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TIRO LIVRE

As voltas que a bola dá

Há sete anos, Bruno Henrique chegou à Toca de graça. Não teve uma chance de atuar. Hoje, se quiser contar com ele, o Cruzeiro terá de desembolsar quase metade do que arrecadou com a venda de De Arrascaeta

postado em 18/01/2019 11:04

AFP / Heuler Andrey

Volta e meia o futebol nos apresenta uma história que simboliza bem como a vida pode reservar grandes reviravoltas para uma pessoa – e isso, muitas vezes, é apenas questão de tempo, persistência e paciência. No caso de Bruno Henrique, oito anos separam o office-boy que ganhava um salário mínimo por mês, jogava bola em time amador de Belo Horizonte por amor e sonhava com o milionário mundo do futebol do atacante que atuou na Europa, voltou ao Brasil a preço de ouro e hoje vale, por baixo, R$ 20 milhões. E o Cruzeiro tem participação direta e indireta nessa história, do primeiro ao último (ou mais atual) capítulo.

Foi o clube da Toca da Raposa que abriu as portas do futebol profissional para Bruno Henrique, ainda que de forma não muito convicente. Depois de se destacar na Copa Itatiaia, o atacante ganhou, aos 21 anos, seu primeiro contrato. Esteve longe, contudo, de ser uma grande aposta do clube celeste. Na época, o assunto ficou escondido, tratado na surdina mesmo, praticamente restrito aos envolvidos na negociação – o Cruzeiro nem sequer divulgou que havia contratado o jogador.

De cara, Bruno Henrique foi emprestado ao Uberlândia, para ganhar cancha, como se diz no futebolês. Findado o contrato de empréstimo com a equipe do Triângulo, o Cruzeiro não teve interesse em integrá-lo a seu grupo. Assim, o atacante acabou ficando em definitivo no Uberlândia. As boas atuações o levaram para o Itumbiara, em julho de 2014. O Goiás logo viu potencial no mineiro e o contratou no início de 2015. Colheu os frutos um ano depois, quando o vendeu por R$ 20 milhões ao alemão Wolfsburg. Em 2017, o jogador retornou ao Brasil para atuar no Santos, que pagou quase R$ 14 milhões para repatriá-lo. Agora, o Peixe pede ao Cruzeiro R$ 20 milhões mais 50% dos direitos ecônomicos de Raniel para liberá-lo para vestir a camisa celeste.

Veja bem: há sete anos, Bruno Henrique chegou à Toca de graça. Por um ano, foi jogador cruzeirense, no caso, apenas de forma protocolar, já que não teve uma chancezinha de atuar. Não fez um treino com o time. Nada. Hoje, se quiser contar com ele, o clube terá de desembolsar quase metade do que arrecadou com a venda de De Arrascaeta para o Flamengo. Não é só isso: o Peixe quer receber do Cruzeiro o mesmo montante que o Wolfsburg pagou quando levou o atacante para a Europa. São as voltas que o mundo dá.

Em entrevista ao repórter do Estado de Minas Roger Dias, no fim de 2017, Bruno Henrique disse não guardar mágoas do Cruzeiro, pela falta de oportunidade. “Sair do futebol amador e ir direto para o Cruzeiro era uma responsabilidade grande. Mas sabia do meu potencial e sempre tive na cabeça que me tornaria um bom jogador. Eles me deram uma chance, fizeram contrato comigo e me emprestaram para o Uberlândia, para pegar experiência que nunca tive. Não existe frustração. Foi apenas um ano de contrato. Se fosse um pouco maior, eles teriam me aproveitado mais”, disse, resignado.

Bruno Henrique já poderia ter retornado à Toca da Raposa há mais tempo. Ele apareceu na pauta celeste no início de 2017. Na época da formação do grupo que Mano Menezes trabalharia naquela temporada, a diretoria chegou a perguntar se o treinador se interessava pelo atacante, que estava no futebol alemão. Mano dispensou, pois entendia que, naquela ocasião, Bruno Henrique não se encaixaria à forma de jogar da equipe. O clube foi buscar, então, Thiago Neves.

Em 2017, Bruno Henrique foi o artilheiro do Santos, com 18 gols em 53 jogos. Chegou a ser cogitado até na Seleção Brasileira, o que seria a consagração do menino de família humilde, criado no Bairro Concórdia. No ano passado, no entanto, não reeditou o desempenho, prejudicado por uma série de lesões. Foram apenas dois gols marcados em 34 partidas.

A atual diretoria celeste tem grande admiração por Bruno Henrique, quase uma obsessão. Desde o início do ano passado que tenta trazer o atacante para a Toca. Já ofereceu dinheiro, jogador, mas nenhuma investida deu certo. Talvez por acreditar que o atacante estivesse em baixa desta vez, fizeram mais uma tentativa, porém a transação está estagnada.

O técnico do Peixe, Jorge Sampaoli, já disse que quer a permanência de Bruno Henrique na Vila Belmiro. Acredita no potencial do jogador e disse que pode recuperá-lo.

Até o encerramento da novela, a história de Bruno Henrique com o Cruzeiro continuará restrita ao primeiro capítulo. Aquele que, na prática, nem foi escrito.

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