
Ahmed Khamis segura a bandeira palestina antes de Argentina x Croácia, no Catar
Quem a segura se apresenta com nome e sobrenome, mas prefere não ser filmado. Ao lado de uma mulher que também pediu para não aparecer, é mais uma das tantas pessoas que levaram a causa palestina ao centro do debate durante o primeiro Mundial realizado em um território árabe.
Ahmed Khamis diz que foi preso em seu país por protestar. De volta à liberdade, prefere a cautela de não ser filmado, mas aceita gravar entrevista em áudio.
"Nós estamos trazendo a bandeira para a Copa do Catar para enviar uma mensagem para todo o mundo, já que é um evento muito importante. Queremos lembrar às pessoas que não podemos ser esquecidos", diz, em referência ao histórico conflito com Israel, que perdura há quase um século e envolve disputas territoriais, simbólicas e de narrativas.
A Seleção da Palestina foi eliminada na segunda fase das Eliminatórias Asiáticas e não se classificou para a Copa do Mundo do Catar. A bandeira com faixas preta, branca e verde e o triângulo vermelho, no entanto, está presente nos jogos, nos pontos turísticos e nas ruas de Doha.
Em campo, os jogadores de Marrocos exibiram o símbolo nas comemorações de cada vitória. Os marroquinos fizeram história ao se tornar a primeira seleção árabe a chegar à semifinal da Copa do Mundo.
Deixaram pelo caminho adversários poderosos, como Portugal, França e Bélgica, e levaram para o gramado a causa palestina pelas mãos do zagueiro El Yamiq, aquele que quase fez um gol de bicicleta na semifinal.
"Nós todos passamos a torcer para Marrocos, porque é bom para a gente, é bom para os árabes. Eles surpreenderam a todos e mostraram que somos capazes", disse o catari Khalouf, ao dizer que as nações árabes se juntaram não apenas pela causa, mas também pela equipe de futebol.
Os episódios foram muitos ao longo de toda a competição. Durante o jogo entre Tunísia e França, ainda na fase de grupos, um homem invadiu o gramado com a bandeira e foi intensamente aplaudido pelos torcedores.
Nas arquibancadas, a torcida catari exibiu a mensagem "Palestina Livre" na partida contra a Holanda. Uma faixa semelhante apareceu durante Tunísia x Austrália. "Somos a 33ª bandeira da Copa", sintetizou Abdelrahman Mohamed, ao dizer uma frase repetida incansavelmente no Catar.
Algumas manifestações chegaram a causar desconforto em jornalistas israelenses, que relatam terem sido alvos de críticas de árabes durante o trabalho. "Você não é bem-vindo aqui. Este é o Catar, é um país nosso", disse um saudita a um repórter de Israel em um dos vídeos que viralizaram nas redes sociais.
Cenário no futebol
A Fifa proíbe atos políticos nos estádios, mas não classifica dessa forma os atos pró-Palestina. O governo catari é favorável à causa, o que facilita os protestos. Por outro lado, manifestações favoráveis à causa LGBTQIAP+ foram amplamente combatidas pelas autoridades, assim como a bandeira pré-revolucionária do Irã.
Antes do Mundial, a Fifa, por meio do presidente Gianni Infantino, fez um acordo com governos e autoridades da aviação para que as tensões entre israelenses e palestinos fossem amenizadas durante a competição. "Com este acordo, israelenses e palestinos poderão voar juntos e desfrutar de futebol juntos", disse, em novembro.
"Garantimos com sucesso todas as garantias, incluindo o acesso aos serviços consulares para israelenses durante sua estadia no Catar", pontuou, à época, o diretor-geral do Ministério das Relações Exteriores de Israel, Alon Ushpiz. Antes, o Catar não permitia vistos em passaportes israelenses.
O conflito histórico já tinha causado problemas à Fifa tempos antes. A entidade foi alvo de críticas de israelenses quando substituiu em seu site de vendas de ingressos o nome "Israel" por "Territórios palestinos ocupados".
Não há registros de jogos de futebol entre as duas seleções, que disputam Eliminatórias em confederações distintas. Enquanto a Palestina joga pela Ásia, Israel busca uma vaga na Copa do Mundo via Europa.