Gustavo Nolasco
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DA ARQUIBANCADA

Dor de cone, corno ou cotovelo?

Não terá 'cláusula do medo ou da chacota' que impedirá a Libertadores de sair do espaço gourmet de Lourdes e voltar a ser raiz

postado em 27/12/2017 08:00 / atualizado em 27/12/2017 09:32

Jorge Gontijo/Estado de Minas - 21/07/2005
Num luxuoso bairro de Belo Horizonte, chamado Lourdes, o Natal de 2017 foi desastroso. Na cobertura, um velho empreiteiro assistiu apreensivo ao neto vidrado no pacote deixado no pé da árvore cheia de luzinhas importadas de Paris. Suou frio, pois sabia que lá estava embrulhada a camisa “99 Fred” que não teve tempo de trocar. 

Também foi possível escutar pedidos insistentes de silêncio vindos da área de lazer. Lá estava um pai implorando ao seu filho para não gritar mais “é gol do Fredão” a cada chute na bola dado com o pequeno sapatênis comprado em Miami. 

Cenas como essas estão por trás da “cláusula do medo” ou “da chacota”, como ficou conhecida a tática de uma diretoria amedrontada a exigir do jogador Fred a assinatura num pedaço de papel, fazendo juras de que não iria trocar um clube pequeno pelo Cruzeiro. A patética tentativa de impedir o boleiro de voltar para um time gigante, definitivamente, escreveu mais um capítulo inesquecível da história do Flamengo Mineiro de Lourdes. 

A “brilhante ideia” da cláusula do medo, ao vir à tona, transformou, como num passe de mágica, o orgulho ferido em desdém. Fez as milhares de camisas compradas com o “99 Fred” ou o grito  de “gol do Fredão” se converterem em “isso aí é só um cone”, “fez 30 gols num ano, mas já vai tarde”. 

Agressões gratuitas por uma simples dor de cotovelo. Uma traição de doer nos cornos porque não aceitam o fato de um jogador ter o direito de voltar a jogar num grande clube, mesmo tendo aceitado passar dois anos numa agremiação pequena para recuperar sua carreira. 

Ingenuidade de qualquer torcida – grande ou pequena – achar que no futebol gourmet de hoje isso não aconteceria. Jogadores trocam de time como se troca de roupa. A mercantilização do espetáculo mais popular da Terra criou isso e teremos de aguentar. 

Everton Ribeiro não preferiu ir para o Flamengo? Não será surpresa nenhuma se Ricardo Goulart, depois de fazer juras de amor ao manto azul, aparecer no Palmeiras, não é mesmo? 

O amor à camisa já era, infelizmente. Hoje, ele se restringe a nós, torcedores. Se Fred dará certo novamente no Cruzeiro, só o tempo e os títulos nos dirão ao longo de 2018. E nós cobraremos isso a cada entrada dele em campo.

Mas certo é que a diretoria nos deu o nosso 9 cascudo para a Libertadores raiz que se avizinha. Ainda esperamos os nossos laterais, mas é preciso um voto de confiança depois da vinda de Fred, quando se avizinhava um Fernandão...

Se a imprensa sul-americana já temia pela volta de “La Bestia Negra”, pelo enfrentamento ao “Enorme Cruzeiro”, agora, começa a entender que a Libertadores será eletrizante. Sairemos do espaço gourmet das varandas do bairro de Lourdes para os quintais, campos de terra batidas, ruas, grotões e montanhas de uma Minas Gerais azul, feliz e copeira.

Quanto a isso, não tem cláusula do medo, apagar de refletores, torcida de alto falante, Gilmar Mendes ou decreto de prefeito via twitter que impedirá. 

A história não mente, jamais vai mudar.

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