Sérgio Rodrigues em conversa com Zezé Perrella (Foto: Gustavo Aleixo/Cruzeiro)

O Cruzeiro informou na noite desta terça-feira (3/8) que o Conselho Deliberativo aprovou, por ampla maioria, a constituição da Sociedade Anônima do Futebol. A reunião extraordinária ocorreu de forma híbrida - presencial, no clube do Barro Preto, e online - e contou com a participação de 224 conselheiros, sendo 217 favoráveis ao projeto, cinco contrários e um nulo.



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O presidente Sérgio Santos Rodrigues, que retornou de viagem do Rio de Janeiro após fechar a contratação do técnico Vanderlei Luxemburgo, discursou aos presentes no encontro em Belo Horizonte. Imagens divulgadas pelo clube mostram ainda a presença do ex-mandatário Zezé Perrella e do presidente do Conselho Deliberativo, Nagib Geraldo Simões.


A abertura para transformar o clube em Sociedade Anônima do Futebol é o caminho mais rápido que o Cruzeiro entende encontrar para solucionar as dificuldades financeiras. Conforme o balanço de 2020, as dívidas da instituição são calculadas em quase R$900 milhões, ante uma arrecadação inferior a R$120 milhões com o rebaixamento à Série B.

Com a SAF, o Cruzeiro formará uma empresa para gerenciar as atividades do futebol, poderá vender até 49% de suas ações no mercado e manterá a associação civil como sócio majoritário. O novo modelo de clube-empresa (projeto de lei 5516/2019) já foi aprovado no Senado e na Câmara dos Deputados em meados de julho e pode ser sancionado tacitamente caso o presidente Jair Bolsonaro não se manifeste em um prazo de 15 dias após a apreciação do Poder Legislativo. Todavia, o próprio chefe do Executivo se mostrou favorável à mudança.



O conselho de administração da SAF administrará as atividades de futebol e se responsabilizará por nomear um CEO e uma diretoria. A composição do grupo será discutida no acordo de acionistas.

Assim, quase todos os ativos do Cruzeiro (direitos econômicos de atletas, direitos de transmissão, programa de sócio, publicidade e patrocínio) ficarão sob gestão empresarial. Por outro lado, imóveis e clubes de lazer continuarão como patrimônio da associação.

O valor das ações da SAF será definido com auxílio da consultoria norte-americana Alvarez & Marsal. O Cruzeiro entende que, apesar das crises financeira e esportiva, a marca do clube é muito atrativa e pode gerar grande potencial de valorização.




De acordo com o Cruzeiro, os recursos arrecadados com a venda de participação na SAF serão destinados prioritariamente para o pagamento de dívidas mais onerosas, além de investimento no elenco e na infraestrutura dos centros de treinamentos.

A proposta da diretoria celeste diz que 20% dos rendimentos da SAF serão destinados ao pagamento de dívidas. O plano de amortização será feito em um acordo de acionistas.

“Conforme previsto no Projeto de Lei, o time que constituir uma empresa para gerir o futebol poderá dissociar suas dívidas da associação. Desta forma, uma dívida do clube não irá interferir no futebol, como acontece atualmente”, diz trecho do documento enviado aos conselheiros.





Opiniões de empresários e conselheiros


Empresários e conselheiros ligados ao Cruzeiro se mostraram favoráveis à formação da Sociedade Anônima do Futebol. Nessa segunda-feira, integrantes do Conselho Gestor que administrou o clube no primeiro semestre de 2020 organizaram um workshop para tirar dúvidas sobre o projeto do clube-empresa. O evento contou com a participação do advogado carioca Pedro Trengrouse, que auxiliou na construção do texto do projeto de lei de autoria do senador mineiro Rodrigo Pacheco.

Em nota enviada à imprensa, o grupo de conselheiros, associados, empresários e torcedores fez quatro recomendações relacionadas à aprovação da SAF pelo Cruzeiro:

1. Que o Clube avalie o percentual de participação Clube/Investidor (51% ) para que traga garantia jurídica para as partes, sem que isso inviabilize a atratividade do negócio; 

2. Que o Clube apresente um plano de reestruturação de dívida, como previsto em lei e que garanta sua execução diante das condições econômicas e financeiras da entidade, respeitando os credores; 

3. Que o Clube se comprometa com a participação das empresas já contratadas (Ernst & Young; Alvarez & Marsal e XP Investimentos) na condução integral do processo de criação, formatação e operacionalização da SAF. 

4. Que o Conselho Deliberativo do Cruzeiro crie uma comissão ou comitê para acompanhar as negociações junto aos potenciais investidores e aprovar a formatação final do negócio e acordo de acionistas a ser discutido entre a Diretoria Executiva e investidor.




Os membros do grupo gestor que assinaram o texto são Alexandre Faria, Anísio Ciscotto, Carlos Ferreira Rocha, Gustavo Gatti, Emílio Brandi, Jarbas Reis, Kris Brettas e Saulo Fróes.

Nesta terça-feira, o próprio site oficial do Cruzeiro publicou depoimentos favoráveis à composição da SAF. O empresário Régis Campos, dono da construtora Emccamp, que patrocinou a Raposa em 2020, afirmou que o dinheiro de investidores seria a única solução para reerguer o clube.

“Gostaria de dizer aos conselheiros do Cruzeiro sobre a importância da aprovação deste projeto. Infelizmente, gestões passadas quebraram nosso time. Nós precisamos nos reerguer e o clube-empresa é a única solução. Essa vai ser nossa salvação. É muito importante essa aprovação para que possamos buscar dinheiro e sustentar o Cruzeiro. Tivemos dois anos muito ruins, sem presença de público e de outras receitas. É de suma importância que o Conselho aprove o clube-empresa, dentro dessa urgência. Sem essa aprovação, teremos um cenário inviável”.




Alvimar de Oliveira Costa, presidente do Cruzeiro de 2003 a 2008, também se posicionou favoravelmente à SAF. Ele citou exemplos de sucesso, como a Juventus, da Itália, e o Benfica, de Portugal.

“Eu apoio a SAF e tenho certeza de que o melhor caminho é que nosso Conselho vote pela aprovação. Na minha avaliação, esse projeto de lei chegou até tardiamente ao Brasil. Já na época em que conquistamos a Tríplice Coroa, em 2003, eu sentia uma pontinha de inveja de clubes europeus como o Benfica, que já operavam em sistema de Sociedade Anônima Desportiva. Mesmo chegando tardiamente ao nosso futebol, creio que essa é a nossa maior e talvez única esperança para que o Cruzeiro tenha um respiro maior e se recupere mais rapidamente”.

Acordo com corretora


A XP Investimentos ficará responsável por captar investimentos para a SAF e também por abrir o capital na bolsa de valores. Em participação no podcast Superesportes Entrevista, no último dia 16 de julho, o economista e consultor do Banco Itáu BBA, Cesar Grafietti, alertou que a inserção do Cruzeiro no mercado de ações ainda deverá levar algum tempo.



“Para virar uma S.A., ação em bolsa, vai levar mais tempo ainda. Você precisa organizar a estrutura, você precisa ter três anos de um balanço bem auditado, você precisa ter um período de reestruturação da companhia, para fazer sentido você ir para a bolsa de valores”, disse.

“Quando você vira uma empresa de capital aberto, você tem custos maiores do que de uma LTDA, ou de uma SAF de capital fechado. Precisa ter uma estrutura robusta para ir para a bolsa. Não pode ser qualquer um que resolve abrir capital e ir para lá. É um processo que deve levar muito mais tempo. Pensar em capital aberto, em bolsa, é um processo mais longo, de três, quatro anos”, continuou.

“O que deve acontecer, uma suposição bem otimista, é que em seis meses, oito meses, o clube consiga estruturar a SAF, encontrar o investidor e, aí sim, se transformar efetivamente em empresa. Até lá, o máximo que vai acontecer é criar a SAF e separar os ativos dos passivos. O que vai ficar de um lado (associação) e o que vai ficar de outro (SAF). Depois, que vai atrás do investidor. É prematuro acreditar que o Cruzeiro vai terminar 2021 como uma empresa, com sócio e tudo mais, exceto se for uma grande ação entre amigos, com empresários cruzeirenses”, complementou Grafietti.

* Com informações dos repórteres Rafael Arruda, Thiago Madureira e Tiago Mattar