Aos 22 anos, esse pernambucano tem sido muito importante ao Cruzeiro. Em 28 partidas na temporada, contabiliza sete gols e caminha a passos firmes para alcançar a meta que ele mesmo traçou para si: balançar as redes 15 vezes neste ano. Não por acaso, tem despertado o interesse de clubes do exterior. Mas talvez o que alguns torcedores cruzeirenses não saibam é como o clube tem sido igualmente importante para Raniel, e não apenas profissionalmente.
Protagonista de uma trajetória de muita luta, como a de tantos jogadores de futebol, a personalidade forte que ele mostra, dentro e fora de campo, foi forjada por uma infância difícil e uma adolescência das mais complicadas. A Raposa entrou nesse roteiro como a segunda chance que Raniel precisava. E ele tem aproveitado a oportunidade para reescrever sua história.
Nascido numa comunidade carente do Recife, o atacante perdeu o pai aos 6 anos (não carrega nenhuma lembrança dele, só o conhecendo por meio de fotos) e teve como figura paterna Barão Xavier, seu treinador no futsal, que o acompanhou desde os primeiros chutes na bola. Abandonado pela mãe biológica, foi adotado pela ex-patroa dela, Dione, que custeou seus estudos em uma escola particular da capital pernambucana. Aos 15, trocou o futsal pelo futebol de campo, no Santa Cruz. Aos 16, a perda mais dolorosa: Dione, a quem considera sua mãe, morreu, de parada cardíaca. Foi o gatilho para que o trem saísse novamente dos trilhos.
Raniel voltou a morar na periferia da cidade, com a família materna. Aos 17, quando era considerado a maior joia da base do Cobra Coral, passou por mais um drama, ao ser pego no exame antidoping por uso de cocaína. O jogador fala do episódio sem medo. Admitiu ter consumido a droga numa festa com amigos, na comunidade. Em agosto de 2015, o caso foi parar na Fifa, que o suspendeu.
Em maio de 2016, ele chegou ao Cruzeiro, para jogar na base, por empréstimo. Mostrou brilho, marcou gols e, em janeiro do ano passado, foi adquirido em definitivo pelo clube celeste – segundo a imprensa pernambucana, por aproximadamente R$ 4 milhões. Em março deste ano, depois de aparecer bem logo nos primeiros jogos na temporada, substituindo Fred (que havia sofrido lesão muscular), os dirigentes da Raposa se apressaram em renovar o vínculo, ampliado até dezembro de 2022 e com uma multa rescisória milionária: cerca de R$ 370 milhões.
Do menino que superou dramas diversos desde os primeiros anos de vida ao jogador que hoje vale milhões, Raniel percorreu uma intensa jornada. Ainda não chegou ao ápice – nem sequer é titular no Cruzeiro. A caminhada está no começo e é longa, mas seu potencial é claro. A vontade de vencer também. O fato de não se intimidar em campo é certamente reflexo das agruras que precisou superar. A dancinha irreverente ao comemorar os gols, talvez amostra do garoto que ainda leva dentro de si.
Como atleta, ele está apenas no início da estrada. Precisa ter cabeça para não cair (de novo) nas armadilhas que o mundo do futebol reserva para quem alcança o estrelato – elas são muitas e estão por toda parte. Diz ter aprendido as lições, depois de tanta dificuldade.
É um dos atletas mais promissores de sua geração, embora ainda tenha a evoluir tecnicamente. É arrojado, destemido, e como é bom ver um jogador assim. Luta pela bola e sabe o que fazer com ela, pois tem visão de jogo. Some-se a isso o fato de ser bom finalizador. São características que o colocam, se não à frente, no mesmo patamar dos demais atacantes do Cruzeiro, a maioria com muitos anos de carreira a mais que ele. Raniel tem todas as ferramentas para brilhar no futebol. Basta saber usá-las com sabedoria.