Futebol Nacional
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COPA DO BRASIL

Os sons de um duelo (final)

Crônica retrata os sons de Belo Horizonte durante decisão da Copa do Brasil

postado em 28/11/2014 16:27 / atualizado em 28/11/2014 17:08

Jefferson da Fonseca Coutinho /Estado de Minas



Noite fria e de poucas estrelas. Tudo pronto! São mais 90 minutos, derradeiros, para a eternidade. No alto do Bairro Olhos d’água, a chuva sereníssima descolore o horizonte. No Mirante, o telão de mais de 300 metros quadrados rasga no céu, janela de seis andares para o Mineirão, na Lagoa da Pampulha. Uma tecnologia colossal em pausa com a sétima arte para transmitir o clássico dos clássicos, o confronto épico, o maior e mais esperado embate da história do futebol de Minas Gerais. Vale o mundo na Copa do Brasil deste ano.

Ladeira abaixo, na BR-356, por R$ 29,90 a hora pode-se ver o jogão em janela diminuta, de tela plana, com cobertor de orelha, hidromassagem e tudo. Os ocupantes da Range Rover em tons de cinza preferiram o estabelecimento do amor ao Super Vivo Open Air. O fogo e o entusiasmo da noite são outros e pipocam ao longe. É Galo! É Cruzeiro! É festa do futebol da terra. O asfalto sentido Savassi é bem diferente às 22h30 daquele de gargalo infernal bastante conhecido dos belo-horizontinos do Sul. Os gritos de “campeão!” se misturam aos estrondos de algazarra no Morro do Papagaio.

O bronze dobrado à mão pelo escultor Antônio Van Der Weill resplandece azul na imagem de Tiradentes. No cruzamento das Avenidas Afonso Pena e Brasil, o homem solitário com a corda no pescoço parece ouvir, sério, o som ao redor. E tome mais rima de buzinas e gritos de guerra. Perto do Mercado das Flores, na esquina com Rua da Bahia, a barata bezerra atravessa na faixa de pedestre. Enquanto o bicho alcança a calçada, foguetório e buzinaço. O rapaz de celular na mão conta o gol: “Tardelli! Aqui é Galo!”.

O intervalo se foi num estalo. Com o segundo tempo se esvaindo nas janelas eletrônicas de todo o mundo, a Rua São Paulo é estacionamento de pickups, kombis e carretinhas de reboque – todas abarrotadas de bebidas para madrugada adentro e afora. Fatura-se uma bolada com o que é eterno. Do outro lado, na Rua dos Caetés, pequeno exército da Polícia Militar está em ponto de bala para ganhar a cena. Longe dos sujeitos da ordem, Ingrid Fernanda, de 22 anos, é o melhor sorriso da Praça da Estação. A bela quer mais um gol.

O vendedor de bandeiras guarda parte do estoque azul no uninho tunado. “É. Vai dar Galo!” Diz que só no domingo e na segunda-feira vendeu mais de 200 unidades do Cruzeiro. “Já tá bom, né!?”. E a torcida ferve no calçadão da Avenida Amazonas. Um palavrão aqui, dois acolá – como tem a boca suja o magricela careca, que acende um cigarro e azucrina as duas moças da esquina. Por fim, o sem-noção toma um xingo e decide azarar do outro lado da rua. O clima esquenta. A bomba assusta. “Só dá Galo! Podia fazer mais uns três!”, diz o bombadão do dragão minguado tatuado no braço. Multiplicam-se alvinegros, ambulantes e a guarda.

Não tão longe dali, na Savassi, outro solitário sujeito de bronze rouba a paisagem e ganha a amizade dos cruzeirenses Bruno, Nina e Hélio (foto). Diferentemente do alferes na Avenida Afonso Pena, Roberto Drummond parece felicíssimo na Praça Diogo de Vasconcelos. A imagem do escritor está a poucos metros de estabelecimento em festa – vem de lá, da sacada do restaurante, o anúncio do fim do maior de todos os clássicos. Coro e orquestra de buzinões e fogos são cantos de batalha vencida. E o Roberto, autor da célebre frase que colocou o Galo acima do vento, sorriu o cheiro da bandeira amada como em outros tempos de texto e alegria.

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