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Virada

Filho do Coque, Walter supera violência e drama familiar graças ao futebol

"Se não fosse o futebol, eu seria mais um perdido no Coque", disse o atacante do Goiás, que teve um irmão assassinado e outro preso quando era conhecido apenas por Quico

postado em 11/08/2013 08:00 / atualizado em 09/08/2013 19:34

João de Andrade Neto /Esportes

Ricardo Fernandes/DP/D.A Press
Ao marcar o primeiro dos seus dois gols na vitória do Goiás sobre o Náutico por 2 a 1, na última quarta-feira, o atacante pernambucano Walter correu em direção a uma câmera de TV e gritou "É Coque aê!". Uma forma de afirmar as origens. Até os 14 anos, Walter foi criado na comunidade pobre do Recife. Era conhecido como Quico. Mais um entre tantos meninos do lugar que tinha o sonho de virar jogador de futebol. E, ao mesmo tempo, obrigado a conviver quase que diariamente com a violência. Da qual também foi vítima.

Aos seis anos, Walter teve um irmão assassinado no Coque. Mais tarde, já como atleta profissional, recebeu a notícia de que outro irmão havia sido preso por roubo (ainda cumpre a pena). Segundo o próprio Walter, o futebol foi o responsável por mudar o destino do pequeno Quico. "Se não fosse o futebol, eu seria mais um perdido no Coque. Poderia ser um ladrão, um matador ou estar puxando uma carroça", disse ao Superesportes, por telefone.

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Aos 24 anos, Walter sabe o que fala. Enquanto alimentava o desejo de mudar de vida por meio da bola, o jogador teve que ser, antes de tudo, um sobrevivente. "Já vi a morte de perto várias vezes. Já fugi de tiroteio, corri no meio das balas. Já presenciei assaltos, pessoas sendo presas. Com 10 anos, eu vi muita coisa que homem feito nunca viu", recordou. "Passei fome. Muitas vezes saía de casa pela manhã sem tomar café. Minha mãe corria atrás de tudo. Andava na favela com uma caixa na cabeça vendendo perfume. Pedia dinheiro emprestado para eu poder ir treinar."

Ricardo Fernandes/DP/D.A Press
 

A virada
A história de Walter começou a mudar quando ele passou em uma peneira feita pelo Santa Cruz, dentro do Coque. Tinha 13 anos. De lá, o jogador se transferiu para as categorias de base do Vitória-BA, São José-RS e depois para o Internacional, onde se profissionalizou. Antes de chegar ao Goiás, o atacante ainda passou por Cruzeiro e Porto, de Portugal.

Apesar do passado difícil, Walter faz questão de não cortar os laços com a comunidade. Em dezembro, quando está de férias, sempre aparece no Coque para rever os amigos e jogar pelo Guarani, o seu time de pelada. Lá ainda moram seu pai e o irmão mais velho. Ambos por opção. A mãe se mudou para Boa Viagem, para um apartamento comprado pelo atacante. Walter agora quer ajudar a mudar a visão do lugar onde nasceu. E dá a dica para os clubes.

"Se um clube quiser descobrir um craque, tem que entrar na favela. Lá existem muitos meninos bons de bola, esperando apenas uma oportunidade para mudar de vida. Para usar o futebol como uma porta de saída. Hoje eu me sinto um vencedor e um exemplo para muita gente. Até para o meu irmão que está preso. Ele chora todas as vezes que eu o visito. Hoje, a imagem do Coque já mudou um pouco e espero que eu possa ajudar a mudar ainda mais", sonha Quico.

ALE CABRAL/ FUTURA PRESS