
Fabiana, que conversou também com as companheiras de equipe, com o técnico Talmo, os integrantes da comissão técnica e dirigentes do Sesi, lembrou que voltar à capital mineira para iniciar um procedimento jurídico e depois ter de prestar depoimento seria complicado diante da rotina de viagens e jogos. A jogadora acredita que não deveria ser criado um transtorno extra para as vítimas do racismo.
Ontem, os pais da jogadora falaram sobre o assunto. Vital estava no ginásio e conta que não viu o instante em que a filha foi ofendida, pois tinha saído para ir ao banheiro. “Quando voltei foi que os familiares da Suellen, a líbero do Sesi, me contaram. Fiquei abismado, pois nunca havia acontecido nada igual em lugar nenhum do mundo.”
A mãe, Maria do Carmo, conta que não percebeu o que estava acontecendo. Só quando lhe contaram. “Vi três pessoas se levantarem e se dirigirem ao homem que estava xingando. Eles defendiam a Fabiana. Nunca poderia esperar isso. Eu falei para a Fabiana que achava que ela não deveria seguir com isso, dar queixa, pois iria complicar muito a vida dela.” Os dois não têm dúvidas de que o homem identificado como Jefferson Gonçalves de Oliveira estava embriagado. “Isso era notado facilmente, pois ele não conseguia se manter de pé direito”, diz Vital.

CBV
A Confederação Brasileira de Vôlei (CBV), entidade que comanda o esporte no Brasil, divulgou nota ontem se solidarizando com a atleta e sua família. “A Confederação Brasileira de Voleibol (CBV) se solidariza e declara total apoio à central do Sesi e capitã da Seleção Brasileira, Fabiana Claudino, vítima de um episódio lamentável, na última terça-feira (27/1), quando foi insultada com injúrias raciais durante o jogo na Arena JK, em Belo Horizonte. O clube minas-tenista tomou as medidas cabíveis, retirando o agressor do ginásio na mesma hora, e a jogadora declarou que tomará as devidas providências. Diante de tal fato, a CBV repudia o ato de racismo, presta total solidariedade à atleta Fabiana e declara que espera não presenciar mais esse tipo de situação.”
A entidade explica ainda que, pelo fato de não ter sido registrado o fato na súmula pelos árbitros da partida, não há como a entidade tomar qualquer providência com relação ao caso.
Mensagens de solidariedade
A revolta pôde ser sentida não só pelas demais jogadoras da Superliga, mas também pelos homens desse esporte, principalmente os que são afrodescendentes. Um deles, o ex-jogador Pelé, tricampeão com o Minas em 1984-85-86, hoje vereador em Belo Horizonte pelo PTdoB.
Pelé conta que estava no ginásio e viu uma confusão na parte de cima da arquibancada, mas não podia imagina que seria um ato de racismo, principalmente contra Fabiana. “Acho um absurdo e repudio isso, principalmente por ter acontecido no Minas, um clube que me acolheu, como a Hilma e que foi quem lançou Fabiana ao estrelato. Fui o primeiro negro a jogar no Minas e nunca aconteceu nada nesse sentido, pelo contrário. Sempre foram respeitosos comigo. Isso aconteceu, sim, em outros ginásios, em outros lugares, quando íamos jogar uma partida do então Campeonato Brasileiro e nas decisões. Mas aqui, nunca. Nos dias de hoje, principalmente, isso é inaceitável”, diz o ex-jogador.
O medalhista de prata olímpico Samuel, amigo de Fabiana, entende que “esse é um fato lamentável, que deixa a todos tristes”. Para ele, uma grande injustiça. “A Fabiana é uma pessoa íntegra, por isso se tornou a capitã da Seleção Brasileira. Isso não foi à toa. Por ser negro, também estou revoltado. Fico doido com essas questões de racismo.”
O cubano Escobar, destaque do MTC na Superliga, conta que presenciou tudo. “É um ato muito feio. O mundo está lutando contra o racismo, contra atitudes como aquela. Ele tem de ser punido, severamente punido. Nunca tinha visto isso.”
O técnico Nery Tambeiro, do vôlei masculino do Minas, também repudia o acontecido. “Esse acontecimento não reflete o que é a torcida do Minas. Esse cara não faz parte do esporte, do vôlei, do que é o clube e sua torcida. Aqui as pessoas vêm para incentivar. O que ele fez manchou o evento.”
Também os jogadores de outras equipes, como o oposto Juninho, do São José-SP, lamentaram o fato. “Isso é inaceitável. Não deveria se repetir. Já tivemos outros casos de racismo. Me surpreendeu muito por ter acontecido aqui, no Minas, em Belo Horizonte. É sempre uma torcida civilizada, que sabe receber o adversário. Foi uma falta de respeito e acho certo se manifestar contra o ocorrido. É dever de todos.”
...Meninas voltam à quadra
As equipes mineiras voltam à quadra hoje, em mais uma rodada do returno da Superliga Feminina. Às 19h, o Minas, que vem de quatro importantes vitórias (Praia, Pinheiros, Osasco e Sesi) encara o líder, Rio, comandado por Bernardinho. A equipe do técnico Marcos Queiroga está a três pontos do Praia, o quarto colocado. O time do Triângulo recebe, em Uberlândia, o Brasília, às 21h30 (Sportv).