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COPA LIBERTADORES

Mulheres como símbolos de Atlético e Danubio: as histórias de Alice Neves e María Lazaroff

Como duas senhoras ajudaram no crescimento dos clubes de Brasil e Uruguai

postado em 11/02/2019 06:00 / atualizado em 11/02/2019 19:22


A presença da figura feminina nos primórdios de suas histórias é um elo entre Atlético e Danubio, adversários desta terça-feira, às 19h15, no Independência, pela segunda fase da Copa Libertadores da América. Por ter empatado (2 a 2) no Uruguai, o Galo se classifica com vitória simples ou empates por 0 a 0 ou 1 a 1.



Em um ambiente machista como o futebol, chama atenção o fato de duas mulheres contribuírem no crescimento dos clubes de Brasil e Uruguai. No Atlético, a senhora Alice Neves, mãe de Mário, um dos fundadores do clube, foi a primeira grande atleticana da história. Já María Mincheff de Lazaroff foi a ideóloga do nome Danubio e mãe de alguns dos precursores da equipe.

Mesmo em um esporte dominado pelos homens, as mulheres foram atraídas e demonstraram paixão pelo futebol ainda no início do século XX. Apesar dessa admiração, elas ficavam longe da bola, chutada apenas pelos homens. Restavam a elas ajudarem nos bastidores e assistirem aos jogos.

O trabalho de mestrado de Raphael Rajão Ribeiro (UFMG) descreve os primeiros anos do futebol em Belo Horizonte, uma capital então recém-fundada (1897). Essa foi a época vivida por Alice e outras mulheres entusiastas do Atlético, clube que nasceu em 1908. "Percebido como prática sofisticada, o futebol foi capaz, desde o seu início na capital mineira, de atrair a presença feminina numa sociedade marcada pelo machismo. A constituição de ambiente compreendido como familiar possibilitava a frequência das meninas e das mulheres, assim como sua participação na vida dos clubes".

Arquivo Estado de Minas


Coube a dona Alice a missão de organizar a primeira torcida feminina do Atlético. O próprio site do clube conta a história. "A primeira torcida organizada que se conhece foi fundada em Belo Horizonte, ainda em meados da década de 1920. Dona Alice Neves, mãe de Mário Neves, um dos fundadores do clube, uniformizava e costurava bandeirinhas para que a equipe de futebol contasse com o apoio da sua torcida feminina. Foi com o coral dessas garotas que, na inauguração do Estádio Antônio Carlos, em 1929, o nosso hino original foi entoado nos campos pela primeira vez", diz a página do site do Atlético dedicada às torcidas organizadas.

O escritor Ricardo Galuppo, no livro "Raça e amor: a saga do Clube Atlético Mineiro vista da arquibancada", destaca a participação decisiva de Alice Neves na fundação do clube. "A reunião terminou, e, a partir daquele dia, passaram a se encontrar na casa de um dos fundadores, Mário Neves, no número 317 da Rua dos Guajajaras, no quarteirão entre a Avenida João Pinheiro e a Rua da Bahia.[...] Foi ali que a grande Alice Neves, mãe de Mário, entrou definitivamente para a vida do Atlético. Sem ela, o sonho da rapaziada dificilmente teria ido adiante", ressalta Galuppo, no livro.

Dona Alice, como era chamada, ficou conhecida como a 'Madrinha do Galo'. O clube a reconhece como autora do primeiro uniforme e da primeira bandeira do Atlético. Em seu livro, Galuppo relata a saga de Alice para montar a torcida formada por garotas atleticanas, ainda no início do século XX.

"O Atlético foi o primeiro time do Brasil a ter uma torcida feminina organizada. Quem a criou foi essa mulher fantástica, que apoiou os meninos assim que tomou conhecimento da ideia e jamais permitiu que o sonho fosse posto de lado. Alice ia de casa em casa pedindo aos pais autorização para que suas filhas – algumas delas, irmãs dos próprios fundadores – integrassem o grupo. Conseguiu reunir cinquenta moças. Alice Neves era uma torcedora e tanto! As camisas e os calções usados pelos primeiros jogadores foram feitos em sua casa. Foi, sem dúvida, o primeiro exemplo de espírito atleticano da história”, conta o livro.

Homenagem em estádio

REPRODUÇÃO


A importância de María Mincheff de Lazaroff ao Danubio é tão grande que o estádio do clube foi batizado com o nome dela. Tudo começou quando ela deixou a Bulgária e chegou ao Uruguai na tentativa de uma vida melhor, nas primeiras décadas do século XX.

Três de seus filhos, Miguel, Juan e Apostol, além de um grupo de amigos, participavam de um time de futebol denominado Tigre. Eles se reuniam na região de Curva de Maroñas, em Montevidéu, onde moravam, para jogar bola.

Descontentes com a nomenclatura da equipe, os amigos resolveram fazer um encontro na casa de María, mãe de três dos garotos da equipe, para alterar o nome Tigre. Participante da reunião, a senhora deu a sugestão de Maritza, um rio que corta Grécia, Bulgária e Turquia. Era onde ela lavava roupas na infância. O nome foi rejeitado porque pareceu muito feminino para um time de homens. María insistiu, mas agora com outra ideia: Danubio.

A mulher era fascinada com rios. Danubio é o segundo maior rio da Europa em extensão, atrás apenas do Volga. A nascente se localiza na Floresta Negra, na Alemanha. O encontro com o mar ocorre na Romênia. Ao todo, o rio corta dez países. O nome foi aprovado sem nenhuma objeção.

Em maio de 2017, veio a homenagem. Em uma assembleia extraordinária, os sócios decidiram rebatizar o nome do estádio para Jardines del Hipódromo - María Mincheff de Lazaroff. Este é o primeiro estádio com nome de mulher no futebol uruguaio.

Divulgação / Danubio


Futebol feminino

Se duas mulheres são parte das histórias de Atlético e Danubio, como os clubes trabalham o futebol feminino?

O Atlético criou um projeto com o Prointer Futebol Clube neste ano para para se adequar às exigências da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) e da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). De acordo com as normas das entidades, os clubes brasileiros que disputam a Copa Libertadores e a Série A devem ter equipe de futebol feminino em 2019.

Divulgação / Atlético


Na parceria com o Prointer, o Galo informou que oferece estrutura para o projeto. As atletas amadoras recebem benefícios como bolsas, orientação nutricional, convênio com academia, metodologia de treinamento e materiais esportivos. As atletas treinam na Arena Inconfidência, no Bairro Concórdia, região Nordeste de Belo Horizonte. O local das partidas ainda não está decidido.

Diferentemente do futebol masculino, as meninas não recebem altos salários e não contam com o glamour da profissão, com assédio de fãs e da imprensa. Mesmo vestindo a camisa do Galo, as atletas seguem desenvolvendo atividades paralelas ao futebol. As jogadoras trabalham em outros empregos e se dedicam aos estudos.

No Danubio, o projeto de futebol feminino é um pouco mais consolidado que o visto no futebol brasileiro. Este ano o clube fundou a Escola de Iniciação Esportiva para meninas. Assim, o clube de Montevidéu criou as categorias Sub-7, Sub-9, Sub-11 e Sub-13.

Em sua página na internet, o clube diz que a intenção principal não é necessariamente formar jogadoras, mas sim desenvolver a criatividade das meninas, potencializar as habilidades gerais, aumentar a integração social e desenvolver um estilo de vida saudável.

O Danubio feminino disputa o Torneo Clausura da Primeira Divisão B. Diferentemente do time masculino, as mulheres não jogam no estádio  Jardines del Hipódromo - María Mincheff de Lazaroff. As partidas são disputadas no Complejo Ingeniero Héctor del Campo, o centro de treinamentos no qual a equipe masculina treina. Assim como no Brasil, o futebol feminino é amador no Uruguai.

Divulgação / Danubio


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