Futebol Nacional
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SONHO FUTEBOL CLUBE

Com a bola no sangue

postado em 13/08/2013 09:16 / atualizado em 13/08/2013 09:26

Ramon Lisboa EM DA PRESS
Itaguara não é longe de BH. Fica a cerca de 100 quilômetros, na Região Metropolitana. Em um único endereço, uma família unida, na fé e na distância, na roda da fortuna pelo mundo da bola. Com marido e filhos jogadores, apaixonados, a dona de casa Maria Aparecida Moura Oliveira, de 38 anos, não teve outra escolha a não ser “empresariar” o filho caçula. Wemerson Kléber de Oliveira, de 10, é craque. Não apenas para a mãe. O atleta mirim é destaque entre as jovens promessas da Escolinha do Flamengo na capital mineira.

De olho em qualificação e oportunidades, mãe e filho, de mãos dadas, deixaram o conforto da casa própria em Itaguara para viver no aperto do aluguel no Barro Preto. O casamento de Maria Aparecida com o ex-jogador Kléber Aparecido de Oliveira, de 45, pai de Wemerson, vai bem. À distância. Longe da empresária também estão os outros filhos do casal. O mais velho, Welbert, de 24, também sonhou com a fama. Saiu de casa aos 13 para tentar a vida. Não deu certo.

“Um dia, Welbert chegou e disse: ‘A máfia do futebol é muito grande, mãe. Vou desisitir’. Nunca mais tocou no assunto. Formou-se em fisioterapia e hoje é perito”, conta. Maria Aparecida, mãe aos 14 anos e casada desde menina, diz que largou tudo em função do desejo de Wemerson. “Se esse é o sonho do filho, uma mãe não deve pensar duas vezes, porque o futebol, o exercício do esporte, também pode livrar uma criança do mundo das drogas, do crime”, avalia.

Wemerson, atacante como a grande maioria de seus iguais na infância, dá pequena mostra do que é capaz nos gramados. Em quadra da Rua Platina, no Bairro Calafate, Região Oeste, o jogador pinta e borda com a bola nos pés. Faz graça com um, com dois, com três e corre para o abraço. A mãe e empresária até tenta disfarçar a parcialidade: “Muita gente fala que ele é bom. Sou suspeita, mas a simplicidade dele e a versatilidade, bem em qualquer posição, são o que mais chama a atenção”.

“Empresária” é nome de pompa para o batidão de Maria Aparecida, de ônibus para baixo e para cima, com a agenda de gente grande do filho, entre treinos e jogos pelas escolinhas do Cruzeiro e do Flamengo. Centavo por centavo na ponta do lápis, a itaguarense inteira as despesas da vida de aperto em BH como diarista. No pouco tempo que sobra, ela se desdobra na faxina por R$ 60. Um batidão sem fim com amistosos às quartas-feiras, sábados, domingos e feriados, nos campinhos “mais distantes e de difícil acesso que se pode imaginar”.

Diante do bloco, da caneta, da câmera da equipe do EM, a empresária desabafa: “No Brasil, futebol é mais negócio do que raça, do que talento… infelizmente. Você luta todos os dias da semana, de sol a sol, para ver seu filho perder espaço para jogadores de famílias de poder e de dinheiro…”. Maria Aparecida sugere que o poder público dê mais atenção aos sonhos de tantas crianças brasileiras. “Um vale-transporte já ia ajudar muito. Vi muita gente desistir por falta de trocados para a lotação”, lamenta.