Fiquei observando as reações de torcedores de Atlético e Cruzeiro neste fim de semana. São reações tão previsíveis, universais e infinitas que me fizeram pensar em como a relação do torcedor com seu time é um simulacro da relação social, da interação humana, da projeção que fazemos o tempo todo entre o desejo e a realidade.
Enquanto um já teve todos os seus desejos atendidos e nem se importa com mais uma derrota, o outro, por não ter correspondido às expectativas, sofre os ataques de pessimismo e maledicência.
Aparentemente, o time do coração, na percepção do torcedor, não é uma coletividade. É um ser autônomo, quase um indivíduo, capaz de proporcionar deleite e frustração na mesma proporção, como numa relação humana.
E quem nunca se decepcionou com uma experiência ruim? Quem nunca idealizou uma situação e viu na prática que não era exatamente aquilo que se esperava?
Somos seres de imaginação fértil. Partimos do pressuposto que nossa percepção é suficiente para entender as reações do mundo. Que engano. A vida é tão imprevisível quanto é um jogo de futebol. E por isso, a gente tem surpresas boas e ruins. A questão é como reagimos a essas surpresas. Isso determina nossa capacidade de sobreviver às pancadas e desfrutar o que vier de bom, ou sucumbir por falta de perspectiva.
No caso do torcedor, é muito mais fácil. No fracasso, a culpa é invariavelmente da outra parte (no caso, o time), e não faltam dedos para apontar as falhas. Algumas delas pertinentes, outras subjetivas, e a maior parte, puramente emocional.
No caso do sucesso, é sempre uma conquista coletiva! Sem a torcida o time jamais teria alcançado qualquer objetivo ou qualquer glória.
Mais uma vez, uma percepção muito mais emocional que objetiva. E está tudo certo. É pra ser assim mesmo.
É uma relação distorcida, mas compreensível. Ninguém quer se incluir na derrota. E da vitória todo mundo quer fazer parte. É o famoso "eles perderam, nós vencemos".
A verdade é que o time representa para cada torcedor, uma coleção de alegrias e decepções que todo mundo tem na vida. É um ser etéreo, personificado em jogadores que vêm e vão. E que realizam as idealizações de cada um de forma mais positiva, ou menos, dependendo do momento. Por isso é uma relação tão íntima. Porque é com alguém (ou no caso, alguma coisa) de quem se espera muito, sempre, mas que ainda que proporcione as maiores alegrias, eventualmente, pisa na bola (às vezes literalmente).
E mesmo com o infinito ciclo de alegrias e decepções, o olhar deificado do clube para a torcida e o olhar esperançoso lançado de volta por esse torcedor jamais será comprometido. A torcida sempre será a razão de existir daquele clube, daquela ideia, daquele time. E a recíproca é verdadeira. Mesmo que apenas um lado possa se dar ao luxo de espernear e apontar o dedo para falhas e derrotas. E caiba ao outro lado calar-se resignado e tentar ser melhor da próxima vez.
A temporada está terminando. Para alguns com um sabor de alívio e de que tudo está pronto para voltar ao normal. Para outros, com uma angústia derivada da corrida contra o tempo e impressão de que não há forças para o alcançar o objetivo mínimo.
Curiosamente, e humanamente, da mesma forma que no fim do ano passado. Só que de modo invertido. Mais uma vez ilustrando com esse universo lúdico que é o esporte, uma constatação tão básica quanto divina. A vida é um pêndulo de moto perpétuo.