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Fábio revela divisor de águas na carreira, fala de críticas e títulos na Toca da Raposa

Goleiro disse que não é o único culpado pela falta de títulos de expressão do Cruzeiro nos últimos anos e falou de momento difícil e transformador no ano de 2007

05/07/2013 07:00 / atualizado em 05/07/2013 09:04
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Com 499 jogos, Fábio está perto de ultrapassar marca de Raul, que disputou 549 pelo Cruzeiro
foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.APress

Com 499 jogos, Fábio está perto de ultrapassar marca de Raul, que disputou 549 pelo Cruzeiro


Prestes a completar 500 jogos com a camisa do Cruzeiro, o goleiro Fábio recebeu a equipe do Superesportes, na Toca da Raposa II, para um bate-papo sobre sua trajetória no clube. À vontade e direto nas respostas, o camisa 1 falou abertamente sobre assuntos delicados, como críticas, ausência de títulos de expressão e seus piores momentos na Toca. O atleta também revelou o divisor de águas na carreira para se transformar em ídolo da torcida. Sob olhar de Raul, goleiro que mais vezes vestiu a camisa do Cruzeiro (549 partidas), Fábio falou de planos para o futuro, mas garantiu que se tornar o jogador mais longevo do clube não está entre eles. A entrevista completa você acompanha abaixo.

Quando você voltou ao Cruzeiro, em 2005, você pensava em alcançar uma marca como essa?

Não pensava. Só pensava em voltar a jogar, eu estava vindo de um processo na Justiça contra o Vasco, tinha ficado quatro meses parado, então eu queria vir para uma equipe com estrutura para voltar a jogar. Eu queria reconhecimento em uma grande equipe, o Cruzeiro me deu essa oportunidade, eu tinha algumas propostas, mas fiz uma escolha acertada, tanto que não só eu como toda minha família se dá muito bem aqui em Minas, o tempo diz isso, são quase nove anos como titular. Foi um período de muitas alegrias e em que eu cresci como pessoa e como profissional.

Quais os momentos mais importantes durante esses nove anos de Cruzeiro?

Todos os momentos são válidos. A chegada foi um momento em que tive que me dedicar bastante para voltar a jogar da mesma forma que eu jogava no Vasco, existia uma cobrança grande, eu tinha que voltar à forma física, corri contra o tempo para me aprimorar. Foi um período importante. Os momentos de dificuldades, com cobranças de imprensa e torcida, foram períodos em que eu consegui crescer muito como profissional e como homem. Os momentos de alegria foram vários, joguei bastante, concretizei cada temporada como destaque dentro das competições que disputei.

Quem foi sua referência como goleiro?
Lesão em 2007 foi um divisor de águas
foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.APress

Lesão em 2007 foi um divisor de águas



Eu sempre tentei pegar um pouco de cada goleiro que eu tive oportunidade de observar. Na minha infância e adolescência, a gente não tinha acesso como temos hoje, de internet, de ver jogos de outras equipes, então a gente via os jogos que passavam no Mato Grosso, que geralmente era só um por semana, no domingo. Então eu não ficava fixo em um só time ou goleiro. Na minha época de adolescente eu lembro do Taffarel, Zetti, Veloso, vi o Gilmar jogar também. Cada um com sua característica, eu observava todos e pegava o que achava essencial de cada um.

Você procura auxiliar os garotos que sobem para treinar com você? Já existe um herdeiro do Fábio no gol do Cruzeiro ou ainda é cedo para isso?

Acho que a pessoa pode jogar independentemente da idade, o importante é fazer por onde nos treinamentos, é o que tento fazer sempre. Não adianta eu me destacar muito em um jogo e ser abaixo da média em outro, tem que haver equilíbrio, erros acontecem, mas se a gente estiver concentrado eles tendem a diminuir muito. É o que sempre falo para os meninos que esperam uma oportunidade de titular no profissional, tanto o Rafael, como o Elisson e o Igor. Eu fico cobrando também para que eles se dediquem e não se acomodem na reserva. Eles têm que almejar jogar no Cruzeiro ou outra equipe de ponta.

Qual foi o divisor de águas no Cruzeiro para você deixar de ser um goleiro contestado e virar um ídolo da torcida?

Quando eu cheguei, em 2005, tive que voltar à melhor forma, a cobrança era normal, eu vinha me destacando no Vasco e cheguei no Cruzeiro para fazer a mesma coisa, me destacar. Existia a cobrança no clube desde a saída do Gomes, por causa daquela equipe que ganhou tudo em 2003. Eu estava sem jogar há alguns meses e tive que me superar. Em 2006 eu fiz uma temporada muito boa, tanto que retornei à Seleção naquela época. O Cruzeiro até contratou alguns goleiros em 2006, o Lauro, o Juninho, porque em 2005 eu estava retomando minha forma física. Mas em 2007 foi uma virada não só na minha vida profissional, mas também como homem. Deus me deu a oportunidade que nunca tinha vivenciado, de ter essa comunhão com Ele. Foi um processo mais fora de campo, isso que começou a mudar minha vida e refletiu com certeza dentro de campo. Foi depois daquela lesão na final do Campeonato Mineiro (em que o Cruzeiro perdeu para o Atlético por 4 a 0), isso foi primordial para que eu pudesse me dedicar de uma forma mais profissional. Mas o que me faz ser titular do Cruzeiro até hoje é meu trabalho, não é o fato de eu ser bonzinho ou cristão. No futebol, se você não corresponde, você perde espaço.

Com qual preparador de goleiros você mais rendeu?

Tenho que agradecer a todos, cada um tem seu método de trabalho e é lógico que com alguns você consegue evoluir mais e ganhar entrosamento. Depois da minha lesão, eu tive a oportunidade de trabalhar com o Oscar Rodriguez, que foi um período muito bom, onde eu tive uma sequência boa. A minha felicidade foi que o Oscar saiu na saída do Adílson e o Cruzeiro trabalhou muito rápido para trazer outro treinador de ponta que é o Robertinho. Isso foi fundamental para que eu permanecesse bem em 2010. Consegui ser o melhor goleiro do Brasileiro, ganhei a Bola de Prata, o Robertinho deu sequência ao bom trabalho que já era desenvolvido pelo Oscar. Hoje, os goleiros da base têm uma preparação melhor do que na minha época de base, o treinador de goleiros é fundamental. Tanto que hoje a gente vê cada vez mais goleiros jovens no profissional, antigamente havia uma sina de que goleiro tinha que ter mais de 27 anos. Hoje o pessoal já está jogando com 20 no profissional.

Até 2007 você pegava poucos pênaltis. Depois disso, passou a pegar muito, inclusive de jogadores consagrados. O que aconteceu para essa melhora?


A gente sempre tenta evoluir, estudar o que está fazendo de errado, se estou saindo muito cedo, definindo o canto precocemente. Também tive de me adaptar às situações, tinha, por exemplo, uma época em que podia ter “paradinha”. O ponto-chave é esse, não só para goleiro, mas para qualquer profissão, nunca se acomodar. Acho que consegui crescer em muitos aspectos, inclusive nos pênaltis.
foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.APress

"Tenho até 2016 para conquistar títulos"


Falta alguma coisa para marcar seu nome no clube?

A história individual tem muitos fatores. Você pode entrar para a história por jogar muito ou por jogar pouco, mas em uma sequência vencedora. Em 2003, teve jogadores que nem jogaram tanto, mas ficaram marcados pelo ano que tiveram dentro do Cruzeiro. Eu estou tendo a oportunidade de jogar por muito tempo com a camisa celeste, o que é até mais difícil do que conquistar titulo. Sei que as conquistas não dependem só de sua atuação, principalmente no futebol. Às vezes você deixa de ganhar título por um erro de arbitragem, por alguma coisa que aconteceu ao longo da temporada, o que a gente já viu várias vezes acontecer. Mas em termos de títulos acho que estamos muito próximos, tenho até 2016 (para conquistá-los). Para muitos que não entendem isso, que acham que o Fábio não ganhou título, que acha que sou o responsável por tudo que acontece no Cruzeiro, se analisarmos friamente, só em 2013 que o Cruzeiro conseguiu fazer um time para brigar por título. Desde que cheguei o Cruzeiro nunca havia feito um time que as pessoas diziam: “este é para ser campeão”. A gente sempre conseguiu crescer dentro das competições, como na Libertadores de 2009, no Brasileiro, nas quatro classificações que a gente conseguiu para a Libertadores, nunca a gente entrou como favorito. Quando isso aconteceu, foi o pior ano do Cruzeiro, 2011, quando nos classificamos para as oitavas de final da Libertadores e nos chamaram de Barcelona das Américas, nos elogiaram bastante, mas caímos na sequência.

E este ano, dá para ser campeão?


A gente tem de se portar como campeão. Às vezes você não tem um grupo (tão qualificado), mas os jogadores se comportam. Em 2009 tivemos a oportunidade de chegar à decisão da Libertadores porque o time acreditou naquilo, mesmo não tendo potencial, foi fundo na confiança que tinha, crescendo jogo a jogo. Futebol proporciona isso. A Seleção até pouco tempo ninguém acreditava, mas cresceu dentro da competição (a Copa das Confederações), com dificuldade, e conseguiu o título. Então, a gente tem condição de conquistar títulos pelo grupo, mas a gente tem de ter postura de campeão, trabalhar como campeão, entrar nos jogos como campeão, porque o título não é alcançado na final, ele vem em uma caminhada longa, principalmente dentro do Brasileiro. Hoje a gente tem uma equipe formada para ser campeã. Ela pode não ganhar nada, como pode ganhar tudo, como em 2003.

Se você mantiver a média de jogos das últimas temporadas até 2016, quando se encerra o contrato, você pode se transformar no jogador que mais atuou pelo Cruzeiro. Você pensa em atingir essa marca?

Na verdade não penso, não, deixo muito as coisas acontecerem no dia a dia. Quero estar sempre em campo, treinando, para evoluir, e jogando. Só quando acontece ou está perto de acontecer que você toma conhecimento. Tudo é determinado por Deus e é Ele que dá oportunidade para trabalhar. Ele me deu contrato até 2016 e espero cumpri-lo até o final. Depois vamos ver o que vai acontecer.

Você já teve proposta para deixar o Cruzeiro? Se sim, o que ocorreu, preferiu ficar?
Fábio não pensa em ser o mais longevo
foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.APress

Fábio não pensa em ser o mais longevo



Tive várias, mas minha relação sempre foi muito franca e sincera com os presidentes, o que foi fundamental para que eu permanecesse, inclusive no momento mais difícil do Cruzeiro, agora mais recente, tive proposta da Rússia e de clubes brasileiros. Mas nunca pensei só no lado financeiro, senão já tinha partido há muito tempo. Conversei, pedi a Deus, primeiramente, a direção e Ele sempre colocou no meu coração no momento certo que eu permanecesse. Quando Ele concretiza isso é porque vai abrir todas as portas, inclusive as que você menos espera, te surpreendendo da melhor forma possível. E foi dessa forma. Fui coerente, fui correto e Deus sempre me abençoou, me dando renovações antes mesmo do fim dos meus contratos. Um ano, um ano e meio antes do fim do compromisso já era chamado para renovar, tanto porque tinha outras propostas e também por ter sido sempre coerente com o Cruzeiro, nunca pensei em tirar proveito. Isso só vem a concretizar meu crescimento, não só como profissional,mas como ser humano também.

Se pudesse, mudaria alguma coisa em sua trajetória no Cruzeiro?

Acho que tudo foi muito bem traçado por Deus, tanto as coisas positivas quanto negativas. Foi tudo perfeito. Claro que a gente quer sempre ganhar, conquistar títulos, mas quando Deus confirma que você é merecedor, as coisas vão acontecer na hora certa. Se o título importante não veio é porque a gente não merecia. Temos tudo pela frente para conseguí-los.

Qual o pior momento nestes anos?

Dentro do futebol foi a minha contusão (durante a goleada por 4 a 0 para o Atlético, no primeiro jogo da final do Campeonato Mineiro de 2007). Por tudo que aconteceu durante o jogo, tinha de ocorrer para que eu pudesse ter um crescimento na minha vida. E eu consegui tirar proveito disso e fazer daquilo uma essência de vida. Depois daquela lesão, me fortifiquei mais, Deus cada vez me iluminou, me capacitou. Um momento difícil se tornou o momento mais feliz da minha vida. Cada derrota é um momento difícil. Mas tem de saber separar para que você não fique murmurando, remoendo. O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã.

O que a marca de 500 jogos representa para você?

É uma coisa difícil hoje no futebol, tanto pela identificação que você tem que ter com o clube para permanecer um grande período como também pela dificuldade de chegar ao final da temporada sempre com o um bom trabalho para se manter como titular. Nós sabemos que a cobrança é muito grande, principalmente em cima do goleiro, então temos que superar todos esses obstáculos para conseguir alcançar uma marca que poucos jogadores conseguem. No Brasil, a troca de clube é natural, estou bastante feliz de alcançar essa marca no Cruzeiro.

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