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"Posso ser o camisa 10 que o Vanderlei procura"

Armador lamenta poucas chances com ex-técnico e diz que gostaria de permanecer na Toca

postado em 14/07/2015 11:00 / atualizado em 14/07/2015 11:20

AFP PHOTO / Douglas MAGNO
Ele foi apresentado à torcida saindo de um carro-forte no gramado do Mineirão. Dono do maior salário do clube, não custou um centavo, porque era dono dos direitos econômicos quando o ex-diretor de futebol Alexandre Mattos o procurou em Málaga, dizendo-lhe que seria a cereja do bolo de um projeto de um time vencedor. Sem conseguir ser titular, cobrou do dirigente que jamais ocorrera de ficar tanto tempo no banco. Sobraram críticas para o então técnico Marcelo Oliveira, pelo que entende serem critérios diferentes. Com os olhos marejados ao dizer que dinheiro não é o mais importante, Júlio Baptista diz que gostaria de fazer novo contrato até dezembro, para sair do Cruzeiro pela mesma porta que entrou: a da frente.

Você foi apresentado como grande nome de um projeto que acabou vencedor, mas pouco jogou. Por quê?
Acho que na vida há sempre o lado positivo. Consegui ser bicampeão brasileiro, embora não tenha jogado tanto como gostaria, mas acho que fui participativo nessas conquistas. Hoje vivemos outro momento, de reformulação, com um grande técnico, o Vanderlei Luxemburgo. Sofri uma lesão, operei o joelho e hoje só penso na minha recuperação. Quero ficar mais seis meses e tenho a certeza de que posso ajudar. Tenho uma história e um potencial muito grande. Com o técnico anterior, não tive as chances que merecia.

Como assim?
Ele era uma pessoa que não olhava nos olhos, usava dois pesos e duas medidas. Nunca recebi um dirigente na minha casa até receber o Alexandre Mattos, pelo projeto que tinha para mim. Mas no clube foi tudo diferente do que ele falou. O que Marcelo fez comigo foi palhaçada. Ele não é um cara honesto, conseguiu brigar até com o Tinga, o cara mais tranquilo que conheci. Com Dagoberto, com Souza e com muitos outros atletas. Ele me escalava no segundo tempo de um jogo, eu entrava bem, fazia gols e no jogo seguinte era reserva. Nem sequer me olhava nos olhos ou me dizia os motivos de eu não ser titular. Aguentei calado muito tempo, mas não era esse o projeto que o Alexandre me prometeu.

Você ganha um grande salário (mais de R$ 1 milhão mensal, incluindo direitos de imagem). Aceitaria reduzi-lo para permanecer no Cruzeiro?
Não ganho tanto quanto dizem. Mas dinheiro é o que menos importa. Quero me recuperar da cirurgia no joelho – acho que em um mês terei condições de voltar – e dar continuidade aqui no Cruzeiro por mais seis meses. Não tenho o menor problema em reduzir o salário, mas é preciso que me chamem para conversar.

Por que não procurar o presidente Gilvan de Pinho Tavares ou o Vanderlei Luxemburgo?
Estou aberto à conversa e quero sim me recuperar e ajudar o Cruzeiro nesta temporada. Peguem meu histórico e verão que nos jogos em que comecei jogando não perdemos nenhum. Ainda posso ser muito útil e, se me chamarem para conversar, chegaremos a bom termo. Gostaria que partisse deles. Mas não vejo problema em conversar. Quando se olha nos olhos, tudo fica mais fácil.

Você chegou a ser ofendido por torcedores?
Sim. Ouvi coisas que não gostaria e fiquei calado. O torcedor não sabe que a gente quer sempre ganhar, que somos seres humanos (os olhos se enchem de lágrimas), que dinheiro não é tudo. Sempre justifiquei meus salários com atuações convincentes, mas o torcedor não sabe o que acontece nos bastidores. O ex-técnico foi o principal responsável pelo fato de eu não atuar. Respeito sempre quem joga, mas sempre tive futebol para ser titular do Cruzeiro e provei isso nas vezes em que entrei. Na Europa, você é titular por números. Peguem meus números e vejam o que fiz. Tinha números para ser titular, mas Marcelo não pensava assim. Fiquei muito chateado, porque era a peça mais importante do projeto do Alexandre Mattos. Fui acostumado à seriedade e todos os projetos a que me propus foram importantes e funcionaram. Aqui no Cruzeiro, não aconteceu. Em dois anos, tive poucas oportunidades de ser titular. Não fui respeitado como deveria. No jogo da minha estreia, contra o Flamengo, fiquei no banco. Vim como principal jogador e na estreia não me puseram como titular. Cobrei isso do técnico e nunca tive resposta. Mas com outros atletas tinha outro comportamento. Dagoberto saía do banco, entrava, jogava bem e era titular no jogo seguinte. Eu não. A verdade é que o Marcelo não me queria e o próprio Alexandre me disse isso. Vim contra a vontade dele. O Marcelo fazia tudo para me queimar com a torcida.

Você trabalhou com Luxemburgo no Real Madrid. Acha que pode ser o camisa 10 que ele procura?
Claro! Mas no momento o mais importante é me recuperar da cirurgia no joelho. Acho que em um mês estarei pronto. Se o Vanderlei quiser, posso ser esse 10. Nunca me escondi da responsabilidade. Como o maior salário do clube, sei que minha carga é maior, mas para isso precisava jogar. No banco de reservas, não poderia resolver nada. Fiquei chateado algumas vezes, fui xingado por torcedores na minha cara, sem ser titular e poder provar meu valor. Estive inteiro por dois anos, mas não tive a chance de que precisava. Nunca fui titular do Cruzeiro.

Você recebeu outras propostas?
Tive, mas me preocupei somente em recuperar meu joelho. Joguei com dor por muito tempo, sou um ser humano e dentro das quatro linhas tenho de ser cobrado. Em dezembro, quando vi que o técnico não me queria, resolvi operar e me recuperar. Tenho 33 anos, um físico privilegiado e sempre me cuidei. Tenho muito futebol pela frente. Gostaria muito de jogar mais seis meses no Cruzeiro e mostrar ao torcedor que sou útil e gosto do clube.

Você acha que está em débito com o Cruzeiro?
Alguns vão achar que estou, pelo fato de não ter jogado. Vou achar que o Cruzeiro está em débito comigo, porque o ex-técnico não me deixava jogar. No fim vai dar 0 a 0. Mas quero jogar e sair pela porta da frente, como fiz em toda a minha carreira. Gosto do clube, dos companheiros, estou adaptado e seria muito melhor ficar aqui. Mas sou profissional e vou trabalhar onde me querem. Peguem meus números, repito, e verão que nas poucas vezes em que joguei os 90 minutos, nunca perdi.

O país vive momento de crise. Você não acha o salário de vocês fora da realidade?
As pessoas falam que jogador ganha muito, mas somos os que menos ganhamos diante do dinheiro que gira no futebol. E somente 5% dos atletas têm salários diferenciados. A maioria ganha pouco. Mas a carga que temos também é grande. A responsabilidade dos grandes jogadores é alta, sofremos muito também. Você acha que é fácil ouvir de um torcedor que você é 'chinelinho'? E os atletas do basquete, que faturam US$ 45 milhões por temporada? E os pilotos da Fórmula 1? Vivemos num país pobre, mas não temos culpa de ter vencido. O erro não é de quem trabalha corretamente e ganha bem, e sim dos dirigentes do país. Ainda não tivemos um presidente capaz de diminuir essa diferença social e econômica. Somos malvistos por ganhar muito.

Como vê a situação do país?
Não gosto de falar de política, mas todos estamos vivendo um momento de muita crise. Posso dizer que morei 11 anos fora do Brasil, em vários países, e você vê que eles funcionam. Aqui nada funciona, pagamos imposto sobre imposto e não temos nada. A gente paga até para respirar. Tenho esperança de dias melhores, mas não sei se nossos filhos viverão isso. Vejo muita gente indo embora para estudar fora. Tomara que tragam para cá o que há de melhor lá, pois é inadmissível vivermos desse jeito. Não existe nada sem educação, saúde e segurança. Sem isso, só andaremos para trás.

Você vem de uma geração de grandes jogadores. A safra atual é péssima. Por quê?
A minha safra era muito boa e a que veio antes de mim, melhor ainda. Roberto Carlos, Ronaldo e por aí afora. Acho que é preciso investir nas divisões de base. Fui formado no São Paulo, que sempre priorizou sua garotada.