Atlético
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ARTIGO

Junto e misturado

postado em 05/03/2015 12:01 / atualizado em 05/03/2015 09:09

Juarez Rodrigues EM DA PRESS


Nelson Alves

Cientista Social

Assistir a um Cruzeiro x Atlético é sempre um privilégio e, sem dúvida, seria bem melhor com as duas torcidas dividindo o Mineirão. Melhor ainda com atleticanos e cruzeirenses misturados, como foi na Copa do Mundo em 2014.

Parecem ser desejos impossíveis se olharmos o presente. Parecem-se mais ainda com desejos saudosistas se olharmos o passado. Mas serão sempre viáveis se enxergarmos nosso futuro, o que, em essência, significa conhecer as causas do problema e reconhecer que a atual situação do futebol brasileiro é delicada e desafiadora.

Envolve um cenário financeiro desfavorável, aqui e no exterior, bastando verificar a queda nos valores contratuais dos atletas dos grandes mercados e nas transferências dos ídolos para os mercados emergentes, como a China e o Catar, mandando o tal sonho europeu para o brejo.

Também há a debandada de patrocinadores, que não podem mais associar suas marcas a instituições com crescentes denúncias de corrupção, mesmo que sejam muito populares, como é o caso da própria Fifa. Além da relação obscena entre o valor do ingresso e a renda média do brasileiro, gerando elitização das arquibancadas e fundos milionários para pagamento das obras da Copa que, provavelmente, nunca serão terminadas.

Um capítulo à parte é o contrato da venda dos direitos televisivos dos jogos, que foi baseado na teoria imperialista inglesa de distribuir dinheiro aos dirigentes dos clubes no início e escravizar a todos no médio e longo prazos. Felizes os corintianos e os flamenguistas, que tomarão a “saideira” e apagarão as luzes do velório, pois serão os últimos a ser enterrados.

Acrescente-se a isso a incapacidade governamental, ou simples desinteresse, que insiste em considerar o futebol apenas quando precisa dos votos, negando-se a vê-lo em toda a sua dimensão e importância social. Um descaso refletido na ausência das garantias jurídicas e na manutenção de uma estrutura medieval, controlada com mão de ferro por protótipos de ditadores, tendo inclusive justiça própria, a tal Justiça desportiva, coisa inédita neste planeta ou nesta galáxia.

A situação piora se considerarmos o aumento da participação dos clãs urbanos, alguns conhecidos por “Torcidas Organizadas”, outros por “PCC”, “Comando Vermelho” ou “amigos da esquina”, cada vez mais unidos pela violência, pelo culto à força e amor a causas sem sentido.

Com um discurso baseado no “pertencimento social”, o mesmo usado pelo Estado Islâmico, Al-Qaeda ou o Partido Nazista, essas novas organizações fazem seus cordeiros doarem a vida para defender seus interesses em encontros de guerrilha previamente marcados, geralmente em locais que deveriam estar vigiados pela polícia, como estações, praças e estádios.

Caro leitor: marcas, clubes, como os partidos políticos, são apenas símbolos e não merecem a minha vida, a sua ou a de ninguém. O cruzeirense covardemente assassinado na Avenida Nossa Senhora do Carmo e o atleticano assassinado na Savassi que o digam. Ah! Desculpe-me. Esqueci que eles não podem mais falar.

As situações descritas contribuem para os torcedores, de bem ou não, serem uma massa de manobra. Uma grande massa de manobra com o objetivo de manter quem está no poder e garantir grandes ganhos de capital, divididos desigualmente entre poucos e fundamentados em instituições fossilizadas, que juntos levarão o nosso futebol à falência.

Mas o que incomoda mesmo é a completa ausência de ações concretas dos envolvidos no “negócio futebol”, no sentido de salvarem a ele e a si próprios. Em outros países, eles desejariam o crescimento do negócio, não o seu fim. O que me leva a pensar que eles são os grandes adversários.

O fato é que se quisermos novamente ter o privilégio de assistir a um clássico entre Cruzeiro e Atlético com jogadores de qualidade, dentro de um Mineirão lotado, com as duas torcidas dividindo o mesmo espaço, temos muito a debater, planejar e organizar. E é melhor começarmos agora mesmo, sob pena de a liga estadunidense, a liga do Kaká, do Beckham e do Ronaldinho Fenômeno levar o nosso clássico para ser jogado na Flórida ou na Califórnia, que deverá ser com duas torcidas, provavelmente com uniformes bem diferentes dos habituais azul, preto e branco!

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