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PENTACAMPEONATO

No aniversário de 14 anos do Penta, Edmilson fala sobre a conquista e momento da Seleção

Zagueiro ainda relembrou embates com o Sport na Libertadores e comentou sobre a Fundação Edmílson, que desembarcou no Recife nesta semana

Rafael Brasileiro/DP
Nesta quinta-feira, o brasileiro queria voltar no tempo. Gostaria de estar nesta mesma data, mas 14 anos atrás. Neste mesmo 30 de junho, em 2002, o país acordava para assistir a Seleção Brasileira derrotar a Alemanha por 2 a 0 e sagrar-se pentacampeão mundial. Em entrevista exclusiva ao Superesportes, Edmílson falou sobre o maior título da sua carreira, do atual momento da Seleção, da importância de Rivaldo em 2002, o que espera de Tite, da sua fundação, os duelos com o Sport na Libertadroes e o principal. O 7 a 1 que marcou o país.

Como fica a lembrança do pentacampeonato, que parecia ser um momento que o hexa não demoraria tanto, sendo que já passaram 14 anos desde a última conquista?
Pra gente dessa geração de 2002, até 2010, foi uma conquista importante. A valorização do título vem sempre depois do fim da carreira. Todo atleta que teve uma grande passagem pela seleção ou clube, o que ele deixa mesmo é o legado de ter conquistado títulos. Fui convocado para 2006 e acabei não participando. Fui um abençoado por ter ganho uma Copa. Hoje, a gente vê esse legado. Somos conhecidos onde passamos. 

Depois do penta tivemos uma geração que prometia muito e não deu certo. O que deu errado neste caminho entre 2002 e 2014?
O Brasil viveu três finais consecutivas. 94, 98 e 2002. A equipe com mais bagagem de Copa do Mundo foi a de 2006. Ela uniu jogadores que tinham experiência de três Copas como Ronaldo, Roberto Carlos e Cafu. Alguns com duas de bagagem e o acho que mudou foi a renovação. O Brasil não investiu. Achou que só com talento, improviso, talento e malandragem iria ganhar Copa do Mundo fácil. Não se ganha Copa do Mundo com o tipo de preparação que fizemos na Granja Comary. Os alemães vieram aqui como guerreiros. Vieram praticamente para uma guerra. Construíram uma base para eles, se fecharam em um determinado momento de trabalho e acabaram levando. Nestes 12 anos que reinamos em Copas do Mundo, esquecemos de trabalhar uma nova geração. Temos pago muito caro não só na Seleção Brasileira, mas também nos clubes. A Seleção é a cereja do bolo do futebol. A gente tem uma boa seleção se temos clubes bons e atletas bem formados. Hoje temos uma crise de talento. Somos baseado em um cara, que é o Neymar,  que tem um talento enorme, mas que na Seleção não mostrou nada e precisa trabalhar muito. 

Recentemente (amistosos contra Estados Unidos e Costa Rica em 2015) você foi auxiliar pontual de Dunga na Seleção e o que você tentou passar para aquele grupo?
Foi uma experiência interessante. Um posto na Seleção que foi o Gilmar Rinaldi que praticamente criou. Levou todos os atletas que tinham história na Seleção, até os que não tinham título, caso do Careca, que foi e não foi campeão. Minha participação foi explicar como sair de uma crise durante uma competição. Foi o meu caso na Copa de 2002. Eu era titular na estreia e fui sacado no segundo jogo, contra a China. Fui o único titular que saiu e o time venceu por 4 a 0. No jogo contra a Costa Rica e eu acabei voltando ao time (fez um dos cinco gols da partida ao acertar uma meia bicicleta). Falei sobre como tive que lidar com essa situação entre o primeiro e o terceiro jogo. Iria me acomodar? Iria me juntar com os reservas e meter o pau no treinador? Iria me acomodar nos treinos? Eu foquei mais, treinei mais e procurei uma nova oportunidade. Passei para essa rapaziada, que mesmo com a grande derrota (7 a 1 contra a Alemanha), que está marcada, que não vai ser esquecida nunca, existe uma nova oportunidade para eles darem a volta por cima. O 7 a 1 não feriu só ele, mas também o povo brasileiro. Essa foi minha participação.

O que você sentiu vendo aquele 7 a 1?
Eu chorei. Fiquei muito chateado. Não foi uma humilhação só para aqueles meninos que estava, em campo. Foi para todo brasileiro. Eu acho que subestimamos a Alemanha. Um time mais organizado e individualmente melhor, já que estávamos sem nossos dois melhores jogadores, que eram o Neymar e o Thiago. Acho que deveríamos jogar como Alemanha e a Alemanha como Brasil. Quisemos jogar como Brasil. Tínhamos que jogar como Alemanha. Esperando um contra-ataque, uma bola. O Felipão abriu muito. Entrou com Bernard. Entrou com um time muito exposto. Sabíamos que o meio de campo deles era a base forte deles e eles exploraram as costas do Marcelo, onde fizeram os dois, três primeiros gols. Quando está 3 a 0, você pode falar para cair no chão, simular algo. Mas quando você está lá dentro não pensa nisso. Você quer tentar reagir. É igual luta de boxe. Você tenta reagir e leva um e vai à nocaute. Você não perde um jogo de 7 a 1 por um momento. Desde o dia que o Parreira e o Felipão disseram que seríamos hexa, chamaram uma responsabilidade muito grande. A gente lamenta muito. Não critico. Não queria estar na pele de nenhum deles. Ainda mais Luiz Gustavo e Dante. Os caras vivem na Alemanha e é uma situação que não desejo para ninguém. 
Rafael Brasileiro/DP

O que você espera de Tite na Seleção?
Eu acho que é um cara que conseguiu o carisma de todos. Jogadores, técnicos, população e da mídia. É um cara que responde bem aos jornalistas. É um cara que tem uma compactação tática e alternativas táticas, algo que é importante para a Seleção. O Dunga tinha um pouco de falha nisso. Tinha muitas qualidades. Eu conheço ele e ele tem uma maneira de trabalhar. É um cara super fechado. Acho que com o Tite iremos ver um time mais tático. De Seleção organizada. Talvez não tenha resultado rápido, pois é um trabalho de médio longo prazo. Espero que a torcida e vocês como críticos tenham paciência porque é um trabalho de reformulação.

Você acha que a base daquele time de 2014 estará em 2018?
Algumas peças. Acho que vai ser mudado. Alguns jogadores daquele grupo não deveriam nem estar em 2014. Foi muito prematuro e a pancada foi muito forte. Tem jogador que não se levantou ainda e nem vai conseguir se levantar no mesmo nível. Conversei com o Luiz Gustavo e ele me contou que depois de sete meses que começou a ter vontade de jogar futebol pelo clube. Vejo comentaristas que jogaram bola e comentam as coisas que não tem noção. “Ah, o cara não está nem aí”, falam.  Pode ter certeza que todos os meninos que estavam nessa Copa sentem e tem impactos emocionais fortíssimos. Acho que vários jogadores de 2014 não estarão em 2018. Dos 23 vão chegar pouquíssimos. Acho que temos que formar melhor e não temos nem que focar em 2018. Temos que jogar a Copa e ir como azarões. Trabalhar para formar uma grande Seleção para 2022.

Felipão foi o técnico em 2002 e 2014 e na questão do plano tático qual foi a grande diferença?
Muitas. Em 2002 tínhamos quatro pilares. Quatro caras que tinham acabado de levar um 3 a 0 da França. Roberto Carlos, Ronaldo, Rivaldo e Cafu. Você tinha quatro líderes em campo. Ronaldo e Cafu campeões em 1994, Rivaldo que era criticado a vida toda. Rivaldo foi o melhor da Copa. Somado a isso tinha o Ronaldinho subindo, Eu, Lúcio e Roque Junior como zagueiros e o Felipão conseguiu uma forma dos laterais atacarem. Jogamos assim no fim das eliminatórias e na Copa do Mundo. Só acho que não podemos comparar o Felipão de 2002 com o de 2014. Ele rodou, passou por Portugal, talvez estava com outra cabeça. Talvez estava com excesso de confiança. Quando você ganha, é uma coisa. Quando você perde, existem vários detalhes que você tem que analisar para não repetir novamente. 

Você teme que o Brasil fique fora da Copa de 2018 baseado na atual situação ou não corre esse risco?
Eliminatórias são complicadas. A Argentina começou mal e está bem. Eu acredito que o Brasil vai classificar. Não sou desses que torce contra. Pelo contrário. Se ficarmos fora da Copa várias pessoas ficarão desempregadas. Inclusive eu, que posso querer trabalhar como comentarista em alguma emissora (risos). Acredito que temos um elenco bom. Bom jogadores. Talvez não pensando para ser campeão Mundial, mas para jogar uma Copa do Mundo.

Ainda como jogador você criou a Fundação Edmílson e agora ela está aqui no Recife. Como será o trabalho dela?
Foi o meu gol de placa. Fundei em Taquaritinga, cidade onde eu nasci. Passei toda a minha infância lá e depois da escola eu sempre jogava bola, bolinha de gude e aprendia várias lições nessa época. Briguei bastante e apanhei bastante. Criei um pouco de raiva para vencer. Criei isso, coisa que a molecada, que tem talento, hoje não tem . Em 2002, após o título, eu queria fazer um projeto social onde eu nasci. Foi doado um terreno e começamos a construir. Em 2005, conversei com minha esposa e começamos a trabalhar depois que me aposentei. Não é uma escolinha de futebol. Não queremos novos Edmilsons, Juninhos, Rivaldos. Queremos dar oportunidade para a molecada ser cidadã. Temos aula de violão, de teatro, musica, informática, caratê. Apenas 2% não jogam futebol. Queremos dar autoestima a esse pessoal. Vimos que poderíamos inserir esse modelo em outras comunidades e conhecemos o pessoal da Regra 3 (empresa de comunicação) aqui em Recife. Inscrevemos esse projeto incentivado e a contrapartida é fazer uma ação de seis meses aqui no Santos Dumont. Iremos capacitar esses educadores na nossa metodologia e quem sabe em 2017 já fazermos o currículo educacional o ano inteiro. 

Já existe projeto de expansão para outras regiões?
Já recebemos vários convites e achamos que o local tem que ter uma necessidade. E, claro, tem que ter uma estrutura para educar com qualidade. Acho que casou a circunstância. O Santos Dumont está sendo reativado e foi uma grande oportunidade. No social tem que colocar a mão no bolso ou ter apoio de empresas. Não adianta esperar muito pelo governo. Acreditamos que pode ser um pequeno passo para um grande trabalho que faremos juntos.

Em 2009 você participou de duelos importantes contra o Sport na Libertadores e quais são suas lembranças naquelas partidas?
Eu voltei do Villareal e voltei muito bem com o Wanderley no Palmeiras. Até o Dunga e o Jorginho me falaram que eu poderia ter uma nova chance na Seleção. Eu estava muito bem para quem tinha 33 anos. Estava jogando bem e fazendo alguns gols. Criamos uma rivalidade grande naquela época e me machuquei contra o Sport. Em uma jogada boba, o Paulo Baier me deu um toque leve e cai por cima do braço. Machuquei o cotovelo e fiquei fora três meses. Aí tem aquele ditado. Carro velho demora para pegar de novo. Não voltei o mesmo. Terminei minha carreira no Ceará. Mas os dois jogos (na fase final) foram inesquecíveis. Ficamos em hotel longe daqui por conta dos fogos e até Wanderley fez uma palestra motivacional que fazia tempo que eu não via. Aí naquele jogo o Marcos apareceu e brilhou. Depois fomos eliminados pelo Nacional.

Foi o título que ficou faltando na sua carreira?
Acho que foi o Brasileiro de 2009. Depois que saímos da Libertadores, pegamos 20 rodadas como líder. Faltando 11 rodadas, estávamos a oito pontos dos concorrentes. Depois pegamos uma sequência de cinco jogos em que perdemos três, empatamos uma e vencemos outra. O Flamengo encostou e nos passou. Talvez por ter sido campeão nos países por onde passei, o título brasileiro foi o que ficou faltando. 

Voltando um pouco para a Copa de 2002, em algum momento vocês ficaram achando que o momento poderia virar para a Alemanha ou a confiança não mudava isso?
A gente tinha tanta confiança, que nunca passou, pelo menos na minha cabeça, e não vi essa sensação que poderíamos perder aquele jogo. Acho que depois das quartas de final, em um jogo totalmente contra nós, em que saíamos perdendo, depois empatamos no final com um golaço do Rivaldo, com a arrancada do Ronaldinho. Depois o Ronaldinho acerta aquela falta que ele cruzou, mas fala que foi chutar no gol.

Ele admitiu isso internamente?
Não. Isso é minha opinião (risos). Mas acho que depois daquele jogo a gente sentiu que a gente seria campeão. Antes da Copa, o Felipão fala que queria ficar entre os quatro. Ele falou até em uma reportagem que o título era recompensa, porque o objetivo era ficar entre os quatro. Depois pegamos a Turquia, que foi difícil, mas sabíamos que seríamos campeões. 

E Rivaldo naquela Copa?
Para mim ele foi um cara desequilibrante. Fez uma função que não ficava tão isolado. Fez muito gols em uma Copa do Mundo ao lado do Ronaldo. Foi crucial nos dois lances dos gols na final. É um cara excepcional, apesar da sua timidez. Um bom pernambucano. 

Você acha que essa timidez custou reconhecimento a ele?
Não só ele, mas várias pessoas. Acho que no nosso país as pessoas só são reconhecidas quando morrem. Infelizmente. O Rivaldo é um cara de um espelho. Não sei como aqui em Pernambuco você o enxergam, mas ele é um cara fantástico. É exemplo. 

Durante a Copa você participou de lances engraçados. O da camisa, na final e o como foi com o Vampeta dando cambalhota em Brasília?
Teve uma jogada no começo do segundo tempo e a camisa rasgou no lance. No intervalo tirei minha camisa suada e joguei ao avesso mesmo no saco. Ao invés do Barreto (roupeiro) me dar uma camisa sequinha, sem estar molhada, me jogou aquela. Tinha o forro e ele jogou pra mim. Eu queria colocar rápido e comecei a colocar toda errada (risos). Eu não fiquei nervoso. Queria colocar rápido e acabei me confundindo. Sobre o Vampeta, ele tinha jogado cartas 24 horas seguidas e bebendo cerveja. Será que se você dá uma cambalhota e iria parar? Foi uma grande festa.

Ele se controlou na Copa?
Se controlou. Ele e todo mundo. Foram 52 dias impressionantes. Quando tinha problema era cortado na raiz. O Felipão sabia identificar o problema pela raiz. Ele chamava todo mundo e cortava logo. Até que um dia, após o jogo contra a Inglaterra, quando ele colocou o Edilson ao invés do Luizão e o Luizão ficou de bico. No outro dia, a gente estava fazendo hidroginástica em uma banheira com 33 graus mais ou menos. E ele não deu uma palestra de 30 minutos para a gente lá mesmo? Quase cozinhamos. Mas na mesma hora o Luizão pediu desculpas ao Edilson e ficou tudo resolvido.