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COMÉRCIO

Construção da Arena MRV traz preocupação para comerciantes do bairro Horto

Decisão do Atlético de construir estádio no Bairro Califórnia deixa apreensivos lojistas do entorno do campo usado pelo clube no Horto. Temor é de crise e fechamento de negócios

Pedro Cerqueira
Bares, lanchonetes e estacionamento preveem queda de até 60% com saída do Atlético - Foto: Leandro Couri/EM/D.A Press

A torcida alvinegra está eufórica com a possibilidade cada vez mais palpável de ter um estádio próprio no Bairro Califórnia, na Zona Noroeste da capital, enquanto o sentimento é de preocupação entre moradores e comerciantes do entorno da Arena Independência, que hoje faturam com o movimento gerado pelos jogos do Atlético. É que os torcedores respondem pela maioria do público que frequenta o campo do Horto, e sua migração para o novo estádio reduz ou pode até decretar o fim de algumas atividades comerciais, como bares e estacionamentos. O dono do Independência, o América Mineiro, está longe de atrair a mesma bilheteria do Galo.

Adson Luiz Bento aluga a garagem da casa da tia dele, na Rua Pitangui, em frente ao estádio. O bar funciona há dois anos oferecendo até serviço de guarda-volumes. Ao todo, seis pessoas da família trabalham no local. Sem abrir números do faturamento, Adson garante que o negócio é um importante complemento da renda familiar e a possível saída dos jogos do Atlético significa comprometimento do funcionamento do bar, já que, para ele, não vale a pena abrir a casa durante os jogos do América.

No Bar da Sandra, que também funciona numa garagem ao lado da Arena Independência, é quase certo que a saída dos torcedores do Galo decretaria o fim das atividades. O cômodo é alugado a R$ 330 por jogo, o que revela que o proprietário do imóvel também vai perder renda. Quem confirma esta tendência é Eloísa Maria dos Reis, que aluga a entrada de uma casa para vender camisas e bandeiras.
Ela paga R$ 150 a cada jogo e garante que pretende levar sua “loja” para o novo estádio.

Como o dono do Espetinho do Bil não paga aluguel da garagem que abriga a lanchonete, imóvel da própria família, é possível que as atividades continuem. Os jogos do América, contudo, garantem só 20% do faturamento médio, quando comparado à renda impulsionada pelas partidas do Atlético. O morador de uma casa próxima ao estádio – que pediu para não ser identificado – tem três vagas disponíveis. Nos dias de jogo do Atlético, ele retira os carros dos moradores e os coloca na rua, para oferecer cada vaga por R$ 30 aos torcedores. “Eu tenho um emprego, mas ajuda a complementar a renda. Vai fazer falta sim”, lamenta.

O Bar do Pardal está, a rigor, colado ao estádio há 40 anos, na esquina das ruas Pitangui São Felipe. À frente do negócio há 14 anos, Antônio Cosso Filho está extremamente pessimista. O proprietário calcula que, com a saída dos jogos do Galo, o movimento vai cair pelo menos 60%. “Quase todo mundo vai quebrar. Com esta crise e tantos concorrentes, o movimento já está fraco. Tem uns 20 dias que ninguém compra uma ficha de sinuca”, afirma.

Há dois meses, Daniel Carvalho abriu uma sorveteria na Rua Pitangui, quase ao lado do estádio. Ele sabia da possibilidade de os jogos do Atlético saírem dali e garante que não montou o negócio contando com esse tipo de cliente. “Nós fizemos um levantamento e constatamos que não existia nenhuma sorveteria por aqui.
Mas é claro que os jogos do Atlético trazem um aumento nas vendas em aproximadamente 50%”, admite.

EMPREGOS AMEAÇADOS Túlio Montenegro, proprietário do bar Chef Túlio, admite que os jogos do Atlético incrementam seu faturamento. “Meu bar está aqui há 22 anos, muito antes de o Atlético concentrar seu jogos no Independência, portanto, não dependo disso para funcionar. Mas a presença da torcida traz um adicional significativo, na ordem de 15% se tivermos dois jogos no mês. Se forem jogos bons, de grande interesse da torcida, a renda mensal cresce uns 25%”, explica. Os jogos do atlético também geram empregos, já que nesses dias o bar contrata seis funcionários temporários.

Gabriel Rodrigues Montenegro de Almeida tem uma oficina na Avenida Silviano Brandão. Nos dias de jogo do Atlético, o empresário usa o espaço como estacionamento e consegue uma importante complementação de renda. “Principalmente nesse período de vacas magras, gera uma renda importante. Se tiver três bons jogos no mês, já é o suficiente para pagar o aluguel da oficina. Tem uma menina aqui do lado, numa loja menor, que também consegue pagar o aluguel vendendo cerveja em dias de jogo”, disse.

O empresário Edmar Raimundo dos Reis mantém um salão de beleza e uma lavanderia na Avenida Silviano Brandão. Nos jogos mais importantes, ele garante não ter dificuldade de encher seu estacionamento com 60 automóveis e 20 motocicletas, chegando a faturar R$ 2 mil.
“Se o Atlético estiver em boa fase, disputando torneios como a Libertadores da América ou a Copa do Brasil, eu consigo fazer essa quantia quatro vezes no mês”, contabiliza.

Até gestor dá adeus


Quem também quer tirar o “time” do campo do Horto é a Luarenas. Depois que o Conselho Deliberativo do Atlético aprovou a construção do novo estádio, a empresa que administra a Arena Independência disse que não pretende renovar o contrato com o governo de Minas Gerais, que vence em 2022. Motivos não faltam. Nos cinco primeiros anos de operação, de 2012 a 2016, a concessionária acumulou prejuízos de R$ 10,5 milhões. Se comparadas as rendas brutas de bilheteria de Atlético e América em 2017, os alvinegros levam em média sete vezes mais público ao estádio do que o Coelhão.

Enquanto nos 27 jogos no ano o Galo conseguiu arrecadar R$ 13,1 milhões, o América faturou R$ 573 mil. Isso revela que o Atlético responde por 96% da arrecadação do estádio, o que explica o desejo da empresa fazer a gestão da futura arena do Galo, cuja inauguração está prevista para 2021, o que chegou a ser declarado por Bruno Balsimelli, presidente da Luarenas.

Tristeza de uns, alegria de outros


Para quem não depende de um ponto fixo para se estabelecer, o impacto é mínimo. “Para mim vai melhorar. Só na hora de ir embora é que fica ruim”, se diverte o ambulante Marizio Corino dos Santos, brincando sobre a localização do novo estádio. Ele vende camisas, bandeiras e bonés e acredita que a construção do novo campo vai estimular os torcedores a comprarem os seus produtos. O mesmo vale para André dos Santos, que vende balas, chicletes e cigarros durante todos os jogos do Atlético. Ele garante que, se o novo estádio for mesmo construído, pretende levar suas mercadorias para o Bairro Califórnia.

Moradores do entorno da Arena Independência não estão nem um pouco contrariados com a saída dos jogos do Atlético. Giovanni Alonso, que mora em uma casa próxima à Rua Ismênia Tunes, garante que a presença constante dos torcedores fez com que a família decidisse vender o imóvel. “Uma vez deixei meu carro estacionado aqui na rua e fui multados às 15h, sendo que o jogo era às 20h”, conta Giovanni, referindo-se à proibição de estacionar veículos no entorno do estádio nos dias de jogo.

Além da obrigação de ficar ligado à agenda do Independência, o morador narra várias situações desagradáveis pelas quais já passou, inclusive quem foi visitá-lo em dias de jogo. Entre elas, estão as dificuldades encontradas para estacionarm brigas de torcedores e o cheiro de urina nas ruas.