Gustavo Nolasco
None

DA ARQUIBANCADA

Que venha o Flamengo! O trauma não é meu

Não existiria chance do nosso caminho ser fácil e nem o queríamos, pois somos Cruzeiro e não fugimos da nossa história

postado em 06/06/2018 08:00 / atualizado em 06/06/2018 08:58

Auremar de Castro / Estado de Minas

O dia foi duro de trabalho. Joguei a mochila na mesa, estiquei as bolhas dos pés para fora do tênis velho, praguejei a dor crônica no estômago e me dei ao luxo de esparramar os meus cento e alguns quilos no sofá. Ao correr o dedo pelos grupos do zap-zap, saltou na tela uma discussão sobre algo que nem estava me lembrando: dali a poucos minutos começaria o sorteio das fases decisivas da épica Libertadores Raiz, onde os fracos nem entraram.

Dei um pulo quase olímpico e me lancei certeiro como Sassá em direção à porta. Tinha poucos segundos para sair dali. Suei frio. Corri como um Mário Tilico nos tempos da Supercopa. Desci os degraus com pernas de girafa do Careca e ganhei a rua.

“Plim!”. Mais um apito no zap. Era Toninho, Clebinho, Gervásio e Buchecha dizendo que havia terminado o sorteio da Sul-Americana, aquela tal de Série B, como dizem os entendidos desse riscado. No áudio do William, um grito de “vaaaai, Cruzeirooo!”. Faltavam cinco minutos para abrirem o sorteio da Libertadores.

Esbaforido, entrei no copo sujo da esquina, puxei a cadeira e pedi uma cerveja. O amigo garçom soltou seu gracejo: “isso tudo para ver quem vai te eliminar?”. Aquilo me devolveu as gargalhadas e lhe respondi a verdade: “claro que não! Isso tudo porque para cruzeirense, quando o assunto é Libertadores, não dá para ficar no controle remoto. Corri para cá porque o meu medo era o sofazón!”.

Mal começou e o sacana do cozinheiro gritou lá de dentro. “Tomara que dessa vez não errem o nome de nenhum time no papelzinho”. Bolinha para lá e para cá. Iam surgindo clubes verdadeiramente grandes. Os narradores com sotaque de Avenida Paulista oravam para seus prediletos Corinthians, Palmeiras e Santos cruzarem com o “ALT”Tucuman.

Foi saindo Racing, River Plate, Nacional, Grêmio, Colo-Colo...

Não existiria chance do nosso caminho ser fácil e nem o queríamos, pois somos Cruzeiro e não fugimos da nossa história. Só nós sabemos o quanto é complexo ser o maior clube fora do Eixo RJ-SP e mesmo assim, continuar multicampeão.

“Boca Juniors é o pior”, gritou um garoto lá do balcão. Calculei cinco mesas entre ele e mim. Pensei em driblá-las como Ronaldo fez contra o próprio Boca em 1994, pela Libertadores, para marcar o gol mais bonito de sua carreira. Queria correr para lhe contar sobre o dia em que Dida fez La Bombonera ajoelhar-se perante as cinco estrelas.

Na primeira bocada no tira-gosto, vi uma bolinha girar e dela sair a definição sobre o nosso confronto: o Flamengo. Logo o time da segunda maior torcida de Minas Gerais e que está engasgado conosco pelos seguidos canecos que levantamos sobre o lombo deles desde 2003.

Paguei a conta e subi tranquilo para casa. Logo começou uma zoeira de “plins” no zap-zap. Todos frenéticos procurando o Leozinho para garantir seus pacotes de viagem para a invasão do Maracanã, em 8 de agosto, quando voltaremos nossos corações azuis para a Libertadores Raiz.

Deitei, olhei o céu estrelado pela janela e matutei sozinho: “mas é hora mesmo de falar de Flamengo?”. Acho que não. Agosto está muito longe e ficar obcecado com Flamengo não é um esporte praticado pela Nação Azul. Lutamos e conquistamos títulos. Não disputamos traumas.

Por isso, antes de dormir, lembrei que ainda temos muitos para disputar nesse ano: Brasileirão, Copa do Brasil, pentas e hexas possíveis. Entrei pela última vez no zap, cutuquei o Marco Astoni e avisei: “já comprei os ingressos para o jogo contra o Vasco. Vamos para o Mineirão porque futebol para cruzeirense não é no sofá”.

Siga-me no Twitter @gustavonolascoB

Tags: gustavo nolasco da arquibancada seriea libertadores2018 cruzeiroec