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ENTREVISTA EXCLUSIVA

Marcelo Oliveira: "Quero estar aqui até dezembro, fazendo um grande trabalho"

Treinador do Cruzeiro não foge de perguntas, e fala sobre sua polêmica chegada ao clube, formação do grupo, aproveitamento da categoria de base e sua saída do Galo

postado em 24/02/2013 08:07 / atualizado em 24/02/2013 18:21

Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press

Em pouco mais de uma semana, Marcelo Oliveira completará 58 anos. A maioria dos profissionais, ao atingir essa idade, pensaria em aposentadoria, mas para o técnico do Cruzeiro o momento é de ascensão, de buscar o ápice, mirar o cume. Para isso, nada melhor que levar a equipe de volta ao caminho de títulos, que escassearam na Toca da Raposa II. Em conversa de cerca de 45 minutos com o Estado de Minas, na semana passada, ele falou, entre outras coisas, do desafio de trabalhar no clube, de seus conceitos no futebol, da saída do Atlético e do desejo de fazer história com a camisa azul.



O quanto a vitória no clássico ajudou a acabar com a resistência que havia a seu nome no Cruzeiro?

Embora tenha dito que era início de trabalho, que uma vitória não ia determinar a melhor temporada, não há como negar que uma vitória fortalece, gera confiança, principalmente quando não vem por acaso. Foi uma vitória muito consistente, que marcou o início de trabalho e deu uma perspectiva positiva. Como o Cruzeiro não obteve sucesso nas duas últimas temporadas, o resultado renovou a esperança dos torcedores. Mas foi apenas o início.

Entre seu nome ter sido cogitado e o anúncio oficial, a diretoria chegou a fazer contato com outros treinadores. Houve chance de sua contratação ser desfeita?

Procurei ficar alheio, não dei entrevistas, até porque tinha um profissional aqui, o Cruzeiro ainda disputava vaga na Sul-Americana, lutava para fugir daquele grupo lá de baixo. Achei normal que se cogitassem outros nomes, até porque não tinha nada assinado.

Você chegou a questionar se estava fazendo a escolha certa?

Analisei de forma muito tranquila e vi que em um período muito recente, profissionais como Vanderlei Luxemburgo, que teve a contratação pelo Grêmio contestada, o próprio Cuca quando chegou ao Atlético sofreu resistência. Entendi que era uma parte menor da torcida. Os torcedores que já conheciam o meu caráter, meu profissionalismo, meu trabalho, me mandaram mensagens positivas. Não podia recuar.

Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
Você está começando o trabalho e precisa de tempo para colher frutos. O que será um grande resultado este ano?

Seria o ideal pensar em um trabalho a médio e longo prazo, mas sei que no futebol não é assim. Penso que, das quatro competições que podemos ter, se ganharmos duas, principalmente uma nacional, com vaga na Libertadores, na qual o Cruzeiro tem um histórico muito grande, seria muito bom para este ano.

Dos garotos que estão trabalhando com você, qual está pronto para ser titular?

No Brasil só se valoriza o titular. Penso diferente. Se subimos quatro ou cinco e já tínhamos dois, é um ganho imenso. Temos sete da base, contando os goleiros, e todos estão concorrendo para ser titulares. A concorrência é difícil, pois entendemos que também era necessário contratar para termos um grupo forte, mas nos jogos-treinos e nos oficiais, eles estão tendo chances. Desde a primeira conversa procurei passar o privilégio que é estar no Cruzeiro, clube de tradição, com grande torcida, estrutura, que paga em dia, ou seja, não tem motivação melhor.

Além das partes técnica, tática e física, você também tem preocupação com o lado psicológico dos garotos?

Orientar é um dos trabalhos do treinador, até porque minha escola é a de Telê Santana. Passei mais tempo da minha adolescência e juventude com ele do que com minha família. Ele sempre se preocupava com a formação do homem, não só do jogador. Então, procuro dar toques coletivamente e também em conversas individuais. Esta geração do Cruzeiro, além de boa tecnicamente, tem meninos de cabeça boa.



Como você vai fazer o Diego Souza render o que pode?

Quando eu estava no Vasco, falamos bastante sobre ele. Já jogou solto como atacante, já jogou pelo lado esquerdo, fazendo boas arrancadas, mas a maior parte do tempo foi quase um segundo atacante, um armador de chegada. É dessa forma que, em princípio, estamos trabalhando com ele. Queremos usar todo o potencial técnico dele. Tive uma conversa com ele alertando para o fato de a Seleção Brasileira ter trocado de treinador, o que abriu uma oportunidade muito grande para quem não vinha tendo chances. Ele tem de pensar grande, tendo uma ambição maior, que é a Seleção.

A história mostra que, desde 1991, treinador de Cruzeiro ou Atlético que não ganha o Mineiro não termina o ano no cargo. Você pensa nisso?

Como qualquer profissional, penso sempre positivamente. Trabalho de forma leal. Então, penso que vamos ganhar o Mineiro e passo esse sentimento aos jogadores. Se estiver preocupado se vou ficar, não passarei coisas boas para os atletas.

O Cruzeiro foi um dos times que mais se reforçaram em 2013. Foi um pedido seu ou a diretoria já tinha essa intenção? E precisa de mais peças, especialmente para a zaga? Ou você está satisfeito?


Houve indicações minhas e havia uma lista do Cruzeiro. Ainda houve chance de trazer jogadores, dois ou três, de bom nível. Houve sondagens ao Dedé, Lugano e Lúcio, mas não foi possível. Estou satisfeito, mas um grande clube nunca está fechado a um grande jogador.

Ter 35 jogadores no grupo não é muito? E a adaptação dos jogadores ao esquema?

Se você tem a possibilidade de ter um pouco mais, tem mais chance de trazer jogador do júnior. No final do ano vamos ver que todo mundo acabou jogando. São quatro competições difíceis. O treinador tem de moldar o esquema de acordo com os jogadores. Não adianta trazer um esquema que deu certo em outro clube e não ter jogadores para aquelas funções.

Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
Mas o Cruzeiro tem lembrado a forma de jogar do Coritiba…


Sim, acho que essa forma preenche bem o campo. Você ataca com muitos jogadores e pode defender com sete ou oito. Mas é uma coincidência. Qualquer esquema pode ser bom, desde que o jogador cumpra bem a função.

Quando você saiu do Atlético, o presidente Alexandre Kalil afirmou que queria um técnico que ele não precisasse ir ao CT. O que mudou na sua carreira de lá para cá?

Acompanhei a distância e, mesmo depois que saí, ele ia direto ao CT (risos). Achei que naquele momento fizemos bom trabalho, mas ao mesmo tempo entendi como opção profissional. Ele teria que dizer alguma coisa, houve uma enquete e minha aprovação era de 74%. Mas não trago mágoa, muito pelo contrário, tem acontecido tantas coisas boas na minha vida que vejo que foi a grande chance de me posicionar no mercado.

Você não costuma falar palavrões em treino ou jogo. É difícil ser respeitado no futebol com esse comportamento?


Não, o respeito não passa pelo grito. Passa pelo exemplo, pela conscientização, pela fala, pela justiça, pela coerência, embora não tenha nada contra as pessoas que gritam mais.

Quais seus objetivos pessoais na profissão? Almeja a Seleção?

Fazer grandes trabalhos, ter cada vez mais condições de trabalhar bem. Meu grande sonho é o Cruzeiro do momento. Não tenho um projeto, coisas muito distantes, quero estar aqui até dezembro, fazendo um grande trabalho, se possível permanecendo e modificando, agregando. Trabalhar sempre em grandes clubes, com condição de trabalho, e conquistar.

Uma das vozes ilustres que saíram em sua defesa foi o Dirceu Lopes. Como foi receber esse incentivo?

Fiquei muito feliz não só de saber disso, mas também de ver, na minha apresentação, Dirceu, Piazza e Evaldo. Posteriormente vieram Raul, Zé Carlos. São amigos, mas a presença deles como ídolos do clube me deu a chance de tê-los como exemplo para os jogadores, de ídolos que doaram tudo pelo clube e deixaram a porta aberta. Fortaleceu muito saber que eles acreditam no meu trabalho. Uma coisa é ser amigo e outra é acreditar no trabalho. Minas tem esse poder, gerou Joãozinho, Reinaldo, Éder, Nelinho, Luizinho, Piazza. Tostão nem se fala.

O Telê Santana foi importante para sua formação no futebol. Hoje como treinador, tem alguém que seja sua referência?


No aspecto de inovação, alguém que esteja mostrando algo diferente, tem o Barcelona, que joga daquela forma interessante. Grosso modo, tive como referência o Telê na época de atleta, embora tenha trabalhado também com Coutinho, Osvaldo Brandão, mas o Telê era a grande referência, e depois o Levir Culpi, com quem tenho amizade e que acho que é um técnico que tem uma combinação de qualidade muito boa. É exigente, mas camarada e amigo.

Como você se prepara como técnico?

Vejo quase tudo, não só de jogos para pinçar detalhes ou perceber a forma dos times jogarem, mas também de ouvir entrevistas, observar futebol internacional, que sempre podemos fazer alguma adaptação. Especificamente no Cruzeiro a gente faz um monitoramente de jogos dos nossos adversários. A cada jogo o atleta tem todo o material de quem que vai enfrentar.