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TIRO LIVRE

Ficam as lembranças. E a lacuna

Maluf era o maior escudo de seus presidentes. O filtro de todos (ou quase todos) os problemas, apagador oficial de incêndio

postado em 09/06/2017 12:00 / atualizado em 09/06/2017 09:12

Edésio Ferreira EM DA PRESS
Pense num cara capaz de ser praticamente unanimidade entre atleticanos e cruzeirenses – e aqui entra um “praticamente” porque no passional meio do futebol há sempre aquele 1%. Pense num cara que sempre se fez respeitar, independentemente da instância com a qual estivesse lidando, sem precisar impor sua autoridade com rispidez. Pense num cara que raramente alterava o tom de voz, por mais incandescente que fosse o momento, e olha que ele passou por muitos. Pense num cara que, mesmo num ambiente tão competitivo, pulsante entre amor e ódio, como o do esporte bretão, colecionou admiradores. Ontem, o futebol, sobretudo o mineiro, perdeu esse cara. Eduardo Maluf.

Basta acompanhar os depoimentos de quem esteve ao lado de Maluf ao longo da carreira dele para compreender a importância que o dirigente teve por essas paragens. E entender a dimensão de tamanha comoção com sua partida nas mais variadas esferas: de cartolas a empresários, passando por jogadores, ex-jogadores, funcionários dos clubes onde ele trabalhou, torcedores e até imprensa. Quem conviveu com Maluf tem, mais do que uma história boa para contar, boas recordações.

“Ele era agregador”, disse Alvimar de Oliveira Costa, ex-presidente do Cruzeiro, em entrevista ao portal Superesportes. Taí uma palavra que bem descreve Maluf. Alvimar lembrou ainda da ascendência dele quando ainda estava à frente do modesto Valério. Nas reuniões na Federação Mineira de Futebol, contou Alvimar, Maluf tinha uma liderança tal que quem estava em lado oposto à da ideia apresentada por ele, ainda que fossem os poderosos Atlético e Cruzeiro, perdia a parada. Pois essa capacidade de persuasão foi o trampolim que alçou Maluf ao posto de um dos dirigentes de maior prestígio no cenário nacional. E, justamente por isso, sempre cobiçado por clubes de todo o país.

Não por acaso. Ele era o maior escudo de seus presidentes. O filtro de todos (ou quase todos) os problemas, apagador oficial de incêndio. A primeira alçada das discussões. O para-raios das polêmicas. Só passava dele para âmbito superior se fosse algo realmente fora de seu alcance. Não foram poucas as vezes em que tive Eduardo Maluf frente a frente ou do outro lado da linha do telefone. Não importava quão cascudo fosse o assunto, ele estava sempre aberto a responder. Sabia que eu não me furtava a fazer perguntas mais duras, e sempre as encarava com serenidade. Quando passei a colunista, ouvi dele palavras de admiração ao meu trabalho. Mesmo quando criticado neste espaço, nunca usou de seu posto para fazer pressão. Nunca fez aquele olhar atravessado de contrariedade, comum a muitos vaidosos personagens do futebol. Nunca esboçou qualquer tipo de retaliação. Foi um dos profissionais do esporte que mais compreenderam – e respeitaram – o trabalho da imprensa.

Treinadores, especialmente, criaram um vínculo especial com Maluf pela intensidade do convívio. Por mais que alguns tenham sido dispensados dos clubes justamente por ele. Nesse grupo há uma definição quase coletiva do que foi Maluf. “Ele era meu calmante”, ressaltou o passional Cuca. “Nos momentos difíceis, ele me acalmava”, confidenciou o por vezes temperamental Adílson Batista. “Nunca ouvi alguém fazer uma crítica pessoal a ele”, destacou o contestador Levir Culpi.

Maluf marcou seu nome na história do futebol. Com mais acertos do que erros, teve participação decisiva em fases gloriosas de Atlético e Cruzeiro. Com o esporte, teve uma relação simbiótica, mais do que meramente profissional. Na mesma proporção em que se doou muito, recebeu muito também. Passou por perrengues, é verdade, mas acumulou alegrias. E deixa uma lacuna a ser preenchida.

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