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Discurso moderno, prática arcaica: contradições da diretoria do Cruzeiro no caso Paulo Bento

Últimos posicionamentos públicos eram de compreensão e apoio ao português

postado em 26/07/2016 13:10 / atualizado em 26/07/2016 13:34

 Paulo Filgueiras/EM/D.A Press
O Cruzeiro dos últimos meses se resume pela contradição. De um lado, o discurso da diretoria é articulado em palavras bem colocadas, sustentado em métodos modernos e novas concepções de trabalho. De outro, a prática antiga e ultrapassada de demissões sucessivas de treinadores conforme os resultados, sem avaliação real do que vem sendo realizado. A consequência disso são os muitos traumas acumulados, que levaram o time à penúltima posição do Campeonato Brasileiro.

A incoerência da cúpula celeste passa pela falta de convicção nas principais decisões. Confirmado na manhã desta terça-feira, Mano Menezes será o terceiro treinador a comandar o Cruzeiro neste ano. São cinco trocas (Marcelo Oliveira / Vanderlei Luxemburgo / Mano Menezes / Deivid / Paulo Bento / Mano Menezes) nos últimos treze meses. Como consequência, o clube arca com multas milionárias e põe em risco o ajuste nas contas previsto pelo Profut - a exceção foi a saída do próprio Mano, no fim de 2015, que rendeu R$ 7 milhões aos cofres da Raposa. Isso no que tange apenas aos comandantes, sem passar pelas contratações equivocadas. Os atletas que chegaram em janeiro como solução agora estão em segundo plano diante das aquisições recentes, que serviram para tentar corrigir os erros.


Em entrevista à TV BH News, no último dia 14, o diretor de futebol do clube, Thiago Scuro, disse tudo o que não tem feito nos últimos meses. Afirmou que a diretoria tinha confiança e passava segurança a Paulo Bento, explicou que os trabalhos vitoriosos no Brasil exigem tempo e que os últimos times campeões tiveram médio e longo prazo para resultado. Ele ainda considerou a instabilidade dos treinadores como muito nociva ao planejamento traçado. Tudo na contramão da ação do próprio diretor no comando do departamento de futebol.

“Nós sabemos que aqueles 15 dias (tempo em que o Cruzeiro ficou sem treinador, quando demitiu Devid) seriam importantes para uma intertemporada e uma reorganização, mas não foi possível encontrar um profissional com capacidade de dirigir o Cruzeiro pelo médio prazo pelo menos. É esse modelo que dá resultado, o Cruzeiro foi campeão com uma relação de médio prazo com um treinador, o Corinthians da mesma forma. Então, está cada vez mais comprovado de que os clubes precisam identificar o treinador que ele quer para o seu trabalho e dar condições, proteger, para construir esta consistência. A instabilidade do treinador, considerando a importância que ele tem para o clube de futebol, é extremamente nociva para o dia a dia”, destacou Scuro.

A demissão de Paulo Bento foi tomada após mais um revés do Cruzeiro no Mineirão, desta vez contra o Sport, por 2 a 1, no último domingo. Embora os resultados não fossem favoráveis, o técnico confiava na diretoria. Scuro chegou a dizer que a direção estava “comprometida com o trabalho que estava sendo feito”. O baque do treinador foi grande com a saída. Tanto que o agente dele, Carlos Gonçalves, em entrevista ao Superesportes, admitiu a decepção de Bento com a interrupção do trabalho após ouvir da cúpula celeste, em Lisboa, na época do acordo, que o projeto seria de longo prazo.

Ainda de acordo com a entrevista à BH News, no último dia 14, Scuro ressaltou que a pressão externa não modificaria as crenças da direção. “A pressão externa é algo em todos os lugares do mundo. Uma coisa que ele (Paulo Bento) está vendo positivamente é o quanto a direção está comprometida com ele e com o trabalho que está sendo feito. Acho que é um aspecto importante e dá segurança. O que chama mais atenção deles é o calendário e a logística, e eles estão se adaptando a esses aspectos no trabalho do dia a dia”, disse.

A saída veio justamente no período em que Paulo Bento começou a contar com os novos contratados. Ele não resistiu aos maus resultados e a falta de compreensão da cúpula celeste. A insatisfação da torcida era grande. O momento, no entanto, era de reorganização da equipe, que ganhou novas peças: Ramón Ábila, Rafael Sobis, Rafinha, Edimar e Denílson chegaram. O treinador precisava de tempo para colocar o time nos trilhos, e o diretor de futebol sabia disso: “A (fase ruim do time) se deve à transição de sair de uma metodologia de um treinador para outro, mudar a forma de treinar e jogar sem ter tempo. O Cruzeiro precisa de mais semanas cheias para treinar e isso está para começar agora e, sem dúvida nenhuma, que esse aspecto, assim como os jogadores do departamento médico voltando, vai dar ao Paulo Bento uma condição maior de mostrar a sua capacidade”, frisou Scuro.

O dirigente voltou a ressaltar que em nenhum momento pensou na demissão de Paulo Bento. Contudo, 13 dias depois dessa entrevista, Paulo Bento foi comunicado pelo próprio Thiago Scuro da interrupção do trabalho.

Anteriormente, contudo, Scuro era enfático ao garantir Bento no comando do Cruzeiro.

“Em momento nenhum (pensamos na demissão do Paulo Bento). Não tem ninguém dentro da Toca II , nem o presidente, nem o Bruno, nosso vice, e nem o presidente, nem o Paulo Bento e sua comissão, não tem ninguém satisfeito com o resultado, porque em alguns momentos parece que é omissão da diretoria não trocar o treinador, mas pelo contrário, a ação da direção está em melhorar as condições do elenco, melhorar as condições de trabalho do treinador, não temos dúvidas nenhuma de que o Paulo Bento é um grande treinador, a sua história comprova isso, é um treinador, além de ter sido competitivo e conquistado titulo no Sporting com orçamento menor dos rivais, promoveu jogadores jovens, gerou muito valor econômico, deixou uma instituição saudável. Depois dirigiu a Seleção Portuguesa, foi semifinalista da Eurocopa, e sempre em trabalhos de médio e longo prazo”, afirmou.

Outras contradições

Não só Thiago Scuro, mas também o presidente Gilvan de Pinho Tavares e o vice Bruno Vicintin têm demonstrado contradição em posicionamentos públicos.

No dia 22, Vicintin chegou a falar que o treinador estava prestigiado em entrevista coletiva. A boa reputação de Paulo Bento durou pouco com o vice de futebol. “Ele está aí treinando a equipe. Claro que no futebol profissional tem que ganhar para ter paz para trabalhar. O Cruzeiro só vai sair dessa situação com muito trabalho. O treinador está prestigiado, veio de classificação com duas vitórias. Esperamos que se recupere também no Campeonato Brasileiro”, disse.

Na apresentação de Paulo Bento, no dia 16 de maio, Gilvan comentou da necessidade de novas concepções no comando do Cruzeiro. O presidente não deu tempo para o português, que ficou apenas 75 dias à frente do clube. “Como o Cruzeiro perdeu a competição, chegamos à decisão de que o Cruzeiro precisava de um técnico mais experiente. Trabalhamos, entre tantos nomes, com a opção do Paulo e pedimos à nossa diretoria para conversar com ele. Fizemos uma sondagem inicial para saber se era viável. Depois de alguns dias de conversas, Bruno e Thiago Scuro foram para Portugal e tudo deu certo. Trouxemos para o Brasil um treinador que desfruta de prestígio enorme. Falamos com o Felipão, e ele nos garantiu que trazíamos um treinador de muita qualidade, que dará um avanço ao futebol mineiro e brasileiro. É vitorioso, ainda jovem, mas com uma bagagem muito grande. Tem tudo para trazer novas ideias para o Cruzeiro”.

Nelinho analisa postura da diretoria do Cruzeiro



Entrevista de Thiago Scuro à TV BH News, no dia 14. Assista a partir do minuto 8


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