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Clubes e empresas apostam alto no sócio-torcedor

Empresas apostam no potencial de compra de sócios-torcedores e levam para as gôndolas de supermercados descontos em mais de 600 produtos. Vendas geram faturamento milionário

postado em 12/08/2013 09:58 / atualizado em 12/08/2013 10:10

Maria Tereza Correia / EM DA PRESS
O fim de semana foi marcado por goleada nos estádios. No varejo, os gols vieram com chamativos descontos nas vendas de cerveja, alimentos e material esportivo para torcedores de 27 clubes no país. A campanha comandada pela Ambev reuniu nove empresas parceiras da companhia no Movimento por um futebol melhor, que abriu, em janeiro, ampla trilha de faturamento em torno da paixão pelo futebol. Os fabricantes se ofereceram para dar vantagens aos chamados sócios-torcedores, aqueles que contribuem financeiramente para o time do coração, muitas vezes com direitos que vão pouco além da preferência na compra do ingresso em dia de jogo. A promoção no sábado e ontem, no estilo “leve três, pague dois”, envolveu 600 itens, dirigidos a 556,7 mil torcedores associados em redes de supermercados credenciadas.

A pura paixão pelo futebol se reverte em nova fonte de receita milionária da indústria e das empresas prestadoras de serviços que pegam carona na política dos clubes brasileiros de transformar o torcedor em sócio. Os cálculos da receita faturada com os descontos no fim de semana começam a ser feitos. A primeira campanha do programa foi realizada em maio, no fim de semana de abertura do Campeonato Brasileiro, gerando R$ 9 milhões adicionais em novas mensalidades aos cofres dos clubes participantes do movimento, de acordo com informações da Ambev. O gerente corporativo da companhia, Ricardo Roza, afirma que as empresas parceiras da iniciativa têm mantido descontos desde janeiro, de 10% em média, na compra de produtos de uso corriqueiro das famílias, de comida e bebida a artigos de higiene e limpeza. Basta apresentar a carteira de sócio-torcedor nos caixas dos supermercados conveniados. Em Minas, participam as redes Extra, Carrefour, Carrefour Bairro, Super Nosso, Verdemar e Supermercados BH.

A julgar pelo modelo dos programas de sócios-torcedores dos clubes mineiros, o ingresso de descontos concedidos por grandes fabricantes e prestadores de serviços na relação limitada de benefícios é mais que bem-vindo. Os cartolas subverteram o conceito clássico do acionista no mundo empresarial, aquele que põe dinheiro no negócio, tem retorno financeiro, por meio de dividendos, e participa de decisões vitais como a contratação de quem vai comandá-las. No mundo onde a bola rola, os torcedores associados contribuem sem direito a lucro e estão sujeitos a perder os direitos em caso de inadimplência.

Se os clubes não podem ser cobrados como o são as companhias abertas, o fato é que, para não correr o risco de desperdiçar a ideia, os mineiros América, Atlético e Cruzeiro informam, agora, estarem correndo atrás de novas formas para reconhecer o valor do sócio-torcedor. E que valor. No ano passado, os clubes brasileiros faturaram R$ 180 milhões, segundo levantamento feito pelo consultor de marketing esportivo Amir Somaggio, com as mensalidades cobradas desses investidores só por amor às camisas de Ronaldinhos e Fábios, entre outros craques que eles gostariam de ver contratados, mas nem poderiam pensar em interferir na escolha. Algo que, claro, fica por conta dos cartolas.

Marcelo Sant'Anna / EM DA PRESS
“Faltam ações comerciais dos clubes voltadas para os torcedores, inclusive por meio de seus patrocionadores. Na maioria dos programas no Brasil, os sócios-torcedores não são nada mais que clientes preferenciais. Na Europa, há clubes com 100 empresas associadas, oferecendo vantagens em produtos e serviços que não vão aparecer nos uniformes dos jogadores”, afirma Somaggio. O consultor avalia os programas do Coritiba, Internacional, Grêmio e Atlético Paranaense como os mais bem-sucedidos financeiramente. Apesar da limitação de ocupação dos estádios, os clubes têm muito ainda a oferecer aos sócios-torcedores, na avaliação de Somaggio, também compartilhada por Ricardo Roza, da Ambev.

A cervejaria viu um grande potencial de vendas associado ao futebol, diante de estatísticas indicando um universo de 40 milhões de torcedores no Brasil. “O grande desafio sempre foi aproximar a marca do torcedor. Imaginamos um modelo em que as três partes ganham (os fabricantes que dão descontos, os sócios-torcedores e os clubes). Sabemos que cerca de 90% das pessoas têm um time do coração e 60% acompanham esse time no dia a dia”, afirma.

META OUSADA O Movimento por um futebol melhor reúne Ambev, Unilever, PepsiCo, Seara, Danone, Bradesco, Netshoes, Burger King, Sky e TIM. A Danone identificou nele um canal para associar os produtos da marca a hábitos de vida saudáveis e à prática do esporte, destaca o diretor de marketing da Danone Brasil, Cesar Tavares. “Esperamos que o fortalecimento dos clubes beneficie os times profissionais e, consequentemente, favoreça o acesso ao esporte de cada vez mais brasileiros”, afirma. O executivo diz que, se o projeto atingir algo em torno de 3,5 milhões de participantes dos clubes, o que representaria 2% da base de torcedores, será possível arrecadar ao redor de R$ 1 bilhão em três anos.

Rodolfo Nejm, superintendente da rede Super Nosso, que aderiu ao movimento em janeiro, destaca o benefício que a empresa tem ao fidelizar o cliente e atrair novos consumidores. Os descontos oferecidos são bancados pelos fabricantes, cabendo ao varejo investir no sistema automático para contabilizar as promoções nos caixas, e ajudar na divulgação. “Geralmente essas promoções levam ao crescimento de 30% das vendas, em média”, afirma.

Quanto mais vantagens; mais lucros

As empresas trabalharam na ampliação de vantagens para os sócios-torcedores, sinal positivo para que os próprios clubes busquem valorizar esse grupo em crescimento. Movidos pelo amor ao time, eles não encaram a contribuição financeira como investimento, longe disso, mas desejam algum retorno do dinheiro além da comodidade de não enfrentar fila para comprar ingressos e dos brindes eventuais do clube. O professor Célio Roberto Melillo, atleticano apaixonado, não esconde a insatisfação depois de ter feito as contas dos R$ 2.400 que pagou por um ano de adesão ao programa de sócio-torcedor do clube, concluindo que ficaria mais barato comprar os tíquetes a cada apresentação do time.

“Não se privilegia quem está sempre no campo. Só se explora a vontade do torcedor de assistir aos jogos, ainda que o time esteja em má performance no campeonato.” O benefício do sistema de pontos para troca por produtos oferecidos pelo clube ainda é pouco, na avaliação de Melillo, que com 2 mil pontos teria direito a sabonetes e gibis, segundo o torcedor.

Concorda com ele o músico e médico-veterinário Renato Amado, fiel torcedor do América, que não se furta a também fazer as contas dos gastos com o lazer que tem lugar garantido no orçamento. Considerando a mensalidade de R$ 73 como sócio-torcedor e as despesas quase inevitáveis nos dias dos jogos, o desembolso se aproxima de R$ 3 mil durante o ano, levando em conta a presença em todas as partidas do time, ao jogar em casa. “Direitos além de ingressos ou da preferência na compra deles e da participação em eventos do clube valeriam o dinheiro que o sócio paga. Afinal, quem vai ao campo não vai beber água em bebedouro”, afirma.

Maria Tereza Correia / EM DA PRESS
O cruzeirense Luiz Sérgio da Silva, sócio-torcedor desde 2009, não admite a possibilidade de deixar de gastar R$ 1.800 anualmente para ter a carteira do clube que dá acesso a todos os jogos no ano. “A participação dos sócios-torcedores faz diferença. Quando o clube investe, melhor, mas o duro é quando a gente paga e não vê nada de interessante nos jogos”, afirma. Para Ricardo Roza, da Ambev, as avaliações dos sócios reforçam a necessidade de mais divulgação dos programas de descontos das empresas envolvidas no Movimento por um futebol melhor.

ADESÃO Roza diz que há mais empresas em processo de adesão ao projeto, assim como as redes de supermercados. De janeiro até a semana passada, o executivo contabilizou a entrada de 390 mil sócios-torcedores como beneficiários do movimento, dos quais 170 mil foram de novos integrantes dos clubes que já participam, universo que teria rendido mais R$ 67 milhões às agremiações. Atlético Mineiro e Cruzeiro foram os que mais registraram aumento no número de sócios-torcedores, o que explica a atenção especial das empresas com as oportunidades de ganho no estado.

Recém-chegado ao batalhão de empresas conveniadas, a rede mineira de supermercados Verdemar prevê a oferta de cerca de 300 itens com descontos para os sócios-torcedores, informa Antônio Celso Azevedo, superintendente comercial e marketing. “Entramos para satisfazer o desejo dos clientes e esperamos atrair mais consumidores”, diz.

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