Futebol Nacional
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Um amor secular

postado em 20/07/2013 08:57

Tiago de Holanda
O torcedor do Galo costuma se dividir entre esperança e descrença, equilibrista em corda bamba. No Campeonato Brasileiro do ano passado, por exemplo, parecia que tudo daria certo. O time foi campeão simbólico do primeiro turno e manteve-se na liderança por 15 rodadas seguidas. De repente, a sorte virou, o rendimento caiu e o título foi tomado pelo Fluminense. E agora, em uma inédita final de Libertadores, será que o troféu escapa? “É claro que ganha! Que pergunta é essa?”, garantiu Leontina Lopes. Depois de alguns instantes, como boa atleticana, desconfiou da própria convicção. “É meio duvidoso, né? Depende do outro time”.

Leontina de Andrade Lopes da Silva mostra a carteira de identidade para que ninguém duvide: nascida em 21 de maio de 1911, ela tem 102 anos, apenas três a menos que o clube que lhe acelera o coração. “Quando me dei por gente, comecei a torcer para o Galo”, conta. Os pais vibravam pelo mesmo time e legaram a paixão aos sete filhos. Leontina também teve sete filhos, mas uma das três mulheres acabou se desviando e torcendo justamente pelo maior rival. Nada que abale o bom humor da matriarca. “Ela está murcha ali porque o Cruzeiro não ganha nada”, disse, provocando a neta Viviane Silva Ribeiro, de 30 anos, filha da “ovelha negra”, aliás, azul-celeste.

A família recorda o dia em que Leontina teve uma rusga com a namorada de um neto. A moça estava feliz da vida porque seu time, o Cruzeiro, tinha vencido o Galo. Imprudente, começou a caçoar da atleticana, que não hesitou. Irritada, foi à cozinha, encheu uma bacia com água e despejou tudo em cima da outra. “Joguei na cabeça dela”, disse, sorrindo. “Não vem gostar do Cruzeiro na minha casa. Aqui não!”, avisou. À parte isso, ela garantiu que não fica nervosa durante os jogos. “Meu filho, sou calma demais”.

Conhecida como Sinhá ou Sinhazinha desde moça, ela sabe de cor o nome de alguns dos jogadores que ganharam 10 dos 13 campeonatos mineiros disputados de 1946 a 1958, pentacampeão entre 1952 e 1956. Lembra-se do goleiro Kafunga, dos zagueiros Murilo e Ramos, do atacante Lero. “Isso é do meu tempo. Foi o melhor time que vi jogar”, elogiou.

Em 2011, ao completar 100 anos, ela recebeu um presente inesquecível. Na sala de imprensa da Cidade do Galo, centro de treinamento do Atlético, o clube organizou uma festinha, com guloseimas e balões. “Menino, fiquei muito agradecida. Comi bem mesmo”, lembrou. Ganhou também uma camisa do time. Agora, ela pede outra prenda: dois ingressos para assistir à partida contra o Olimpia no Mineirão, quarta-feira. “Sozinha não vou. Quero um espaço pra mim e meu filho”, disse, referindo-se ao aposentado Sebastião do Carmo, 74. A dupla não teria condições de acampar nas cercanias da sede do time, no Bairro de Lourdes, como fizeram centenas de torcedores. Os netos até começaram uma campanha no Facebook. Será que Sinhá consegue?