2

Ex-jogadores e treinadores revivem era de ouro do Futsal em encontro

Clube Recreativo Mineiro recebe personalidades que marcaram época no "esporte da bola pesada"

20/11/2021 11:32 / atualizado em 20/11/2021 11:58
compartilhe
Paulinho Bonfim, Betinho e Jackson, no primeiro encontro, em 2019
foto: Encontro Futsal e Amigos

Paulinho Bonfim, Betinho e Jackson, no primeiro encontro, em 2019

O esporte, mais precisamente o futsal, que outrora era chamado de futebol de salão, volta no tempo neste sábado. A partir das 13h, no Clube Recreativo Mineiro, 120 ex-jogadores e ex-treinadores se encontrarão para uma confraternização que acontecerá pelo segundo ano consecutivo. E nessa reunião, inevitável não falar nos caminhos do "esporte da bola pesada", o que aconteceu com ele e o que tem de ser feito para que volte a ser forte mundialmente.

O que se assiste, nos últimos anos, é ver o futsal brasileiro em franca derrocada. A Seleção Brasileira é hepta campeã mundial, embora a Fifa só considere cinco desses títulos, a partir do momento em que a entidade passou a patrocinar o esporte, em 1989. No entanto, nos três primeiros mundiais, o Brasil ganhou dois, Brasil'1982 e Espanha'1985.

Mas a partir do momento em que a Fifa assume o esporte, acontece uma série de mudanças de regras que, para muitos - unanimidade dos três mineiros campeões do mundo, Paulinho Bonfim, Walmir e Jackson -,  são responsáveis pela perda de interesse pelo esporte no Brasil.

Nos dois últimos mundiais, o Brasil não conseguiu o título. Na Colômbia'2016, a Seleção sequer chegou às semifinais. Foi eliminada pelo Irã, nos pênaltis (3 a 2), nas oitavas de final. E no Mundial deste ano, Lituânia'2021, o Brasil foi apenas o terceiro colocado. Foi eliminado pela Argentina (2 a 1), que outrora, era freguês, nas semifinais. 

"Temos de parar de enfrentar a Argentina em amistosos, senão eles vão pegar o jeito de jogar. Vão aprender". A frase foi um alerta feito pelo técnico bicampeão mundial, Hong Kong'1992 e Espanha'1996, em 1995. O treinador temia que de tanto jogarmos contra nossos rivais sul-americanos, eles acabariam se favorecendo, como realmente aconteceu neste ano, no Mundial.

Segundo ele, o Brasil enfrenta um grande problema no futsal, que diz respeito à base. "Temos de recomeçar do zero. A base do esporte que era escolar, não existe mais."

O investimento da formação, lembra Takão, vinha das escolas. "O clube não tem interesse em investir na formação, na descoberta do talento. São raras as equipes que sobreviveram. Hoje, temos Minas, com dois times, e Olympico, que são equipes fixas, o América voltando. Antes, a gente até perdia as contas de quantas equipes tínhamos, somente em Belo Horizonte." O treinador começou a carreira de treinador no Colégio Santo Antônio, de BH, que mantinha uma equipe, a mesma escolar, no campeonato de clubes, o Arsenal.

O treinador insiste que o fundamento vem da escola, e que com o afastamento desta, o futsal brasileiro paga um alto preço. "A Liga Nacional está distante, muito distante da realidade dos clubes. O clube não tem dinheiro para investir. Ou se resgata o esporte através das escolas, ou não terá jeito. O Brasil seguirá com muita dificuldade, tanto em nível nacional como internacional."

Pela volta do Colegial

O ex-ala Paulinho Bonfim reforça as palavras de Takão, lembrando que hoje, Belo Horizonte tem apenas dois clubes na disputa do  Campeonato Metropolitano, Minas e Olympico, sendo que o primeiro joga com duas equipes.

"Quase ninguém joga salão (futsal), mais. As crianças, hoje, vão para outros esportes, como skate. Tem videogame e shoppings. Falta também incentivo", diz Paulinho, que cita outros detalhes que para ele se tornaram um problema para o esporte.

"Vivemos hoje uma carência de quadras e mesmo de campos de várzea. Essa diminuição do número de locais para praticar o esporte é extremamente nociva. Havia times de futebol em quase todos os bairros de Belo Horizonte. Hoje não tem mais", diz.

Para ele, falta incentivo, também, por parte de empresas e setores econômicos. "Antigamente, a gente tinha, por exemplo, o campeonato dos bancários, dos securitários, e tinha o Campeonato Colegial. Infelizmente tudo acabou. É preciso voltar, em especial com o Colegial, urgentemente."

Não é meu esporte

Beque da Seleção Brasileira que ajudou na conquista do primeiro título mundial, em 1982, Walmir, o futsal não é, nem de perto, o esporte que ele praticou, o futebol de salão.

 "Mudaram as regras, mudaram a quadra, mudaram a bola. É outro esporte", diz, que critica a maneira como o jogo acontece e prega a necessidade da volta à regra antiga.

Para ele, o futsal como é jogado nos tempos atuais é um grande absurdo. "Existe uma necessidade, não sei porque, de que haja velocidade. Não existe mais o raciocínio. Antes, o espaço era menor, a quadra era menor e isso, pra jogar, exigia da gente, jogadores, uma capacidade de raciocínio, muito grande. Mas isso, hoje, nessa quadra enorme e com as regras existentes, não existe mais. Não permite."

Erros cometidos

O ex-ala esquerdo Jackson foi o autor do gol que deu ao Brasil o título do primeiro mundial, em 1982. Ele é o recordista de títulos, no Brasil e no mundo. São 125. Foi também campeão mundial em 1985. Não bastasse isso, foi campeão mundial universitário em 1984, quando o técnico foi também um mineiro, Rubens Bonfim, irmão de Paulinho Bonfim. E em todos esses títulos os gols decisivos foram marcados por ele.

"O salão perdeu o desafio. A quadra nas medidas 40m por 20m, não permite, sequer, que haja estratégia de jogo. As partidas são monótonas. Hoje, não tem dificuldade para o atleta. E pior, não se vê ninguém se divertindo com o jogo. Quando a quadra era 28m x 16m, todo mundo se divertia."

Já não entende como os dirigentes do salão (futsal) brasileiro não se revoltaram quando da proposição da mudança de regras. "Não deveriam ter aceitado. Tinham de bater o pé. A quadra deveria medir, no máximo, 33m"

O jogo perdeu muito, segundo ele, pois não se vê mais, por exemplo, jogadas trabalhadas. "Lançam a bola de qualquer jeito.". E faz uma comparação com outros esportes, como o vôlei. "O vôlei acabou com a história de que a bola, no saque, tocando a rede, o jogo parava. Não, hoje segue. E tem mais, colocaram os pontos corridos. Acabaram com a tomada, quando um time tinha de recuperar a bola para depois tentar pontuar. Dinamizaram o jogo."

O aumento da quadra, segundo ele, se fosse no passado, não permitiria que o Brasil tivesse um dos maiores jogadores de futebol de salão de todos os tempos, o cearense Leonel. "Ele não tinha chute. Suas bolas eram colocadas. Mas era no campo de tamanho racional. Hoje, quem não tem chute forte, não pode jogar."

Reclama também da bola. "O nosso esporte era da bola pesada. A bola não quicava. Hoje a bola é leve. Aumentaram o campo e não aumentaram o gol. Tinham de ter feito isso, mas não."

Lateral batido com o pé é outra aberração para ele. "Nem no campo é assim. Bate-se com as mãos. Isso tirou jogadas espetaculares, como o voleio. Você recebia o lateral no peito e já virava um voleio."

A única mudança que ele concorda é com o tiro livre a partir da quinta falta. "Isso faz o jogo ser mais limpo. Eu nunca fiz falta enquanto joguei. O jogo tem de ser privilegiado, não a violência ou a falta de categoria."

O fim das peladas de rua, é também, segundo ele, um fator que prejudicou o futsal. Era ali que a gente aprendia. Mas hoje, não existe mais, uma pena. O esporte perdeu o encanto."

A raiz do esporte, criado nos anos 30 no Uruguai, pelo professor de educação física Juan Carlos Ceriani Gravier, que era da ACM (Associação Cristã de Moços). A busca pela raiz, de como o Brasil se tornou forte nesse esporte, hoje chamado futsal, em que a técnica e o drible eram a razão, o fundamental para a sua prática.

Como surgiu

O esporte chegou ao Brasil em 1935, através da ACM e logo caiu no gosto do povo, que passou a praticá-lo. No início eram sete jogadores em cada equipe (14 no total). Mais tarde e com as novas formulações, esse número foi reduzido para cinco para cada lado.

A bola, no início, era leve e era comum, por isso, voar para longe da quadra. Isso fez com que a regra fosse mudada mais uma vez, para que a bola se tornasse mais pesada, e assim, ganhou o apelido de "esporte da bola pesada''.

O futebol de salão mineiro sempre foi histórico. Um dos primeiros clubes foi o "Viajantes", que hoje é o Clube Recreativo Mineiro, por isso, lá será o encontro. Entre os fundadores da Federação Mineira de Futebol de Salão estão também o Villa Nova (Nova Lima), Atlético e Olympico.

No ano de 1989, quando a Fifa assumiu o esporte, as regras sofreram grande mudança. O lateral, antes batido com as mãos, passou a ser cobrado com os pés. A bola somente pode ser recuada para o goleiro uma vez, ao invés de três como antes. O goleiro pode lançar a bola por sobre a linha de meio de campo, o que antes não era permitido, pois a bola tinha de tocar, primeiro, a quadra defensiva.

Destaques mineiros

Não foram poucos os destaques do futebol de salão e futsal mineiros. Como por exemplo, os primeiros campeões mundiais, em 1982, Walmir, Paulinho Bonfim e Jackson (autor do gol do título, 1 a 0 contra o Paraguai). Os três eram do Olympico.

Além deles, tem como destaque um treinador, Takão, que comandou o Brasil na conquista de dois títulos mundiais com a Seleção Brasileira, em Hong Kong'1992 e Espanha'1996.

Ainda como destaque, o ex-presidente do América Mineiro, hoje diretor de futebol do clube, Marcos Salum, que foi campeão brasileiro de futsal (na época futebol de salão), em 1974, na final disputada em Niterói. Aliás, todos os 12 jogadores dessa conquista estarão presentes.

Dessa Seleção Mineira, o técnico já é falecido, Marcos Pinto Coelho, que era do Olympico Club, daqui de BH e um dos auxiliares técnicos era justamente o Takão, então técnico do Arsenal, também de BH e o outro, César Rato, técnico da AABB local.

Os jogadores eram: goleiros - Toninho, Marcos Salim e Vitor Boribe; beques - ênio e Walmir; alas-direito - Paulinho Bonfim e Jairinho; alas-esquerdo - Mário Neves e Marquinho; pivôs - Paulo Luciano, Luiz Fernando e Caju.

O pivô dessa seleção era um jogador de Uberaba, Paulo Luciano, que veio ser meio-campo do Cruzeiro, nos anos 80.

Em 1983, Minas Gerais conquistou o título de campeão brasileiro na categoria adulto. A competição foi disputada em Belo Horizonte, no Ginásio Poliesportivo Jornalista Felippe Drummond, o Mineirinho. Na final, a vitória por 2 a 0 sobre o Paraná, com gols de Paulinho Bonfim e Jackson.

A Seleção era comandada pelo técnico Ari, na época do juvenil do Atlético. Ele contou com os goleiros Toninho, Nando e Amadeu; os beques eram Aladim e Paulo Borges; os alas direito, Paulinho Bonfim e Gera; na ala esquerda, Jackson e Júnior. Os pivôs, Adriano e Marcelinho Xexéu.

Dos campeões mundiais de futsal e bicampeões da Liga Nacional de Futsal pelo Atlético, cinco estarão presentes, os cinco mineiros, os goleiros Digo e Renato, os beques Ronaldo, Pi e Véio.

Além deles, jogadores que fizeram história, como João Mansur, Aurinho, Cláudio Loro, Cláudio Mello, Marquinho Xipanga. Valfrido, Fanta, Faissal, Mateus, este, aliás, foi o camisa 10 do América durante anos, no futebol de campo.

A prática do esporte reduziu drasticamente em Minas Gerais. Para se ter uma idéia, somente em Belo Horizonte havia 17 clubes: Olympico, Arsenal, Barroca, AABB, Atlético, Recreativo, Floresta, Cruzeiro, Comercial, Oásis, Orion, Palmeiras, Pinheiros, Rio Casca, Sparta, América Suburbano e São Lucas.

Além disso, três equipes do interior disputavam o Campeonato Metropolitano, cujos jogos aconteciam, sempre, às terças e quintas, com dois ginásios exclusivos, Olympico e Sparta, isso, nas categorias juvenil e adulto. Eram sempre oito jogos em cada um desses dias, quatro de juvenis e quatro adultos. Esses clubes eram o Huracán (Sete Lagoas), Milionários (Congonhas) e Estrela do Oeste (Divinópolis).

Compartilhe