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CRUZEIRO

Diretor do Cruzeiro diz que André Cury é persona non grata no clube; agente rebate: 'falta caráter'

Ações de Éderson e David desgastaram relação de clube com agente

Bruno Furtado
Carlos Ferreira Rocha criticou conduta do empresário André Cury com o Cruzeiro - Foto: Roger Dias/Superesportes Expressão originária do latim, ‘Persona non grata significa “pessoa que não é bem-vinda, ou a quem se fazem restrições”. É assim que o Núcleo Dirigente Transitório do Cruzeiro rotula o empresário André Cury, representante, dentre outros, de jogadores que acionaram o clube recentemente na Justiça por falta de pagamentos de salários e outros direitos trabalhistas.



Um dos homens mais influentes no departamento de futebol do Cruzeiro nos últimos anos, tendo intermediado contratações e vendas milionárias, André Cury teve a relação com a nova cúpula desgastada após as ações ajuizadas pelo volante Éderson e pelo atacante David, seus clientes. O pedido de liminar do primeiro foi negado pela Justiça, mas o segundo teve êxito e está livre para acertar com outro clube até que haja uma decisão definitiva.

Segundo Carlos Ferreira Rocha, integrante do Conselho Gestor e interlocutor com o departamento de futebol, Cury está na contramão de uma série de empresários que têm ajudado o clube nesse momento de dificuldade.

“A situação de fragilidade, quando você entra em negociação, você entra em desvantagem. Mas não é verdadeira a afirmação de que todos os empresários estão boicotando o Cruzeiro. Tem empresários sérios, que estão ajudando o clube, o do Rodriguinho, por exemplo (Luís Paulo Santarelli). André Cury, hoje, é considerado no meio do Conselho Gestor uma persona non grata. Não é de hoje que ele vem prejudicando o Cruzeiro em várias negociações. A gente não tem sentimento de amizade com ele nesse momento”, declarou Carlos Ferreira Rocha.



Em entrevista divulgada no site do Cruzeiro, na quinta-feira (23), Saulo Fróes, presidente do Núcleo Dirigente Transitório, já havia informado que o clube romperia relações com empresários “tendenciosos”.

“O que não podemos admitir são agentes que são tendenciosos, que agem por interesse próprio, que procuram os caminhos somente através da Justiça. Nós respeitamos, eles têm todo o direito, mas acreditamos que não é a forma adequada, acreditamos que antes deve se ter um diálogo, para não dar um prejuízo ao clube que não tem necessidade. Estes agentes se esquecem que o Cruzeiro é eterno. Hoje nós estamos em uma situação difícil, mas nós vamos voltar ao topo. Aqueles que nos deram as mãos, nós vamos lembrar, e aqueles que recolheram as mãos, nós também vamos lembrar”, disse.

“A partir de agora, não vamos admitir que estes agentes continuem transitando livremente pelo clube, trazendo jogadores, quando no momento em que o Cruzeiro mais precisou, eles viraram as costas. Não iremos abrir mão da ética, da transparência, da melhor relação. A relação só é boa quando é boa para ambas as partes e aí está sendo somente para uma parte, e isso nós não vamos admitir. Recentemente tivemos os casos de jogadores que, amparados por seus empresários, procuraram a via errada, ao nosso ver, o que só atrapalha a relação. Mas felizmente a maioria dos empresários tem entendido a situação do clube, buscando diálogo em busca das melhores soluções”, reforçou Saulo Fróes ao site do Cruzeiro.

Resposta de Cury

Procurado pelo Superesportes, André Cury se defendeu das acusações e disse que os jogadores não podem trabalhar de graça por conta da situação crítica do Cruzeiro.



“É lamentável a parte que está errada achar que está certa. Como o Carlos sabe, o Cruzeiro não está cumprindo seus compromissos. A mim, eles devem R$ 12 milhões e nunca levei na Justiça. Nem comissão eles pagam. E agora não estão pagando jogador. Ninguém é obrigado a jogar de graça só porque o diretor está com problema. Eles têm é que agir com seriedade, organizar a instituição e parar de jogar para a torcida”, disse Cury.

André Cury é agente influente na Europa e na América do Sul e representa o Barcelona - Foto: Instagram/reprodução

O empresário chegou a declarar que a atual cúpula do Cruzeiro não tem caráter. “Sempre levei dinheiro para o clube com negociações. Fiz várias negociações e levei dinheiro para o clube. Mas fui conversar com eles e eles não reconhecem a dívida que o clube tem comigo. Acham que eu trabalho de graça. O problema do Cruzeiro hoje é que o clube não cumpre seus compromissos. O culpado não é quem não recebe, é quem não paga e não honra com suas obrigações. Existe uma conduta hoje de gente que não é séria, que não tem caráter. Estão fazendo do Cruzeiro um hobby pessoal, mas Cruzeiro é lugar de gente profissional”.

Intermediário na compra e venda de Arrascaeta

André Cury é hoje um dos empresários brasileiros mais influentes na América do Sul e na Europa, a ponto de ser representante do Barcelona. Graças a parcerias com agentes de outros países, ele intermedia diversas negociações de atletas e técnicos estrangeiros que chegam ao Brasil. Foi assim no Cruzeiro, por exemplo, na contratação do meia uruguaio Arrascaeta, em 2015, ao Defensor. Naquele período, o clube tinha Valdir Barbosa e Benecy Queiroz como responsáveis pelo futebol na gestão de Gilvan de Pinho Tavares.



O Cruzeiro investiu à época R$ 12 milhões para ter Arrascaeta (4 milhões de euros). Tempos depois, descobriu-se que o clube também adquiriu, naquela transação, como ‘contrapeso’, o atacante Gonzalo Latorre por R$ 9 milhões (US$ 3,4 milhões). O segundo jogador era vinculado ao Atenas do Uruguai.

Em 9 de julho do ano passado, Valdir Barbosa declarou ao programa Arena 98, da Rádio 98FM, que o pagamento relativo a Latorre serviu para mascarar parte do investimento feito em Arrascaeta. Os dois jogadores tinham direitos ligados ao mesmo empresário uruguaio: Daniel Fonseca.

“Aquilo ali não foi uma compra do Latorre. Seria uma estupidez, aquilo tinha que ir para a guilhotina se alguém tivesse feito. Pagar praticamente a diferença de 200 mil dólares no Latorre para o Arrascaeta seria uma loucura. Isso aí é um troço que… um jogador que tinha tido uma pequena passagem pela Seleção Uruguaia Sub-20 e o outro que já era profissional e sabendo que daria certo. Como deu certo, porque foi a maior venda do Cruzeiro até agora em todos os tempos. Aquilo ali foi uma forma de complementar a compra do Arrascaeta. Envolvia luvas e uma série de coisas. E aquele valor, que não seria pago no Brasil, como você vai pagar lá fora? Você tinha que criar uma fórmula para fazer esse pagamento. E criou-se a fórmula de pagar como se fosse a compra do Latorre. Como o Cruzeiro não pagou, o negócio estourou dessa forma, foi para a Fifa e virou R$ 18 milhões”, revelou Valdir.



De fato, o Cruzeiro pagou ao Atenas, em maio de 2019, incríveis R$ 18,5 milhões pela contratação de Latorre. Uma ação do clube uruguaio na Fifa, com cobrança de juros e correções, mais que dobrou o valor fechado em 2015.

Ouvido pelo Superesportes sobre aquela negociação, Cury se defendeu: “Quem fez aquela negociação foi o Gilvan e o Valdir. Eu apresentei o empresário e o jogador ao Cruzeiro e disse que as condições são essas. E de repente saíram com o acordo com o Latorre, que fui contra. Não sou nada do clube, disse que aquilo estava errado, mas cada um faz o que quer. Eles é que eram os representantes do Cruzeiro. Eu alertei e não concordava”.

Em janeiro de 2019, André Cury também intermediou a venda de Arrascaeta ao Flamengo. A diretoria do Cruzeiro tinha rompido relações com o empresário do jogador, Daniel Fonseca, e usou Cury como interlocutor.



Fiz a maior venda da história do Cruzeiro. Fechei a venda do Arrascaeta e o Cruzeiro recebeu 13 milhões de euros. Isso, hoje, são R$ 65 milhões. Vendi Raniel para o São Paulo, Lucas Romero para o Independiente, jogador que o Cruzeiro trouxe de graça. E o pior é que não reconhecem meu trabalho e não admitem que me devem”, concluiu André Cury.

André Cury intermediou compra e venda de Arrascaeta no Cruzeiro - Foto: Instagram/reprodução

Atletas de Cury

Além de ser representante de David e Éderson, André Cury cuida das carreiras do zagueiro Leo, do meia Maurício, do atacante Sassá - emprestado ao Curitiba - e de outros garotos das categorias de base.

A permanência do volante Rômulo na Toca, vindo do Desportivo Brasil juntamente com Éderson e Maurício, deve-se, segundo Carlos Ferreira Rocha, ao fato de ele também ser agenciado por André Cury.



“O Rômulo é grande jogador, eu recebi, em que pese não ter acompanhado a carreira na base, tive boas informações, vi material, excelente jogador, querido por todos. Acredito que essa possibilidade (de ficar)...é complicado fazer afirmativa com relação...porque cria expectativa na torcida  quando fala de jogador que interessado ao cruzeiro. Vamos ter conversa com agentes dele, tivemos reunião que avançou bastante, mas existem pendências de agentes dele, que são persona non grata no Cruzeiro, que impede que se concretize isso. Mas a gente prima pelo diálogo, pelo consenso, pelo bom senso, mas tudo será resolvido da melhor forma”, disse.