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Especial

Estrela trágica

Pinta de galã, Heleno de Freitas era sucesso dentro e fora dos gramados

postado em 05/02/2012 07:00 / atualizado em 10/02/2012 18:57



Renan Damasceno
- Estado de Minas
Fotos de Alexandre Guzanshe
Enviados especiais a Barbacena, Rio e São João Nepomuceno

Acervo Estado de Minas /  O Cruzeiro
Em frente ao espelho, o cabelo liso e preto era cuidadosamente penteado da esquerda para a direita e fixado com gomalina. O terno de casimira inglesa, cortado pelo alfaiate De Cicco, o mesmo do presidente Getúlio Vargas, bem alinhado no corpo. Relógio Cartier no pulso, perfume francês e uma última olhada no espelho antes de pegar a chave do Cadillac. Se na mitologia grega, Helena, filha de Zeus e de Leda, era a mais bela e desejada do mundo, no Rio, na década de 1940, tal posto entre os homens pertencia a um Heleno.

Essa é a história de Heleno de Freitas, um dos maiores centroavantes do futebol brasileiro, nascido em São João Nepomuceno, Zona da Mata mineira, que em apenas 39 anos foi do céu ao inferno, da glória ao hospício em Barbacena, onde morreu em 8 de novembro de 1959, depois de quase cinco anos de internação, vítima de paralisia geral progressiva, a terceira e devastadora fase da sífilis.

Por sete anos (1940-1947), foi a estrela solitária do Botafogo – e lá mandava e desmandava. Irritava-se ao receber um passe errado, maltratava companheiros e derrubava técnicos. Nunca se sabia se Heleno resolveria um jogo com gol no último minuto ou brigaria com o árbitro logo no primeiro. O mau gênio lhe rendeu o apelido de Gilda, personagem de Rita Hayworth no sucesso nos cinemas cariocas em 1947.

Acervo Estado de Minas /  O Cruzeiro
Longe dos gramados, porém, era um gentleman. Pé de valsa e cativante, passava as noites no Copacabana Palace, Cassino da Urca ou boate Vogue, acompanhado dos amigos do Clube dos Cafajestes, grupo de bon vivants da alta sociedade. Mas a vida se esvaía com os uísques, lenços de lança-perfume e cigarros Continental. Vendido ao Boca Juniors, voltou para ser campeão no Vasco e, fora da Seleção na Copa de 1950, foi para a Colômbia. Jogou a derradeira partida como profissional pelo América-RJ, na única vez que pisou no Maracanã.

A vida do controverso jogador chega aos cinemas no mês que vem. Na cidade natal será inaugurada no próximo domingo uma estátua de 2,30m do filho ilustre, na data em que ele completaria 92 anos. O Estado de Minas percorreu o caminho de glória e decadência de Heleno. Na pequena cidade natal, de 25 mil habitantes, lembranças do personagem que parava a cidade com seus carrões. No Rio, a história do único filho, Luiz Eduardo de Freitas, de 62 anos. Em Barbacena, detalhes da Casa de Saúde São Sebastião, onde hoje funciona um hotel, que ainda guarda nos corredores e no quarto 25 o desfecho de uma verdadeira tragédia grega.

Veja fotos históricas de Heleno de Freitas em Minas e no Rio

Outras galerias:

A vida de Heleno em Nepomuceno

A vida de Heleno no Rio de Janeiro

A vida de Heleno em Barbacena

LINHA DO TEMPO

Alexandre Guzanshe/EM/D. A Press


GLÓRIA
12/2/1920 Nasce em São João Nepomuceno
1927 É levado pelo irmão Heraldo para treinar no infantil do Mangueira, time da cidade
6/1933 Com a morte do pai, Oscar, muda-se com a família para o Rio. Ela se fixa em Copacabana
4/1935 Jogador do Posto 4 FC, de Neném Prancha, é levado para treinar no Botafogo
12/1936 Com o fechamento do departamento de menores do alvinegro, vai para o Fluminense
10/1939 Retorna ao Botafogo a convite de João Saldanha para o lugar do veterano Carvalho Leite
21/12/1939 Primeira partida como profissional: derrota por 5 a 1 para o San Lorenzo-ARG
28/4/1940 Em sua estreia no Carioca, marca os dois gols da vitória por 2 a 0 sobre o São Cristóvão
1942  Artilheiro do Estadual pela primeira vez: 34 gols em 32 jogos
17/5/1944 Estreia na Seleção Brasileira marcando um gol na vitória por 4 a 0 sobre o Uruguai
1/1945 Vice-campeão do Sul-Americano, no Chile. Chamado para o lugar de Leônidas, forma o quinteto ofensivo com Tesourinha, Zizinho, Jair Rosa Pinto e Ademir
12/1945 Campeão da Copa Roca, com duas vitórias sobre a Argentina (6 a 2 e 3 a 1)
21/12/1946 Forma-se advogado pela Faculdade Nacional de Niterói
28/9/1947 Fica aborrecido ao ser chamado de “Gilda” pela torcida do Fluminense
5/1948 Depois de ser tetra-vice carioca, Botafogo vende Heleno ao Boca Juniors
6/6/1948 Na estreia no Boca, marca duas vezes na vitória por 3 a 0 sobre o Banfield
8/7/1948 Casa-se no Rio com Ilma Miranda Corrêa Lisboa, única esposa
 
DECADÊNCIA
30/4/1949 Reserva no Boca e rejeitado pelo Botafogo, assina com o Vasco
25/5/1949 Expulso na estreia no cruz-maltino, no triunfo por 1 a 0 sobre o Arsenal-ING
18/6/1949 Nasce Luiz Eduardo de Freitas, único filho
12/1949 Pelo “Expresso da Vitória”, conquista o único título carioca
22/12/1949 Fica fora da lista de pré-convocados de Flávio Costa para a Copa do Mundo de 1950
2/1950 Vai para o Atlético de Barranquilla-COL, onde é recebido como estrela
9/1951 Depois de novo fracasso na Colômbia, tem chance no Santos que dura apenas um treino
4/11/1951 Pelo América-RJ, em seu único jogo no Maracanã, é expulso aos 25min do primeiro tempo
1952 É internado pela primeira vez, em uma clínica na Tijuca. Volta para São João Nepomuceno, vivendo aos cuidados do irmão Heraldo
10/1954 Exame na Casa de Saúde Santa Clara, em BH, constata sífilis em grau avançado
19/12/1954 Internado na Casa de Saúde São Sebastião, em Barbacena
8/11/1959 Encontrado morto em seu quarto, quatro anos, 10 meses e 25 dias depois da internação


Alexandre Guzanshe/EM/D. A Press

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