Futebol Nacional
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CONFUSÃO NO HORTO

Reação legítima

Especialistas em segurança descartam excessos na atitude da Polícia Militar

postado em 05/04/2013 08:05 / atualizado em 05/04/2013 08:40

Marcos Vieira/EM/D.A Press
A reação da Polícia Militar às agressões sofridas por alguns jogadores do Arsenal de Sarandí, da Argentina, foi legítima e esperada, sem nenhuma truculência ou excesso, segundo especialistas em segurança. Em campo contra o Atlético, na noite de quarta-feira, os jogadores tentaram agredir o juiz, exigindo que os policiais se posicionassem no chamado “cinturão de guarda”. Exaltados, os argentinos reclamavam da arbitragem e um deles chegou a dar um chute, atingindo o escudo do policial. Outro jogador, que veio correndo por trás, agrediu o soldado com um soco na cabeça, que acertou no capacete.

Advogada criminalista, doutora em direito penal e instrutora da Academia de Polícia Militar, Carolina Montolli diz que os policiais apenas se protegeram de uma ação violenta. “Foi uma atitude normal, prevista pelo Estatudo do Torcedor. A atuação da patrulha de choque deve garantir a ordem e a segurança e, por causa da rebeldia do grupo argentino, a PM nada mais fez do que tentar controlar o tumulto e evitar uma situação pior.”

Segundo o comandante de Policiamento Especializado, coronel Antônio de Carvalho Pereira, os policiais militares do Batalhão de Eventos seguiram as orientações que recebem nos treinamentos para agir em casos de distúrbios, manifestações ou tumultos. Naquele momento, o juiz e seus assistentes deveriam ser preservados. Era um posicionamento tático. Os soldados se organizaram lado a lado – com escudo, bastão e o tonfa, um equipamento de madeira semelhante a um cassetete, menor que o bastão e com dois punhos, usado para contenção em casos de prisão – para cercar e proteger a equipe de arbitragem.

“Minha convicção é de que houve excesso por parte dos jogadores, que demonstraram descontrole emocional. Eles atacaram os policiais que protegiam o juiz, foram desrespeitosos à autoridade constituída, que não podia ficar passiva. Os policiais fizeram o que tinham que fazer”, afirmou o filósofo Robson Sávio, do Núcleo de Estudos Sociopolíticos da Pontifícia Universidade Católica (PUC Minas) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Por causa da aproximação insistente e agressiva dos jogadores do Arsenal, a segunda equipe de contenção entrou em campo, com armas de balas de borracha. “Os policiais usavam equipamentos não letais ou de menor potencial ofensivo e fizeram como nos treinamentos, diante do comandante da unidade, que também estava lá. Se posicionaram numa linha de contenção para preservar o juiz enquanto ele estivesse em campo, numa postura de ação mediante ordem. Os jogadores tentaram agredi-lo e acabaram acertando policiais com socos, chutes e uma garrafa d’água. Por isso, a linha avançou, para afastar os agressores do juiz”, explicou o comandante.

De acordo com o coronel Carvalho, os policiais armados costumam ficar à beira do campo, com foco no juiz. Em jogos internacionais, porém, precisam ser chamados por ele, para entrar em campo. “Só que ele nem teve tempo de pedir. Era uma ação de emergência e os policiais se posicionaram na retaguarda. Nosso objetivo não era o ataque”, disse. “As armas foram levantadas na altura da cintura para impor o distanciamento e a ação seria diferenciada para o caso de os torcedores conseguirem transpor a primeira linha de contenção da polícia.”

PREVENÇÃO Para Robson Sávio, esta foi uma atitude preventiva para mostrar a desproporcionalidade do uso da força. “Era uma forma de inibir a violência dos jogadores, para mostrar ‘não venha porque temos uma condição de força muito superior’. E mesmo assim continuaram sendo agredidos, o que já os autorizaria a fazer disparos com a arma não letal”, afirma ele. “O que há de positivo nessa ação é justamente a mudança na estratégia de atuação, numa reação proporcional à agressão sofrida, inclusive seguindo as diretrizes de organismos internacionais.”

Segundo ele, a reação da polícia acaba sendo sempre um pouco desproporcional, em função da capacidade de reação com arma, cassetete e escudo. No entanto, o especialista considerou nobre e educativo o gesto da comandante de Policiamento da Capital, coronel Cláudia Romualdo, que liderava a tropa e acabou agredida com um chute no peito. “Ela aceitou o pedido de desculpas e abriu mão do valor cobrado pela fiança na agressão que sofreu. Mostrou para seus comandados a importância da mediação de conflitos e que a reação não precisa ser proporcional à violência sofrida.”

MEMÓRIA
Atestado de maus antecedentes
Os problemas causados pelos jogadores do Arsenal, quarta-feira, no Independência, estão longe de serem os primeiros de argentinos em solo brasileiro. Em várias oportunidades os hermanos causaram problemas por aqui. Em 2005, por exemplo, torcedores do River Plate feriram nove policiais militares durante confronto no Morumbi, minutos antes da partida entre o time argentino e o São Paulo, pela semifinal da Libertadores. Mas o principal e mais recente deles aconteceu há menos de quatro meses, quando o Tigre enfrentou o São Paulo pela final da Copa Sul-Americana’2012 e distribuiu pancadas em campo: primeiro no 0 a 0, na Bombonera, depois nos 2 a 0 para o tricolor no Morumbi. Esta partida decisiva teve apenas o primeiro tempo. O atacante Lucas, hoje no PSG, levou uma cotovelada de Orban no nariz. Na saída para o intervalo, o brasileiro mostrou um pedaço de algodão vermelho de sangue para o lateral-esquerdo adversário e recebeu uma peitada do volante Diego Ferreira. Depois de muito empurra-empurra, as equipes se puseram a caminho de seus respectivos vestiários, mas os argentinos tentaram invadir o dos anfitriões e entraram em confronto com seguranças são-paulinos. A Polícia Militar interveio e os atletas do Tigre se recusaram a voltar a campo para os 45 minutos finais, alegando ter sido agredidos. O São Paulo ficou com o título.

ANÁLISE DA NOTÍCIA
O erro da generalização por Daniel Seabra
Foram realmente lamentáveis as cenas presenciadas no Independência depois da partida entre Atlético e Arsenal, quarta-feira, e quem critica as duas partes tem razão até certo ponto. Mas é preciso muita calma para analisar a situação, sob pena de uma generalização de ambos os lados. Os jogadores argentinos se comportaram mal, ao partirem para cima da polícia, desrespeitando os militares, mas esse não pode ser considerado um comportamento de todos portenhos. Além disso, a maioria absoluta dos policiais se comportou de forma exemplar. Nem tanto ao céu nem tanto à terra.

TRÊS PERGUNTAS PARA...
Coronel cláudia romualdo, comandante de Policiamento da Capital
Qual era o papel da Polícia Militar diante do vestiário dos jogadores do Arsenal?
O Policiamento da Capital é responsável pela área externa ao estádio e, como eu era a maior autoridade presente, assumi a responsabilidade no momento em que começaram a acontecer os problemas, tentando estabelecer um cordão de isolamento até a entrada do vestiário para que os atletas tivessem segurança ao retornar.

E o que causou aquela briga generalizada?
Eles agiram de forma totalmente injustificável, agredindo os policiais. A Polícia Militar poderia ter respondido com força, usando bala de borracha ou spray de pimenta, mas optamos pela própria compleição física para não piorar a situação, aumentando o nível de tensão. A tropa estava atrás de mim e não avançou porque não sinalizei. Eu estava de braços abertos, tentando conter os jogadores e solicitando que entrassem para seu vestiário, quando um deles, que já estava do lado de dentro, voltou e me deu um chute no peito. Ele estava de chuteira e só não teve lesão mais grave porque eu estava de colete. Mas no momento em que se dá uma injusta agressão aos policiais que estavam comigo, você acha que eles vão reagir como?

De que forma a senhora classifica a atuação dos policiais?
Não fizeram nada além da forma adequada, não houve nenhum excesso. A tropa foi taticamente obediente e não fez nada que o comandante não determinou, no caso eu. Mas os jogadores do time rival desrespeitaram o Estado de Minas Gerais através de sua autoridade policial. Foi uma atitude vil e covarde e os policiais revidaram uma injusta agressão numa medida absolutamente cautelosa. Reagiram no intuito de controlá-la, tanto que a magistrada deu a eles a oportunidade de apresentar ferimentos ou indicar algum policial por abuso de autoridade, o que não ocorreu porque simplesmente não houve excessos.