Gustavo Nolasco
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DA ARQUIBANCADA

Você é cruzeirense de onde?

O Cruzeiro vai abraçar definitivamente o cruzeirense do interior e das periferias de BH, gente que lhe fez incontestado, gigante, o maior de Minas

postado em 24/01/2018 09:00 / atualizado em 24/01/2018 09:20

Ramon Lisboa/EM/D.A Press
Sou cruzeirense de Mariana, cidade onde aconteceu e ainda está impune o maior crime socioambiental da história do Brasil. Sou o típico cruzeirense do interior de Minas Gerais, estado incontestavelmente azul e branco (menos o grã-fino bairro de Lourdes, em Belo Horizonte).

O cruzeirense interiorano cresce, vira pai ou avô, mas seu coração continua a disparar todas as vezes em que segue do Anel Rodoviário para o viaduto da Catalão. Os olhos, numa infantilidade perpétua, brilham aos primeiros riscos de concreto no horizonte, anunciando a linda coroa do Mineirão por entre o verde da mata da UFMG.

No Mineirão, é fácil reconhecer um cruzeirense do interior. São aqueles que, mesmo já morando na capital, ainda sobem correndo a escada de acesso às arquibancadas, ávidos pela lapada de beleza do gigante verde do gramado, mesmo que ainda faltem duas horas para o início do jogo.

Sendo um cruzeirense que por tantas vezes tive dificuldades para ir ao Mineirão, ainda me emociono ao ver que, mesmo com a mercantilização do futebol, os bravos interioranos ainda se fazem presentes com suas faixas: as lendárias FAL (Lavras) e NAV (Varginha) e tantos outros “comandos”.

Nesse instante, lembro das nossas excursões, saindo ao lado da estação de trem de Mariana, anunciadas com foguetes. “Tati? Presente! Camelão? Opa! Gargamel, cadê Jairo e Guilherme? Aqui! Putz, Marquito, Electo e Besouro já estão zoneando no fundão. Cleyton e Ricardo vêm dessa vez? Bernardo já foi com Vanderlei. Bora, Motor! Zêêro!”.

Os veteranos iam ensinando o novo grito inventado pela Máfia Azul. “Boi, boi, boi, boi, Boiadeiro, vê se faz um gol pra torcida do Cruzeiro”. Saber em primeira mão os cânticos era como ganhar uma Libertadores com gol espírita do Joãozinho. Você se tornava o Alex “Talento” daquele bonde!

Na volta, o tropeiro garantia o sono da madrugada para quem enfrentaria dali a poucas horas o trabalho ou o colégio. No bolso, o canhoto do ingresso para ostentar na resenha na praça. Na mente, um sorriso tatuado pelos gols de Charles e Tilico.

Quando a atual diretoria resgatou e bancou ingresso a R$ 10, pensando em fazê-lo pelo sócio-torcedor, mal sabia ela que dava o primeiro passo para voltar a nos respeitar, cruzeirenses do interior. Gente de Mariana, de Itabira, de Manhuaçu, de Montes Claros, de Valadares... De onde, nas décadas passadas, muita gente saiu para povoar as periferias de BH, tentando a sorte na cidade grande, com o sonho de conhecer Tostão e Dirceu Lopes.

É o momento de o Cruzeiro abraçar definitivamente o cruzeirense do interior e das periferias de Belo Horizonte, gente que lhe fez o incontestado gigante, o maior de Minas. Pensar em nos dar mais motivos para encararmos as rodovias nas madrugadas de quarta-feira e as lotações nas tardes de domingo.

Daqui a pouco, seguiremos a mesma rotina. É dia de Cruzeiro e Uberlândia, time da cidade onde rival da maioria azul é Corinthians e São Paulo. Atlético de Lourdes? Por lá, nas imediações do Triângulo Mineiro, Atlético com torcida mesmo só o Goianiense.

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