Para Giulia, com amor

Na vida, nada como um dia depois do outro. No futebol, esta relação parece ainda mais intensa. Quando descia para o vestiário na última quarta-feira, o atacante Roger ouviu a pior agressão da sua carreira. Das sociais da Ilha, um torcedor disparou: “Você tá cego igual à sua filha”. O atleta,com toda a razão, se revoltou. Giulia, hoje com cinco anos, nasceu com uma má formação genética que compromete sua visão.

Naquela mesma noite, Roger contou que ao chegar em casa encontrou a filha feliz pelo gol que o pai havia marcado na vitória contra o Serra Talhada: “Ela ouve todos os jogos e prefere o rádio porque o narrador fala mais o nome dos jogadores”.

Ontem Giulia certamente ouviu a narração do belo gol marcado pelo seu pai, diante do Central, em Caruaru. Roger foi decisivo para a primeira vitória rubro-negra fora de casa nesta temporada. No lance do gol, aos 7 minutos do 2º tempo, demonstrou inteligência ao dar um drible de corpo no zagueiro, e finalizar de primeira. O goleiro Rodrigão, em tarde inspirada, só olhou a bola estufar a rede.

Enquanto Roger erguia as mãos para o alto em Caruaru e Giulia vibrava em casa no Recife, certamente aquele torcedor que o agrediu verbalmente dias antes também comemorou o gol, ainda que envergonhado por sua atitude. Poderia haver uma resposta melhor? Poderia haver uma lição melhor?

A história que envolveu Roger, a sua filha e o torcedor sem rosto foi o episódio extremo daquela noite de quarta que interferiu diretamente na tarde de domingo. A postura da torcida na Ilha - com vaias e xinagamentos - foi sentida pelos jogadores. E, de certa forma, despertou uma necessidade de dar a resposta. O Sport que venceu o Central está longe de ser um grande time e repetiu erros que irritam o torcedor desde o início do ano. Mas a evolução é inegável.

Foi uma equipe mais dedicada, mais organizada e mais veloz na transição da bola entre a defesa e o ataque. A vitória foi justa e o placar de 1 a 0 foi até pouco - sobretudo pelo 2º tempo (já que no 1º correu muitos riscos). O texto termina como começou: Nada como um dia depois do outro...