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TRAGÉDIA

Crianças não arredam o pé da arena, estreitam laços e são a garantia de que Chape viverá

Vários jovens fazem vigília na Arena Condá, em Chapecó

postado em 03/12/2016 08:06 / atualizado em 03/12/2016 10:48

LEANDRO COURI / EM DA PRESS

Rodrigo Fonseca
Enviado especial a Chapecó

Encostado no parapeito da arquibancada da Arena Condá, Jamir Júnior, de 10 anos, olha para o gramado: “Estava me lembrando das vitórias”, diz. O garotinho já chorou muito. Mas o brilho nos olhos é o primeiro sinal dos planos de criança. “Quando eu crescer, já falei para minha mãe, quero ser goleiro da Chapecoense. É um dos meus sonhos”.

Outro desejo era entrar no campo da Arena. Foi realizado. Ao lado da reportagem do Estado de Minas/Superesportes, Jamir Júnior, aluno da escolinha da Chape, pisou no gramado, caminhou imaginando um dia vestir a camisa verde. Foi até a área onde brilhou o ídolo Danilo, onde se forjou um herói. Fez pose para fotos. Lembrou-se do irmão mais velho: “Ele também é goleiro. Falei com ele para se candidatar a ser goleiro da Chapecoense".

O sonho de Jamir Júnior retrata o desejo de milhares de jovens em Chapecó, ainda abalada com o desastre aéreo que pôs fim à equipe que era orgulho da cidade. E essa juventude é a garantia de que a Chape continuará viva. Cada criança de Chapecó tenta imaginar como pode ajudar a reerguer não só uma equipe, mas uma família.

Outro que quer seguir os passos do goleiro Danilo é o garoto Bernardo Luiz Tonelli, também de 10 anos. Ele ganhou as luvas do ídolo um dia antes do jogo contra o San Lorenzo, pelas semifinais da Copa Sul-Americana. E as guardará não só como uma lembrança, mas como um incentivo para seguir a carreira do ídolo.

Até quem não era muito ligado ao futebol agora começa apensar de forma diferente. “A Chapecoense é o único time da cidade. É uma dor muito grande, mas o time não vai acabar, porque o amor vai ser mais forte do que esse acidente. Foi triste ver as homenagens. Queria que não fosse verdade. Pretendo ir mais aos jogos para que eles se recuperem logo e para que a gente volte a ter o time da Chapecoense aqui na Arena”, diz Fernanda Luiza Costela, de 12, que foi uma única vez ao estádio ver uma partida de futebol.

E esse sentimento não toca apenas os jovens. Até mesmo aqueles mais velhos, e que não acompanhavam a Chapecoense, já repensam sua relação com o clube. Ao lado da esposa Fernanda, o técnico de informática Carlos Eduardo Schimit, de 36, levou os filhos Pedro Henrique, Luiz Otávio e Laura Isabela, todos uniformizados, à Arena Condá. Ele tenta suportar a dor e buscar forças para o futuro.

“Nunca fui muito adepto do futebol. Meus pequenos já vieram ao estádio, mas com minha irmã. E hoje senti a necessidade de vir. Isso vai despertar em todos nós um novo sentimento”, afirma.

Relação mais especial Alcançar esses sonhos vai exigir que os jovens vençam a herança da tragédia. Segundo o psicólogo e professor universitário em Chapecó, Jairo César Lunardi, de 45, “é importante que as famílias consigam auxiliar seus filhos, que têm pouco entendimento sobre perdas, para compreender aquele que não está mais aqui, mas que deixou lembranças, e que existem coisas que estão fora do nosso domínio. Teremos outros Danilos”, diz.

Ele não tem dúvida de que a relação do time com a cidade será ainda mais especial: “Esse é um momento difícil, não há dúvida. Mas, é preciso olhar para o futuro.  O principal é resgatar a continuidade, que a Chapecoense não encerra por aqui. Perdemos jogadores, equipe técnica, dirigentes, pessoas importantes para nossa comunidade, porque temos proximidade com esses jogadores, mas precisamos reconstruir esse espaço. As pessoas não podem desacreditar nisso. Temos de repensar a identidade da população em relação ao time que fica e ao time que vai ressurgir", diz Jairo.

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