Fred Melo Paiva
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DA ARQUIBANCADA

Um sanguinho só, um plus a mais

Caso venha a classificação, ela inevitavelmente ocorrerá nos moldes daquela maratonista olímpica que se arrastou desmilinguida até a linha de chegada

postado em 17/11/2018 12:00

Bruno Cantini / Atlético
 "Estão deixando a gente sonhar", me disse um gaiato depois do tropeço do Santos diante da Chapecoense, num daqueles expoentes do arranca-toco nacional. Estacionados até então no entorno dos 47 pontos e sem vencer havia cinco jogos, ali nos segurávamos graças ao estado de penúria do ludopédio nativo, apenas um dos aspectos da nossa degradação geral. Na porção final da corrida maluca, nos encontrávamos num atoleiro. Mas quem vinha atrás não teve competência nem sequer para atingir a lama, jogando-se antes no precipício.

Entre os times que disputam a sexta e derradeira vaga na Libertadores de 2019, apenas o Atlético venceu na última rodada. Livramo-nos, enfim, do atoleiro, mas daquele jeito, misto de Ben Hur e Didi Mocó: abandonamos a viatura e partimos a pé, levando a carga no lombo e puxando de uma perna. Vamo que vamo, na fé e na raça, que atrás vem gente e seja o que Deus quiser!

Fez bem o Levir em valorizar a primeira vitória sob seu comando, de fato o importante neste momento era realizar-se o mantra do boleiro e conquistar os três pontos, o resto que se dane. Mas, cá entre nós, podemos dizer algumas verdades: que pelada, senhores! A pelada em estado de arte! Uma verdadeira canção de ninar! Nove contra 11 e a gente tocando a bola pro lado. De um lado para o outro, de um lado para o outro... Aquilo não foi um jogo de futebol, foi uma sessão de hipnose! Quando voltei à vida, havíamos ganhado.

Agora, temos 50 pontos e caminhamos, coxos, mas sobreviventes, rumo aos píncaros da glória. Não exatamente aos pícaros, vá lá, desembarcaremos seis estações antes na melhor das hipóteses. Ainda assim será a glória, porque caso venha a classificação, ela inevitavelmente ocorrerá nos moldes daquela maratonista olímpica que se arrastou desmilinguida até a linha de chegada. Então, Levir dirá que só o Atlético é capaz de proporcionar esse tipo de coisa, e eu, rendido a essa maravilhosa verdade dos fatos, direi que o Atlético é uma máquina de fazer homem chorar.

“Estão deixando a gente sonhar.” Expectativa: eliminar Crüzëirö e Flamengo na Libertadores, tirar Boca e River, porque só o Atlético pra ganhar dos argentinos depois de levar dois na corcova nos jogos de ida. Realidade: convidados para o setor VIP, descobrimos uma hora antes da tertúlia possuir apenas um par de Havaianas. E lá vamos nós, com a cara e a coragem (e as Havaianas), na sempre louvável crença de que não passaremos nenhuma vergonha.

Mas deixemos pra lá, por enquanto, o que faríamos com uma vaga na Libertadores diante da assustadora mediocridade que nos acomete. A hora é agora, e ela exige apenas um pouco mais de gás, um sanguinho só, aquele plus que se batizou um “plus a mais”, ou seja, um mais a mais. Hoje, contra o Bahia, no Horto, esse sanguinho é tudo que pede o atleticano de coração carcomido pelas tantas injustiças da vida. Sabemos que os salários estão atrasados e que a conversa sobre “vestir a camisa” é apenas um truque na conciliação impossível entre capital e trabalho, e que ao fim e ao cabo vale o blues de Arnaldo Baptista: “Mostre-me a cor do seu dinheiro logo, logo, logo!”. Ainda assim, roguemos: jogai por nós, que não temos culpa de sermos viciados em Atlético, incutiram isso na gente, e agora nossos empregos e casamentos dependem dessa maldita vaga.

Vençam o Bahia, de quem somos aliados, paciência. Depois do primeiro gol, não façam “circular a bola”, que se dane essa tática exasperante e medíocre, esse modus operandi dos coveiros do futebol. Partam pra cima, ganhem de muito, porque precisaremos estar suficientemente iludidos para termos alguma chance de bater o Internacional em Porto Alegre quarta-feira que vem. Sem a ilusão de que podemos, jamais poderemos. E pra isso basta um sanguinho. Um sanguinho só, um plus a mais.

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