Copa do Mundo
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MINAS E AS COPAS

Hoje, sou o fotógrafo mineiro que tem mais Copas do Mundo

Desde a Copa de 1986, o jornal envia repórteres e fotógrafos para os Mundiais. A partir de 2002, o alcance foi ampliado pelo portal superesportes

postado em 23/04/2018 20:19 / atualizado em 23/04/2018 20:25

Beto Novaes/EM/D.A Press


Não é exagero dizer que os estádios de futebol são a segunda casa do repórter fotográfico Jorge Gontijo. De seus 67 anos, nada menos do que 42 são dedicados ao jornal Estado de Minas, sendo 100% do tempo no esporte – com incursões esporádicas por outras editorias. Mas essa ligação começou bem antes: no nascimento do Mineirão, quando, então com 14 anos, Jorge engatinhava no mundo das lentes.


Aprendiz de fotografia, ele acompanhou as obras do Gigante da Pampulha ao lado de Dario Carrera, fotógrafo oficial da construção. Daí para as cinco Copas do Mundo que entrariam em seu currículo, todas em coberturas para o EM, foi um salto que nem mesmo ele podia imaginar.

Em 1º de julho de 1975, Jorge entrou na redação do EM pela primeira vez. Nas mais de quatro décadas que se seguiram, viu de quase tudo na área esportiva. “Fiz Mundial de futebol, de Clubes, de voo livre, de natação, de vôlei, de basquete, Fórmula 1, Libertadores, Conmebol, Supercopa, cinco Copas do Mundo...” enumera.

Só faltaram Pan-Americano e Olimpíada. “Hoje, sou o fotógrafo mineiro que tem mais Copas”, diz, orgulhoso. A história das competições que cobriu pode ser contada também a partir da grande (r)evolução tecnológica que vivenciou. “No início, transmitir foto era um drama”, afirma. O processo exigia perícia do início ao fim. “Hoje, há o Photoshop (programa de edição de imagens), que até foco corrige. Antes, saía ou não saía. E só depois de revelado é que você ficava sabendo.” Na Copa de 1986, no México, foi assim. E aqui Jorge faz um parêntese. “Fui o primeiro fotógrafo a viajar para cobrir uma Copa para um jornal local.

E o EM foi o primeiro jornal do estado a levar equipe completa, com repórter e fotógrafo, para um Mundial.” Nas coberturas no exterior naquela época, não bastava o talento do fotógrafo. Era necessário também sorte. “Fazíamos 10, 15 minutos de jogo, dependendo do fuso horário, e íamos para o hotel revelar as fotos. Criávamos um laboratório no quarto. O sistema era de telefoto, a imagem vinha pelos impulsos do telefone. Só em preto e branco. Sempre explicávamos à telefonista que ia dar o sinal, mas que não era para ela atender. Só que de vez em quando ela ouvia o barulho da ligação e ficava lá, dizendo ‘alô, alô’. Isso borrava a foto toda e a gente tinha de recomeçar.

Mudança na tecnologia

Cada foto levava oito minutos. Se passássemos três imagens era uma glória! Hoje, no intervalo de uma partida já tem 50, 60 fotos na redação.” Na Copa da Itália, em 1990, ele se deparou com algumas facilidades: “Encontramos um centro de imprensa mais bem estruturado, com apoio dos patrocinadores. A Copa começou a ficar mais organizada para a imprensa. A foto era revelada e transmitida do estádio, já estava mudando para cores”. Apesar de não ter estado na cobertura em 1994 – o jornal enviou o repórter fotográfico Alberto Escalda –, o Mundial dos EUA merece menção na biografia de Jorge Gontijo.

 

Como o Brasil foi campeão (tetra), ele passou a atribuir os fracassos anteriores à sua presença in loco. “Fiquei com isso na cabeça... Aí veio a da França, em 1998, eu estava lá de novo e foi aquele desastre! O problema com o Ronaldo, o show da França com o Zidane e o Henry, o Roberto Carlos arrumando meião... E eu achando que o problema era comigo, que eu era o pé-frio”, conta. A jornada brasileira em gramados franceses reforçou o que ele define como “síndrome da Copa”. Mas a parte profissional foi bem mais tranquila, graças à internet. “Facilitou demais, até porque na nossa equipe estava o Zeca (Geraldo Teixeira da Costa Neto), que entendia muito da área e hoje é nosso diretor.”

A redenção e o fim da síndrome vieram em 2002, na Copa dividida entre Coreia do Sul e Japão. “Fiz a foto mais feliz da minha vida, a que me deu mais satisfação pessoal e profissional. Aquela do Cafu, com a camisa escrito Jardim Irene, erguendo a taça”. Com a tecnologia a favor, foi a união perfeita entre trabalho e prazer: “Ali já estava tudo dominado, no intervalo mesmo mandava as fotos, não havia limite.”

O truque da limusine

Quatro anos depois, a despedida, na Alemanha. “Estava achando que seria a última mesmo, já estava meio cansado, era a quinta... E o legal é que foi um outro tipo de cobertura, com material especial, exclusivo, personagens inusitados, não o factual, o dia a dia dos treinos da Seleção. Para isso havia 60, 80 fotógrafos, 10 de cada agência de notícias, era muito difícil pegar algo diferente, só se tivesse muita sorte mesmo”, destaca. Não foram poucos os casos curiosos que Jorge colecionou.

Um deles foi a estratégia para entrar na concentração da Argentina em um condomínio fechado em Roma, em 1990. “Para não ser barrados, alugamos uma limusine. Quando chegamos perto do campo, desci do carro e fiz as fotos do Maradona fazendo embaixadinhas. Logo os seguranças apareceram e nos tiraram de lá. Foi a primeira e última vez que andei de limusine.” Outra foi a carona que o ex-goleiro Taffarel pegou com a equipe do EM, entre um treino e outro na Granja Comary, em Teresópolis: “Voltamos para BH numa folga da Seleção e ele pediu para vir no carro com a gente. Paramos em um posto de gasolina na estrada, para abastecer o carro, lanchar, e as pessoas surpresas por vê-lo ali. É uma simplicidade que não existe hoje, ainda mais com um jogador de Seleção Brasileira”.

O Megafone


Se quiser ouvir um pouco mais da histórias e da trajetória do repórter-fotográfico Jorge Gontijo no jornalismo esportivo, confira neste episódio de O Megafone, o podcast do Estado de Minas, um papo sobre a história da imagem nos últimos 50 anos, contada por quem a clicou. “O que me atraiu foi o mistério que tinha o laboratório, eu ficava encabulado com aquilo. Era uma mágica, até parecia uma mágica”.

Lembranças

Em muitas dessas jornadas ele esteve ao lado do repórter Jaeci Carvalho, de 58 anos, 27 de EM. Desde 1994, Jaeci esteve em todas as Copas do Mundo e considera a primeira a mais especial: “O Brasil sagrou-se campeão depois de 24 anos e tínhamos uma equipe muito grande, unindo EMDiário da Tarde e Correio Braziliense. Fomos comandados pelo saudoso Wagner Seixas, numa cobertura espetacular”, recorda-se. Para ele, as Copas na Ásia e na África foram as mais complicadas: “Em 2002, foi a primeira em dois países-sede e, em 2010, o técnico Dunga escondia a Seleção e a imprensa teve muita dificuldade para levar ao torcedor as impressões daquele grupo”.

A que mais gostou de trabalhar foi a da Alemanha: “Foi a mais legal de cobrir. Facilidade no transporte, pois os alemães liberaram trens para os jornalistas, e o povo nos recebeu muito bem. Infelizmente, o Brasil ficou no meio do caminho”. Em 2014, em casa, uma experiência diferente: “A Copa no Brasil foi muito boa, pois, pela primeira vez, não fiquei grudado na Seleção Brasileira, priorizei meu programa, Alterosa no ataque, falando não só do Brasil, mas de todos os participantes”.

Embora tenha marcado presença em cinco Olimpíadas, ele não esconde sua predileção pelas Copas. “Cobrir um Mundial é a cereja do bolo na carreira de um jornalista especializado em futebol. Requer paciência, dedicação, horas e horas sem comer, muitas das vezes dormindo mal, sempre em busca do exclusivo. É isso que valoriza a cobertura de um evento dessa grandeza.”