Gustavo Nolasco
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DA ARQUIBANCADA

Como começou a Tríplice Coroa

A genialidade do elenco nasceu de um 'não' duro e um 'talvez' desconfiado, numa reunião secreta, em meados de 2002

postado em 21/11/2018 08:00 / atualizado em 21/11/2018 00:16

Jorge Gontijo/Estado de Minas - 17/09/2003
As oferendas e pedidos do réveillon de 2003 ainda boiavam nas ondas do mar quando o telefone do centroavante Deivid tocou insistentemente. No outro lado da linha, um sotaque carioca e o linguajar boleiro não deixaram dúvidas: era o admirado técnico Vanderlei Luxemburgo. O comandante do Cruzeiro foi direto. Estava montando uma máquina para a temporada e lhe faltava um homem-gol. O “sim” de Deivid veio após poucos minutos, motivado por uma frase certeira do profeXor: “o Luxemburgo me ligou e disse que eles não iriam montar time para ficar disputando contra Atlético Mineiro. O Cruzeiro queria ser campeão de tudo”.

O final dessa trama, todo amante do futebol no Brasil conhece. O Time do Povo não só foi o Campeão de Tudo naquele certame, como também colou ao peito, junto às cinco estrelas, a primeira e – até hoje – única Tríplice Coroa. 

Tão bonito quanto o the end, foi o início deste filme inesquecível para qualquer cruzeirense, apesar de pouco conhecido. E ele não começou com Deivid e nem mesmo em 2003.  A montagem da squadra azurra da Tríplice foi uma epopeia digna de uma partida de xadrez e teve seu capítulo inicial em 13 de agosto de 2002. Naquele dia, o então vice-presidente Alvimar Perrella foi a São Paulo e sacramentou a vinda de Vanderlei Luxemburgo. 

Se Alex e Cia entraram para o imaginário da torcida como os atores da maior temporada da história do Cruzeiro, Luxemburgo foi o estrategista, o pensador, o roteirista desta obra-prima. A Tríplice Coroa foi consequência da obsessão do comandante em formar um elenco extraordinário, mantê-lo motivado durante todo ano (e título após título) e de forma sagaz, prever quem seria o maior rival na temporada de 2003 e desarticulá-lo antecipadamente. No caso, o Santos. 

A genialidade do elenco nasceu de um “não” duro e um “talvez” desconfiado, numa reunião secreta, em meados de 2002. Ali, Luxa e Alvimar discutiam a formação do elenco. De supetão, o treinador pediu a volta de dois jogadores altamente contestados pela torcida. Primeiro, Rincón. O cartola quase caiu para trás ao ouvir aquele nome e foi taxativo: esse nunca mais vestirá a camisa do Cruzeiro. Veio o segundo, Alex. A princípio, disse o “talvez”, que logo se transformou em “sim”, após Luxemburgo prometer descontar do seu próprio salário os vencimentos do camisa 10 se ele repetisse a passagem apagada de 2001. 

Restava convencer o próprio Alex, que, além de magoado com a diretoria cruzeirense, já estava com tudo acertado para defender as cores do Grêmio.

Novamente, o telefone, o sotaque carioca, o linguajar boleiro e uma frase certeira... Alex disse “sim” e voltou ao Cruzeiro para ser o maestro, o gênio que liderou a mudança de rumo na história do Cruzeiro depois de ouvir do profeXor: “Venha, vou te fazer o melhor jogador do Brasil”. Dia 8 de agosto de 2002, “O Talento” era nosso. 

Com uma base excelente, o Cruzeiro de Alex fechou aquela temporada a poucos gols de se classificar para a Libertadores. Já estavam ali Cris, Luisão, Leandro, Augusto Recife, Wendel e o gigante Gomes, aposta pessoal do treinador. Com a virada do ano, vieram três medalhões: Deivid, Aristizábal e Maldonado. 

Com a espinha dorsal desenhada, Luxemburgo lançou-se a escrever as cenas mais secretas de seu roteiro. A sequência para minar o seu oponente Santos. Sabia ele, Maurinho era as brânquias do Peixe. O primeiro passo deveria ser tirá-lo de lá. Feito!

O segundo ato deveria ser cirúrgico para evitar que o time santista resolvesse seu grave problema da “camisa 9”. Quando Luxemburgo soube da ida de Márcio Nobre para a Vila Belmiro, telefone, sotaque, linguajar e frase...O centroavante, que deveria desembarcar em São Paulo, misteriosamente, descia em Belo Horizonte.

Começou! Campeonato Mineiro, Copa do Brasil, vaga na Libertadores 2004 garantida. A cada saída de jogador, Alvimar buscava um substituto. O Santos realmente se provava o rival da máquina azul naquela temporada. O filme caminhava para um previsível final feliz, mas quando se tem um roteirista genial, a obra tende a se tornar um clássico jamais imaginado.

Alex e seus companheiros de esquadrão sabiam ser o Campeonato Brasileiro o sonho da Nação Azul. Motivados pelo comandante estrategista, os astros do gramado foram buscá-lo. No dia 30 de novembro de 2003, num Mineirão transformado em sala de cinema, a plateia aplaudiu de pé o final da Tríplice Coroa. Uma obra-prima escrita, de forma genial, um ano e meio antes pelo incrível roteirista Vanderlei Luxemburgo.

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Auremar de Castro / Estado de Minas - 08/06/2003

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