no Brasileiro e para recuperar rápido no Mundial é difícil. E nisso tem muitas coisas: pressão da imprensa, cobrança por reforços, presidente tem que arrumar o time logo. Várias situações que não deram certo para que a gente chegasse bem no Mundial. Se chegasse bem, poderia ter ganhado, pois o Borussia não estava bem na época."
 
Célio Lúcio: "A instabilidade do momento que causou todo esse alvoroço. O time realmente não estava bem no Brasileiro, aí ficou uma dúvida. E quando vêm dúvidas, geralmente tem de haver mudanças no futebol. E as mudanças realmente não deram certo, como poderiam dar certo também. De repente, se a gente fosse, você me perguntaria: ‘seriam campeões mundiais?’. Digo que não sei. Eu penso que a possibilidade aumentaria pelo grupo que a gente tinha e pelas decisões que havíamos feito em outras copas e campeonatos."
 
Ricardinho: "A gente não fez um jogo ruim no Mundial. Deu para fazer um jogo até certo momento de igual para igual. Vi o jogo outras vezes. Se tivéssemos um pouco mais de conjunto, poderíamos conquistar resultado melhor."
 
Nonato: "Quem ganhou como melhor jogador em campo foi o Júlio César, um zagueiro"

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