Fred Melo Paiva
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DA ARQUIBANCADA

Façamos um pacto com o homem lá embaixo

"Se no entanto sua religião não permite brincadeira nem ironia com as coisas sagradas (...), então só resta a você, atleticano de Deus, torcer e rezar"

postado em 07/10/2017 12:00

Bruno Cantini/Atlético
Pessoal, aceitemos: Deus fechou contrato de exclusividade com o Fábio. Só pode. E por isso, assim como o arqueiro de mãos de alface e pés de quiabo, Ele agora está de costas pra gente. Senão, como explicar esta sequência de infortúnios? Cruzeiro campeão, Flamengo vice, Micale, Oswaldo de Oliveira, Clayton, o Galo flertando com a série B, o Fred revivendo seus dias de cone, a CBF classificadaça, a Argentina fora da Copa. Aqueles dois pênaltis que o Victor quase pegou na decisão contra o Londrina – onde estava o homem lá em cima, a não ser tramando a excomunhão do santo de casa que não fez milagre?

Se Deus não é por nós, quem não será contra nós? O diabo, uai, é lógico. Façamos então um pacto com o homem lá embaixo! O Lula não fez pacto com o PMDB pra ganhar eleição? O FHC não fez pacto com os DEMos? O Janot com o Joesley, o Moro com o Youssef, a Marina com o Aécio, a Dilma com o Temer, as tias da novena com o Alexandre Frota, os neoliberais com os fundamentalistas evangélicos, o Sepultura com o Luan Santana – pacto com o diabo no Brasil é igual o Refis: todo mundo quer aderir e, de mais a mais, quando a conta chega você joga tudo no colo do capeta, renova o acordo e vamo que vamo.

No nosso caso em particular, o que temos a propor ao demo é alguma coisa mais ou menos assim: se o Galo não cair, apoiaremos Bolsonaro para presidente; dê-me os 45 pontos e serei a favor de uma ponto 45 na casa de todo cidadão de bens, assim no Brasil como em Las Vegas. Faça com que esse elenco tenha o mínimo de compromisso com a nossa camisa e a nossa história, o mínimo de vontade de ganhar, e estaremos 100% comprometidos na luta contra os bilaus que pendem museus afora desde Picasso, que inclusive só chamava Picasso por ser um devasso pedófilo comunista safado, cuja Guernica não passa de uma suruba com animais. Você levaria seu filho pra ver um picaço, digo, um Picasso? Mas uns peitos e umas xerecas na Sapucaí cê gosta, né?

Os fundamentalistas religiosos não vão apreciar essa minha ideia de pacto com o cramulhão, mas insisto: não demonizem o demo. O diabo é o pai do rock, já disse Raul. É o pai do blues também, o Robert Johnson sempre soube disso. Ademais, vamos ser pragmáticos porque a situação é grave: vocês imaginam que o Temer chegou lá como, com aquela cara de Bela Lugosi, aquela fuça de mordomo de filme de terror? Funciona, pessoal, funciona.

Se no entanto sua religião não permite brincadeira nem ironia com as coisas sagradas (antecipo escusas desde já), muito menos aliança com belzebu, então só resta a você, atleticano de Deus, torcer e rezar. Agora, se é assim, vai com tudo: esgote os ingressos, leve a sogra, o cunhado, o parente coxinha, o ex-amigo petralha, a bandeira, o sinalizador, o garrafão pra estourar os tímpanos antes do inevitável grito de Gaaaaaaalo. Encha a cara, se for pra tomar coragem, mas, sobretudo, encha o estádio pelo amor de Deus. Fique e cante até a veia do pescoço romper-se num aneurisma fulminante. O Galo precisa de você, de preferência vivo – mas esteja pronto pra morrer pelo Galo, porque daqui pra frente ou a gente encara como uma guerra ou vamo comer o pão que nós mesmos amassamos desde a demissão de Levir Culpi.

Reze. Reze com vontade. Reze como se o Trump tivesse pegado o Kim Jong-un na porta da escola – reze como se não houvesse amanhã. Reze por Felipe Santana, porque na falta de futebol é melhor sobrar nas orações. Reze por Oswaldo de Oliveira, coitado (dele e da gente). Reze para que todos possam dar um sanguinho que seja, ainda que uma gotinha daquelas que saem no dedo indicador na hora em que o diabético vai medir a insulina. Reze pelos nossos dirigentes: perdoai, eles não sabem o que fazem.

Ps. Obrigado, tia Célia. Morre com a senhora o velho Mineirão, a maioria de negros na arquibancada, a Massa pra valer. Mas ficam as milhares (milhões?) de crianças que você ajudou a catequizar. Nessas crianças, estará viva para sempre.

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