Rio 2016
  • Oferecimento:

TAE-KWON-DO

Justinópolis, área campeã em carência social, respira glória de ter representante medalhista

Maicon de Andrade foi único mineiro a levar medalha em esporte individual

postado em 22/08/2016 08:05 / atualizado em 22/08/2016 08:18

AFP

Nas palavras dos próprios familiares, ele veio do nada. Quem é esse Maicon? Um jovem de 23 anos, que apareceu na Olimpíada sem cartaz e sem propaganda. E, de luta em luta no tae-kwon-do, levou o bronze. Consagrou-se. Fez história ao ser o primeiro atleta mineiro a ganhar uma medalha individual. Quem é esse Maicon? A pergunta intrigou até mesmo vizinhos próximos da casa onde viveu desde sempre, no Bairro São Miguel Arcanjo, em Justinópolis, distrito de Ribeirão das Neves, uma área carente na Região Metropolitana de Belo Horizonte, tamanha a discrição do atleta e da família. Muitos não sabiam de que ali morava um vencedor de projeção internacional. No dia da disputa pela medalha, a notícia se espalhou. Na festa organizada pelos parentes e vizinhos da rua de apenas um quarteirão apareceu gente da rua de cima e de acolá. Todos querendo saber quem é esse fenômeno.

Ontem, um dia depois da consagração, as conversas nas esquinas e nos comércios locais eram uma só: aquele bairro – quase uma cidade, marcado pelo drama nas questões de segurança pública – tinha um herói. Alguém que levou o nome de Justinópolis ao conhecimento do país e do mundo, só que agora de forma positiva. As referências ao lutador eram fortes já na entrada do distrito. Num comércio, o auxiliar de técnico de educação Marcelo do Nascimento Araújo, de 45 anos, era só alegria em dizer que trabalha na secretaria da Escola Estadual João de Deus Gomes, onde Maicon Andrade Siqueira, de 23 anos, estudou.

Ele contou que o atleta nunca teve medo de serviço. Já trabalhou como servente de pedreiro e como garçom, deu aulas de tae-kwon-do num programa comunitário na Escola Estadual Francisco Labanca, onde também estudou – na época, era faixa preta da modalidade e disputava vários torneios. “Ele era um pouco agitado e por isso a mãe dele o inscreveu nas artes marciais: para gastar energia”, recorda-se, sorridente. “Um menino alto, as meninas ficavam em cima”, conta.

Por Maicon, muitas pessoas, algumas que não se viam há muito tempo, outras que nem se falavam, se reuniram para ver a luta em telão improvisado em cima de um caminhão, torcer e comemorar. Sofreram juntas, explodiram juntas e se abraçaram para dar o grito pela conquista. A festa começou às 7h de sábado e foi até meia noite. Ontem, os reflexos da farra estavam lá: bandeirolas, copos descartáveis espalhados e faixa numa casa saudando a participação de Maicon. O vizinho, que o conhece desde o nascimento, estava esfuziante, pois quando fez a homenagem a medalha era apenas sonho.

Paulo Filgueiras./EM/ D.A. Press


A cuidadora de idosos Henriqueta Neide de Souza, de 53, descreveu o momento como emocionante e maravilhoso. Faltou voz de tanto gritar. “Maicon é um menino muito bom e disciplinado. Mereceu, não só ele como a família e os moradores, porque essa vitória é para Justinópolis”, afirma. A palavra que é sinônimo da consagração tem importância ainda maior para o medalhista, que desde 2013 treina na equipe de São Caetano do Sul, no ABC Paulista. Caçula entre nove irmãos, aprendeu a levar para a vida o rigor imposto pela mãe Vitória de Andrade Siqueira, de 67, e do pai, o taxista Sinval Luzia Siqueira, da mesma idade, que desde cedo ensinaram os a trabalhar.

DETERMINADO Simples, humilde, batalhador e brincalhão são algumas das palavras usadas por quem conhece o medalhista para defini-lo. “Somos uma família bem discreta e ele também é desse jeito. A gente só acorda no fim. Ver um irmão chegar onde chegou e fazer o que ele fez é uma emoção inexplicável”, afirma o pintor automotivo Renato de Andrade Siqueira, de 43, um dos irmãos de Maicon. Única das filhas, a esteticista Joice Andrade Siqueira, de 34, relata que Maicon foi com garra e coragem para o processo classificatório brasileiro. Determinado, falou para a família que participaria da Olimpíada e ponto. Mas era discreto. Não divulgou a grande oportunidade. Ele conquistou a vaga na disputa por meio de uma seletiva que terminou em março e na qual venceu dois atletas favoritos.

A família organiza agora uma grande festa para quando Maicon chegar em casa, talvez na semana que vem. Primeiro, ele passa em São Caetano. Antes da Olimpíada, a equipe paulista fez para Maicon um teatro sobre Davi, personagem bíblico que enfrentou ursos, leões e o gigante Golias, e recomendou que não tivesse medo. E não deu outra: no conto real, o mineiro teve pela frente vários gigantes do esporte, muitos favoritos ao pódio. Ele, 51º do ranking mundial do tae-kwon-do, teve garra e coragem para vencer as batalhas da vida e também as do tatame.

Tags: justinopolis medalha maicon de andrade tae kwon do rio 2016

O anunciante aqui presente não possui relação com os Jogos Rio 2016 e é patrocinador exclusivo da cobertura editorial dos Diários Associados MG para o evento.