Futebol Nacional
None

Poucos confiavam no nosso trabalho

Zagueiro artilheiro reconhece a boa fase do Atlético, especialmente na Libertadores, mas diz que conquista exige pés no chão. Ele afirma que ausência da Seleção o motiva

postado em 29/03/2013 08:31 / atualizado em 29/03/2013 08:34

 (RAMON LISBOA/EM/D.A PRESS)
Em pouco mais de um ano, o zagueiro Réver foi do inferno ao céu no Atlético. Apontado como um dos vilões na goleada histórica sofrida para o arquirrival, Cruzeiro, por 6 a 1, na última rodada do Campeonato Brasileiro de 2011, o capitão conseguiu se redimir e hoje vive grande momento pelo Galo. Ele chega a ser apontado como o melhor zagueiro do país, ao lado do vascaíno Dedé, e comemora a boa fase pelo time alvinegro ao lado de Ronaldinho Gaúcho e cia. “Jogo numa posição em que me sinto bem à vontade, mas que corre muitos riscos, já que você pode tentar construir uma jogada e tudo dar errado. Logo, seu nome pode ser manchado no clube”, afirma o jogador, que já marcou 19 gols pela equipe e agora é comparado ao ex-ídolo Luizinho. Réver falou ao Estado de Minas com exclusividade sobre sua fase no Galo, Seleção Brasileira, carreira na Europa e a ambição da torcida de conquistar a Copa Libertadores.

Você está prestes a ultrapassar o Luizinho (21 gols, contra 19), um dos ídolos do clube, e se tornar o defensor que mais fez gols pelo Atlético. Qual é a importância dessa marca para um zagueiro?
É um feito muito especial porque sou um defensor e não tenho funções ofensivas. Acaba sendo gratificante na minha carreira, ainda mais igualando e ultrapassando o Luizinho, um dos melhores jogadores do Atlético, que batalhou e lutou muito para chegar a esse posto. Quem sabe nos próximos jogos eu possa estar quebrando essa marca dele e procurar estender ainda mais o recorde para que outros defensores batalhem tanto quanto eu batalhei para fazer história pelo clube.

A jogada de bola parada deixou de ser a principal opção ofensiva do Galo. O time está mais completo e encorpado neste ano?

A bola parada é um ponto forte, porque nosso time é alto. No último Brasileiro, vários jogos foram decididos assim. Mas neste ano conseguimos fugir um pouco e fazer gols através de tabelas e lances bem trabalhados. Conseguimos variações que deixam nosso time cada vez mais preparado nas competições que disputaremos.

Você concorda que o Atlético é forte candidato ao título da Libertadores?
Nosso pensamento não é entrar no favoritismo, até porque começamos a competição desacreditados. Poucos confiavam no nosso trabalho, mas estamos provando jogo a jogo que temos condições de brigar pelo título. Outras equipes, como o próprio Fluminense, campeão brasileiro no ano passado, entraram como favoritas, mas acabaram pecando por achar que poderiam vencer facilmente. Agora correm o risco de ficar de fora da fase seguinte. A questão do favoritismo deve ser deixada de lado porque isso só vai nos atrapalhar.

No começo de carreira você jogava como volante, mas gradativamente foi recuando para a zaga, onde se adaptou melhor. Como ocorreu essa mudança?
Na verdade, comecei como zagueiro e fiz partidas como volante. Conversei com vários treinadores meus e preferi jogar recuado, na defesa, onde me sentia melhor. Por necessidade, joguei também no meio campo para substituir um companheiro lesionado ou suspenso. Ser zagueiro é minha essência, porque é ali que eu me sinto bem.

Qual é seu ídolo no futebol?
Quando era criança, gostava do Raí, um jogador que meu pai adorava. Um jogador que tinha qualidade, um exemplo dentro e fora de campo. Ele foi espelho para minha vida como pessoa e jogador.

Você se considera um defensor completo e moderno?
Falta muito para que eu seja completo, porque o futebol tem evoluído. Não me sinto muito moderno, já que procuro fazer o básico. É uma posição em que você corre muito risco, já que pode tentar construir uma jogada, mas pode dar errado. Logo, sofremos e acabamos manchando nossa história no grupo e principalmente numa competição tão importante.

Qual é o melhor zagueiro do país hoje: Réver ou Dedé?
Futebol é momento. De repente, a minha fase pode estar melhor ou pior do que a do Dedé. Ele é um excelente jogador e tem potencial muito grande. Gosto muito de seu estilo, mas não gosto de ficar comparando, até porque somos zagueiros de características distintas. Mas acredito que o Dedé está entre os melhores e por isso vou sempre respeitá-lo.

Você foi um dos mais crucificados pela torcida naquela goleada por 6 a 1 para o Cruzeiro em 2011. Como fez para se reerguer?
Até hoje tenho vergonha e isso não sai da minha cabeça. Minha família foi crucial para dar força naquele momento. Se não fosse ela, não sei o que teria ocorrido. É difícil imaginar a tristeza, porque estávamos brigando para não cair e conseguimos nos salvar. Chegamos ao clássico contra um adversário com a corda no pescoço. Tivemos uma semana muito tranquila para trabalhar e poderíamos derrubar nosso arquirrival. Eu não me culpo individualmente, pois não estava sozinho em campo, mas poderíamos ter vigiado um pouco mais e não deixar tudo cair. Tínhamos a chance de entrar para a história do clube, já que a torcida valorizava mais a queda do rival do que propriamente uma conquista. Nós pecamos muito e deixamos passar a oportunidade. O tombo foi grande, uma vez que jamais pensei que aquela partida teria tanta repercussão até hoje.

Muitos o elogiavam no Grêmio, mas faltou uma conquista pelo clube. Você se cobra por isso?
Em todo lugar que passa, o jogador é lembrado pelas conquistas que teve. No Grêmio, acabei não conseguindo. Mas não me culpo por isso. Em todo clube procurei ganhar algo para ficar marcado, mas fiquei chateado por ter passado pelo Sul sem ter tido um título. Apesar disso, acabei marcando a história do clube. Até hoje tenho reconhecimento por ter passado pelo Grêmio e fazer coisas boas, sendo lembrado pela torcida, mesmo sem um troféu.

Por que você não chegou a tentar uma carreira estável no futebol europeu?
Tive uma pequena passagem pelo Wolfsburg em 2010, mas acabei me frustrando em termos de futebol, pois não me adaptei ao clube. Não fui nada feliz lá. Por isso resolvi voltar, e o Atlético me abriu as portas com carinho e fez eu pensar apenas em continuar aqui. Hoje, não penso em voltar para a Europa, porque o que eu passei lá foi difícil. Disse para mim mesmo que nunca mais voltaria a atuar no futebol europeu e continuo com o pensamento de permanecer no Atlético e tentar construir a minha própria história dentro do clube.

Os atletas alvinegros têm sido assediados em qualquer lugar onde jogam, sobretudo nos compromissos da Libertadores. Isso aumenta a responsabilidade e a pressão psicológica na hora do jogo?
Isso é fruto do que temos feito na Libertadores. O torcedor vai nos cobrar sempre que ele enxerga a equipe capaz de chegar longe. E nós temos provado desde o ano passado que podemos fazer a torcida feliz, pois ela sofria há muito tempo por falta de conquistas. Do jeito que as coisas andam, essa cobrança pode se tornar maior ainda.

O que um jogador tem de fazer para não se deixar levar pela euforia fora de campo?
Um segredo é trabalhar muito a concentração. Não podemos entrar no oba-oba da torcida, pois isso atrapalha nosso rendimento. A partir do momento em que estamos ligados somente no jogo, acabamos executando bem o que o treinador nos pede. Não adianta o torcedor gritar meu nome e eu fazer coisas erradas ou que não estou acostumado a fazer. Isso pode desestruturar a equipe e a torcida fica contra.

Você se sente frustrado por não ter sido lembrado pelo técnico Luiz Felipe Scolari?

Não, pelo contrário. O Felipão está fazendo uma escolha coerente, que deve ser feita agora. Está vendo que alguns jogadores estão acima do seu rendimento e nada mais correto do que ele ter critério nas convocações. O fato de não ter sido chamado me incentiva mais para poder trabalhar e buscar espaço. A partir do momento em que é esquecido, você tem de se cobrar e tentar evoluir, porque o desempenho pode estar abaixo. É uma autocrítica. Quero trabalhar muito para que o Felipão possa estar olhando e, quem sabe mais para a frente, ser chamado.

Além de você, quais outros jogadores exercem o papel de liderança no grupo?

Nosso grupo é muito experiente, com jogadores rodados e que hoje são considerados titulares em qualquer outra equipe do país. Creio que eu sou um dos menos experientes, junto com o Marcos Rocha e o Bernard, que foram revelados aqui mesmo. Mas ao meu lado temos o Leonardo Silva, o Victor, o Júnior César. Ainda temos o Pierre, o Donizete e o Ronaldinho. Todos têm condições de assumir a responsabilidade e ter a personalidade de ser líder.

Caso o Atlético conquiste um título de expressão, como a Copa Libertadores ou Brasileiro, Ronaldinho será o maior ídolo da história do clube?
Por tudo que ele já fez no futebol, seria grande merecedor desse status de maior ídolo. Quando ele chegou, o Atlético teve uma visibilidade muito maior. Podemos dizer que é mérito do Ronaldo, pois o crescimento que a equipe teve depois de sua chegada foi espetacular. Estamos aqui para ser marcados, independentemente de ser ele o mais idolatrado não sei por quantos anos, mas estamos todos remando na mesma direção. Mas certamente ele nunca será esquecido, pois terá seu nome gravado para sempre.

O que faltou ao Atlético para ser campeão brasileiro no ano passado?

Estávamos tão confiantes que o título finalmente viria e creio que essa própria vontade de ser campeão nos atrapalhou um pouco. Faltou um pouco mais de cada um, sobretudo na reta final. O grupo não se cobrou e não teve a responsabilidade na hora certa. Isso fez toda a diferença para que não saíssemos com a conquista, que seria extremamente importante em nosso currículo.

O Galo está classificado para a próxima fase da Libertadores e depois vai começar uma nova competição. O que é preciso fazer para ter êxito nos mata-matas?
Na hora do mata-mata, tem de saber jogar com o regulamento debaixo do braço. É um campeonato à parte e temos que começar do zero. A motivação das outras equipes será ainda mais forte nessa nova fase. Temos de fazer algo diferente para que nossos adversários não consigam nos bater ou não anulem nossas armas. Não podemos ter surpresas, sobretudo em casa. Temos que ter algo mais para chegar e poder passar dessas fases. Nosso objetivo e ir longe, passar por todos esses obstáculos e chegar à grande final. Mas há muito caminho pela frente.