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CAMPEONATO MINEIRO

Atlético x Cruzeiro: Mineiro volta a ter final única após quase 32 anos

Em 1990, final com Mineirão cheio e dividido também contou com clássico entre Atlético e Cruzeiro

postado em 31/03/2022 06:30 / atualizado em 31/03/2022 06:39

A final do Campeonato Mineiro de 2022 pode ser considerada icônica por uma série de motivos. Um deles, contudo, diz respeito à fórmula de disputa: o torneio volta a ser decidido em apenas uma partida. Entre formatos distintos, com quadrangular e hexagonais finais, pontos corridos e 18 finais seguidas com jogos de ida e volta, a competição estadual não é decidida em jogo único há quase 32 anos.

A última decisão desta maneira, assim como em 2022, foi entre Atlético e Cruzeiro, os grandes rivais de Belo Horizonte e Minas Gerais. O ano era 1990, e o antigo Mineirão foi o grande palco da final. Outra coincidência para este ano: o Gigante da Pampulha também ficou dividido ao meio, com uma metade de atleticanos e a outra de cruzeirenses (veja a ficha técnica desta partida ao fim desta reportagem).

Com cerca de 100 mil torcedores presentes, segundo relatos da época, em um anoitecer de domingo, o Cruzeiro chegou à decisão do Mineiro de 1990 após vencer o primeiro turno do estadual. O Atlético foi o ganhador do segundo, e ambos se classificaram para a grande final única do Mineiro.

Assim como em 2022, o Galo buscava o tricampeonato mineiro em 1990 - após conquistas em 1988 e 1989. A tentativa, contudo, acabou frustrada. Liderado pelo meia-atacante Careca, autor do gol da vitória celeste aos dez minutos do segundo tempo, quando já era noite no Mineirão, em BH, o Cruzeiro quebrou a sequência atleticana e se sagrou campeão mineiro pela 24ª vez.

(Foto: Arquivo Estado de Minas/EM/DA Press)
O Superesportes procurou alguns personagens daquela partida, que escreveram a história. Lateral-esquerdo do Atlético de 1986 a 1996, Paulo Roberto Prestes se lembra da partida e prefere abordar o lance do gol como uma falha coletiva. Careca se aproveitou de um escanteio pela direita, cobrado pelo ponta esquerda Édson, e também do goleiro alvinegro Rômulo, que errou o tempo de bola ao sair do gol e não contava com o cruzeirense na pequena área para completar com uma cabeçada para o gol aberto, mesmo com pouco ângulo.

"Estava um jogo muito equilibrado, lá e cá. Lógico, estava o Careca no Cruzeiro, arrebentando, o time era bom, e acabou em um gol de escanteio. Infelizmente, houve uma falha, prefiro dizer falha coletiva ali no escanteio, na marcação, e tinha ali um jogador iluminado do Cruzeiro na época, a realidade foi essa", afirmou Paulo Roberto, campeão mineiro por cinco vezes com o Galo - 1986, 1988, 1989, 1991 e 1995.

(Foto: Arquivo Estado de Minas/EM/DA Press)
"Foi um jogo muito equilibrado. O Cruzeiro tinha um bom time, o Atlético estava em uma reformulação de time, buscava o tricampeonato, conseguiu dois com o Jair Pereira e em 1990 já era o Arthur Bernardes com a gente. Acabou que o Cruzeiro tirou nosso tricampeonato, mas alguém tem que ganhar, e na época tínhamos muita dificuldade, muito diferente de hoje. Na minha época, não tinha um ano de salário em dia, o Atlético não tinha estrutura, não tinha campo para treinar, a gente pegava ônibus de um campo aqui, um campo ali. Uma estrutura muito difícil, precária", contou.
 
Herói do Cruzeiro naquele jogo, Careca relembrou o lance do gol do título. O jogador, que jogou pela Raposa de 1987 a 1990 e em 1994, disse que imaginava a falha da defesa do Galo para definir ao gol.
 
(Foto: Arquivo Estado de Minas/EM/DA Press)
“O jogo foi equilibrado. No segundo tempo, o Édson, nosso ponta esquerda baixinho, bateu escanteio com pé trocado, e eu observei que os jogadores estavam trombando. Veio na minha mente que a bola ia passar do Rômulo e ia cair no segundo pau. Do jeito que pensei, saí da confusão e a bola chegou na minha cabeça, já estava preparado. E eu saí vibrando, naquela confusão, pois fazer um gol em um clássico e decidir um título, a torcida ficou eufórica e a do Atlético chateada, o que é normal no futebol, tudo na paz”, disse. 
 
“O clássico por si só mexe, e o público é bem maior também, dividido, é uma motivação a mais. Foi uma partida que concentramos bem, preparamos, porque sabíamos que era jogo único e que tínhamos chances de surpreender o bicampeão Atlético. Concentramos nos treinos, nas conversas, até chegar bem no clássico”, acrescentou. 

Lateral-direito do Cruzeiro naquele jogo e atleta da Raposa de 1986 a 1991, Balu lembra da vitória e da conversa dos cruzeirenses para aquela final. O defensor destaca que, na década de 1980, o Atlético era o clube com equipes mais fortes e melhores resultados em Minas, enquanto o time celeste não repetiu o sucesso dos anos 1960 ou 1970.

(Foto: Arquivo Estado de Minas/EM/DA Press)
"Nessa época, quem vivia um momento bom era o Atlético. Mas a gente ganhou em 1987, e em 1990 a gente buscou, e foi aí que o Cruzeiro recomeçou de vez. Nesse jogo, sabíamos que eles vinham com mais títulos, um pouco mais favoritos, mas esse clássico aí é até difícil falar. Nós falamos isso demais, Ademir, o nosso capitão, falávamos que se a gente entrasse com vontade, os caras iam ter que nos engolir. Foi o que fizemos ali dentro de campo. Eles tinham uma melhor época do que a gente, mas fomos melhores, um título que foi importante para a sequência do Cruzeiro", afirmou Balu.

Um dos meias do Galo naquela noite em 1990, Marquinhos lamenta a falta do título em 1990, mas relembra que o Atlético vinha de duas conquistas consecutivas. O ex-jogador, que jogou no clube de 1985 a 1991 e também em 1997, celebrou o fato de uma final única de Mineiro, também entre Cruzeiro e Atlético, ter a presença das duas torcidas dividindo o Gigante da Pampulha.

"Infelizmente, o Rômulo deu esse azar de ter calculado errado a distância da bola. Mas agora, já naquela época, o jogo era decidido no detalhe mesmo. Para você ver, o Cruzeiro acabou ganhando em uma bola parada, detalhe ali de um erro nosso, e acabou ganhando. Mas eram muito iguais os jogos neste momento ali. Como sempre, Atlético e Cruzeiro é no detalhe. Lembro do campo lotado, e agora vai voltar de novo 50% a 50%, muito legal as duas torcidas torcendo. Para a gente não foi um bom resultado, mas acontece, a gente vinha do bicampeonato e perdemos o de 1990", afirmou. 
 
Outro cruzeirense importante na conquista de 1990 foi o goleiro Paulo César Borges. Um dos responsáveis por manter o gol do Cruzeiro intacto naquela noite, Paulo César comenta que, a partir da conquista de 1990, a equipe a vencer grandes títulos, como nas décadas de 1970 e 1960. Ele defendeu o clube de 1989 a 1993 e também em 1998.

"Lembro que, realmente, a gente estava precisando de um título. O Cruzeiro vinha sem título há uns anos, e fizemos um trabalho bom não só no Mineiro, mas no Brasileiro também. Mas foi o meu primeiro título na minha carreira, fiquei muito feliz naquele dia. Eu fiz uma partida boa, nós fizemos, tenho até na memória a volta olímpica. É uma recordação legal, o primeiro título no Cruzeiro foi uma coisa que marcou bastante", diz Paulo César, que conquistou também os Mineiros de 1992 e 1998, as Supercopas da Libertadores de 1991 e 1992 e a Copa do Brasil de 1993.

"Tivemos um trabalho bom com o professor Ênio Andrade, e a gente teve até uma melhor campanha geral. Ganhamos praticamente o campeonato inteiro, teve uma derrota para o Atlético em um dos turnos, mas saímos da Toca da Raposa com nosso ônibus, o 'Trovão Azul', e estávamos preocupados. O Cruzeiro tinha pressão por títulos, mas fizemos concentração boa, o grupo era bom e continuamos mais uns três anos, quando conseguimos mais estrutura e mais títulos. Foi aí que o Cruzeiro começou essa força toda pela frente, com bastantes títulos, torcedor cruzeirense ficou mal acostumado. Inesquecível, lembro da camisa, tenho até hoje guardada", completa, ao relembrar uma sequência do Cruzeiro de pelo menos um título oficial por ano, que durou até 2005. 

A final única de 2022


Os ex-jogadores também comentaram sobre a decisão de sábado. Às 16h30, a bola vai rolar no Mineirão para Atlético x Cruzeiro. Caso a partida não tenha um vencedor no tempo normal, o Campeonato Mineiro será decidido na disputa de pênaltis. Por ter melhor campanha na fase classificatória, o Galo é o "mandante" mesmo em um jogo neutro e pode escolher uniformes, vestiários e banco de reservas.

Para os atleticanos Paulo Roberto Prestes e Marquinhos, o Galo é favorito, já que a equipe é atual bicampeã mineira e campeã da Série A do Campeonato Brasileiro, da Copa do Brasil e da Supercopa do Brasil, enquanto o Cruzeiro tenta, pelo terceiro ano seguido, subir da Série B para a Primeira Divisão nacional. Mas o sinal de alerta precisa ficar ligado, segundo os ex-jogadores.

"Acho um pouco diferente de 1990 porque, naquela época, acredito que não tinha favorito. As duas equipes eram mais ou menos iguais, hoje não. O Atlético tem uma equipe bem superior à do Cruzeiro, a gente sabe que clássico às vezes não acontece o que a gente está prevendo, mas a tendência é o Atlético ser favorito neste jogo. Se o Atlético entrar focado, e é um jogo só, é aquele negócio, de repente dá um vacilo e pode acabar perdendo título mesmo sendo favorito. Por isso tem que estar focado sempre, para fazer essa superioridade técnica favorecer", diz Marquinhos.

"O Galo é favorito, mas o clássico... vou dar um exemplo de 1992. Cruzeiro campeão da Supercopa da Libertadores, nós com um time muito eclético, e nós ganhamos. O futebol, clássico, eu disputei 32 clássicos, Atlético x Cruzeiro, sei muito bem o que é isso. Se não igualar a pegada, o foco, aquela coisa da luta mesmo, você perde. Aí o que faz a diferença quando iguala isso? A qualidade, que o Atlético tem mais", afirma Paulo Roberto Prestes, que diz que o Cruzeiro pode dar mais valor à conquista que o Galo.

"Para eles vai ser um título muito importante para entrar numa Série B, que eles estão tentando lutar há três anos para voltar. Para eles é Copa do Mundo, sem dúvida. E não estou falando mal não, estou falando bem, porque é importante este resultado para eles", completou.

(Foto: Juarez Rodrigues/EM/DA Press)
Os cruzeirenses Paulo César Borges, Balu e Careca também apontaram certo favoritismo para o Atlético, mas mais comedidos. Ambos relembraram até 1990 ao dizer que o Cruzeiro tem condições de bater o Galo nesta nova final única do Mineiro.

"Tenho certeza que os meninos, os atletas do Cruzeiro, sabem o que acontece hoje no futebol mineiro. Hoje, não é nem no mineiro, é no Brasil, o Atlético é uma das melhores equipes. Mas jogadores do Cruzeiro têm que se superar, é uma camisa que têm que respeitar, quem está do outro lado tem que respeitar sim. Então, se esses caras do Cruzeiro entrarem com vontade, com dedicação, pôr na mente a história que tem, vai ser jogo igual, como sempre foi, até naquela nossa época", disse Balu.

"É um jogo complicado porque não tem chance, nem Atlético, nem Cruzeiro. Cruzeiro hoje está se reestruturando, e não tem favorito. Vejo pessoas falando do Atlético, mas não tem favorito, mas todos os jogos são difíceis, Caldense, Patrocinense, são 11 contra 11. E a torcida vai estar dividida, é excelente para o Cruzeiro, porque vai ter pressão de um lado, Atlético também, acho que não tem favorito. É um jogo marcante, 32 anos para ter uma decisão desta maneira, e acredito que salário, essas coisas, pode ser maior que o Cruzeiro, mas vai ser um jogo de igual para igual", comentou Paulo César Borges.
 
“Como é final de partida única, aumenta a chance de quem está pior no momento. O clássico por si só iguala, mas só que se tivesse duas partidas, o que está melhor a chance de ser campeão seria maior. Por ser jogo único, tudo pode acontecer, aquele que está pior pode chegar e surpreender, ser campeão. Com certeza é favorável ao Cruzeiro, que está em reconstrução, está bem, mas a equipe do Atlético está pronta, vem jogando juntos, campeões, estão muito confiantes. A lógica é o Atlético ser campeão, mas como é jogo único tem chance para o Cruzeiro também, assim como foi em 1990, ninguém botava fé na gente”, afirma Careca. 

Cruzeiro 1 x 0 Atlético - 3 de junho de 1990


(Foto: Arquivo Estado de Minas/EM/DA Press)
Cruzeiro
Paulo César Borges; Balu, Gilson Jáder, Adilson Batista e Paulo César Carioca; Ademir, Paulo Isidoro e Careca; Hêider, Hamílton (Roberson, aos 40 do 2T) e Édson.
Técnico: Ênio Andrade
 
Atlético
Rômulo; Neto, Clebão, Paulo Sérgio e Paulo Roberto Prestes; Éder Lopes, Edu (Aílton, aos 15 do 2T) e Marquinhos; Milton (Ryuler, aos 36 do 2T), Gerson e Éder Aleixo.
Técnico: Arthur Bernardes 

Gol: Careca, aos 10 do 1T (Cruzeiro)

Motivo: jogo único da final do Campeonato Mineiro

Estádio: Mineirão, em Belo Horizonte-MG

Data e horário: domingo, 3 de junho de 1990, às 17h

Árbitro: Márcio Rezende de Freitas

Assistentes: Raimundo Divino; José Eugênio

Público pagante: 90.145

Público presente: não foi informado

Renda: Cr$ 8.368.737,00 (preço médio: Cr$ 92,84)

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