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AUTOMOBILISMO

Piloto na 'vida real' e campeão mundial nos games: conheça Igor Fraga

Jovem, de 20 anos, está em uma categoria de acesso para a Fórmula Indy

postado em 23/11/2018 06:30 / atualizado em 23/11/2018 09:46

Beto Novaes/EM/D.A. Press
De Kanazawa, no Japão, para Ipatinga, no Leste de Minas Gerais e, agora, para o mundo. Essa é a trajetória do piloto Igor Omura Fraga, campeão mundial do FIA Gran Turismo Championship. Aos 20 anos, o brasileiro venceu a competição inaugural do game, organizada pela Federação Internacional de Automobilismo (FIA) e pela fabricante do game Gran Turismo Sport, para PlayStation 4. Após deixar Monte Carlo, em Mônaco, local da grande final do torneio, Igor Fraga desembarcou em Confins na quarta-feira com o valioso troféu de campeão bem protegido em sua bagagem. O Superesportes conversou com o jovem sobre a conquista, suas origens, a carreira no esporte dos “mundos real” e “virtual” e o futuro.

“Fiquei feliz demais, foi meio inacreditável. Na primeira corrida, tinha cometido alguns erros, ia largar na última prova em 10º, com o líder da corrida e da pontuação na pole. Sabia que seria muito difícil e simplesmente tentei dar o meu melhor para recuperar e ganhar. Mas ainda dependia do resultado de outros pilotos. Havia uma TV que estava em livestreaming (ao vivo) e fiquei esperando aparecer a pontuação, para saber se era realmente o campeão. Foi muito surreal”, conta.
 
Foi a primeira edição da competição de e-sport para o Gran Turismo Sport, lançado em outubro de 2017. O evento decisivo contou com 30 jogadores de 15 países. A final foi domingo, quando o ipatinguense levantou o troféu. Igor ainda teve a oportunidade de conhecer o pentacampeão da Fórmula 1 Lewis Hamilton, que marcou presença na final. Ele também estará na festa de encerramento da temporada'2018 da FIA, em 7 de dezembro, em São Petersburgo, na Rússia, ao lado de outras estrelas do automobilismo.

“O Hamilton deu uma palestra antes da final. Foi muito legal, pude até fazer uma pergunta para ele. Foi bem interessante depois ter conversado um pouco com ele, ele me parabenizando. Provavelmente vou encontrá-lo na premiação da FIA em dezembro. Estar nesse meio é muito importante. Se você tem um sonho, é sempre bom estar perto dele”, afirma Igor.
 
Divulgação/FIA
O diferencial de Igor para os outros competidores, além do desempenho que lhe garantiu o título, é que ele também é piloto fora das pistas virtuais. No “mundo real”, Igor foi campeão da Fórmula 3 brasileira na categoria Academy em 2017, assegurando o direito de correr na USF2000, uma das categorias que abrem as portas da Fórmula Indy. Apesar do título no e-sport, ele garante que o sonho é chegar a uma categoria de ponta do automobilismo.
 
“Meu sonho é alcançar o profissional. Ano que vem ainda não tenho nada confirmado, é bem difícil porque os custos são altos e depende muito para definir se vou para uma equipe melhor ou continuar na mesma (Exclusive Autosport), onde estamos conseguindo desenvolver o carro. Acredito que vamos ser competitivos caso eu siga na equipe”, comenta, detalhando seus planos: “Nosso objetivo seria já ter pulado para a Pro Mazda (outra categoria de acesso da Indy), só que isso eleva os custos mais ainda. Meu foco é atingir o topo das categorias de monoposto, seja Fórmula Nippon, que tem no Japão, Fórmula 1, Indy... Chegar a esse nível já me faria um campeão”, disse o piloto de USF2000 da equipe Exclusive Autosport.
Além do Gran Turismo, Igor compete no torneio de e-sport oficial da Fórmula 1. Ele chegou à final em 2017, terminando em 18º lugar entre mais de 60 mil pilotos. Desde maio, também está no time de e-sports da Williams e tem conversas para testar os simuladores da equipe de F-1. Nascido no Japão, Igor se mudou para Ipatinga aos 10 anos, quando já tinha iniciado carreira no automobilismo como piloto de kart. Antes de chegar ao Brasil, foi campeão japonês e asiático.
 
Igor aprendeu a pilotar na vida real quando ganhou o videogame PlayStation 2, aos três anos. Depois, se tornou piloto de kart. Segundo Igor, o videogame veio por uma preocupação dos pais, para que ele aprimorasse no aparelho a noção de acelerar e frear nas pistas reais. Ele afirma que tanto o real quanto o virtual foram se tornando categorias atrativas.
 
Divulgação/FIA
“Os dois vieram como uma brincadeira. Antes até de começar no kart, meu pai comprou um PlayStation 2, um Gran Turismo e um volante gamer para eu ter noção do que ia fazer no real. Era algo mais básico, para brincar e ter noção de acelerador, freio, passar marcha, essas coisas. Cresci fazendo os dois e eventualmente ambos ficaram mais profissionais, vamos dizer. No automobilismo, me dediquei mais, tentando me tornar mais profissional. É bem difícil, desde 2008 no Campeonato Asiático… Era bem sério, começou a ficar muito competitivo, com pressão. E agora, nos últimos dois anos, o e-sports do automobilismo deu esse ‘boom’ tentando pegar o embalo da modalidade. Aí comecei a me dedicar bastante também, não para ser profissional, mas sim como oportunidade da vida real. Já teve alguns GT Academy em que o vencedor acabou como um piloto patrocinado pela Nissan na vida real. Estão aparecendo coisas interessantes, por isso estou dando um gás a mais tentando ir bem no virtual”, finalizou. 

Leia, na íntegra, a entrevista com o piloto Igor Fraga:

Você é japonês ou brasileiro?

Sou considerado brasileiro nascido no Japão. Apesar de também ter sangue japonês, sou brasileiro. Sou da terceira geração do meu avô de parte de mãe, que é japonês mesmo. Meus pais se casaram e resolveram ir para o Japão. Nasci no meio de tudo isso.
 
Como se deu a paixão pela velocidade?
 
A paixão pelo automobilismo veio de geração em geração. Meu avô gostava bastante, ele tinha oficina mecânica em Ipatinga, e meu pai cresceu nesse ambiente. Chegaram a competir de kart uns dois anos em Ipatinga, e meu pai me incentivou muito nesse sentido. Lembro de desde pequeno ter carrinho de brinquedo nas estantes… Então acho que estar próximo desse ambiente fez com que despertasse mais a curiosidade no automobilismo. Isso foi minha primeira paixão.

Quais as diferenças do game para o real?

Há diferenças entre o real e o virtual, mas acaba que você consegue abrir um pouco mais sua mente do que quando stá em um dos mundos só. Quando junta os dois e vivencia isso, começa a aprender, a enxergar uma tangência de forma diferente. Você quer improvisar um pouco, tentar fazer de outra forma para ver se melhora. Nem sempre funciona, mas às vezes você consegue melhorar e tirar coisas que geralmente os outros pilotos não pensam . Então, tem muita coisa que ajuda bastante.

Como você veio para Ipatinga?
 
Comecei a competir no Japão mesmo, na época estava com três para quatro anos. Daí meu pai comprou meu primeiro kart, ele que sempre me motivou. Fui sete vezes campeão japonês, campeão asiático também. Veio uma crise financeira, perdi meus patrocinadores, foi um tempo difícil. A gente sobreviveu, mas tive que ficar um pouco afastado do automobilismo. Aí minha mãe falou para voltarmos para o Brasil, pois eu estava crescendo, chegando à adolescência, e ela queria que eu conhecesse mais a família. Eu já conhecia, mas não tinha aquela ligação. Meu avô da parte de mãe, que é japonês, morava em Ipatinga também, então a família é bem concentrada em Ipatinga.

Arquivo pessoal/Igor Fraga
Qual é seu sonho?

Meu sonho é sim alcançar o profissional. Ano que vem ainda não tenho nada confirmado, é bem difícil porque os custos são altos e depende muito para definir se vou para uma equipe melhor ou continuar na mesma, onde estamos conseguindo desenvolver o carro. Acredito que vamos ser competitivos caso eu siga na equipe. Nosso objetivo seria já ter pulado para a Pro Mazda, só que isso eleva os custos mais ainda. Meu foco é realmente atingir o topo dessas categorias de monoposto, seja Fórmula Nippon, que tem no Japão; Fórmula 1, Indy... Chegar a esse nível, para mim eu já seria um campeão.
 
Você reside em Ipatinga ou fora do país?

Neste ano fiquei meio sem ter lugar de morar. Fui para os Estados Unidos em fevereiro e fiquei até o campeonato terminar. Tive amigos e parentes que abriram as portas, então ficava de favor na casa de um e depois, por causa de corridas, ficava em hotel e voltava. Quem tem me ajudado muito é o Roberto Pupo Moreno, sem ele eu provavelmente não teria ido para os Estados Unidos.
 
Como começaram as duas carreiras?

Os dois vieram como uma brincadeira. Antes até de começar no kart, meu pai comprou um PlayStation 2, um Gran Turismo e um volante gamer para eu ter noção do que ia fazer no real. Era algo mais básico, para brincar e ter noção de acelerador, freio, passar marcha, essas coisas. Cresci fazendo os dois, e eventualmente ambos ficaram mais profissionais, vamos dizer. No automobilismo, me dediquei mais, tentando me tornar mais profissional. É bem difícil, desde 2008 no Campeonato Asiático… Era bem sério, começou a ficar muito competitivo, com pressão. E agora, nos últimos dois anos, o e-sports do automobilismo deu esse ‘boom’ tentando pegar o embalo da modalidade. Aí comecei a me dedicar bastante também, não para ser profissional, mas sim uma oportunidade da vida real. Já houve GT Academy em que o vencedor acabou como um piloto patrocinado pela Nissan na vida real. Estão aparecendo algumas coisas interessantes, por isso estou dando um gás a mais tentando ir bem no virtual.
 
Pensa em continuar no mundo dos games?

Vou seguir nos e-sports, pois talvez seja uma porta de entrada para as equipes e patrocínios. De agora pra frente as coisas vão se consolidar mais, é bom estar nesse meio para me mostrar mais. Assim, quando tiver uma oportunidade eles já vão falar ‘opa, tem esse menino aqui’. É um meio que encontrei que talvez me ajude no real também.

Como foi sua participação no Mundial da F1 de e-sports?

Passei para a final, fui um dos finalistas, mas não consegui ir bem pois tive alguns eventos da vida real próximos e não conseguir praticar muito. Agora, a USF já tinha acabado e consegui me dedicar mais para trazer um melhor resultado para o Brasil.

Qual é o caminho até o título mundial de Gran Turismo?
 
Como todo videogame e e-sport, você começa de casa. Dentro do Gran Turismo Sport tem o modo Sport, que você tem seu nível de pilotagem e quão limpo é seu jogo, se você não bate e permanece na pista terá um nível alto. Aí você vai aumentando o nível ganhando corridas… Fazendo isso, você pode se inscrever e ir para uma sessão da FIA e tem um cronograma das corridas e competições regionais, lotes diferentes. Daí tem temporadas oficiais, no qual você tenta ganhar corridas e soma pontuação até terminar a temporada oficial. Os 30 melhores são chamados para uma final regional, que foi em Las Vegas e fui campeão lá. Os 10 melhores de cada região passam para uma final Mundial, fizeram até uma semifinal lá dentro para diminuir o número de competidores para 16.
 
Quais são os dois tipos de torneio no Mundial de Gran Turismo?

Dentro do Mundial de Mônaco foram dois eventos. Na Copa das Nações você representa seu país e é cada um por si. E depois tem tipo um campeonato de Endurance e você, quando começa no game, escolhe uma marca para assinar. Quando assina com a marca no jogo você não muda mais e tem que ir até o fim com ela. Aí tem 30 e poucas marcas, as top 16 passaram para Mônaco e fizeram aquela corrida. Escolhi a Nissan pois ela dava uma premiação a mais, como viagens para o Japão para conhecer a produtora do jogo, um festival que a Nismo está organizando, que é a divisão de corrida da Nissan. Achei que era uma oportunidade interessante.

Divulgação/Williams Racing
Quais são seus patrocinadores?

Na vida real tenho patrocínios da Usiminas, da Cenibra, da Vale Massa, Barro Minas, Digifarma que vem ajudando, Neodistribuidora, WR Construtora… Que são todas de Ipatinga. Sem ajuda deles, não teria feito a Fórmula 3 Brasileira ano passado, nem esse ano da USF. Tenho muito a agradecer a eles. Não é ainda um valor total de um campeonato, então a gente às vezes passa aperto, mas já é algo e foi com ajuda deles que consegui ir para os Estados Unidos, pois sem eles nem isso teria feito. No e-sports estou associado à equipe Williams. Depois de Mônaco, até fui para a Inglaterra, visitar a fábrica da Williams. Daí geralmente é uma equipe que faz todo management dos pilotos e consegue patrocínio para a equipe. Dentro disso, eles distribuem produtos e essas coisas. Mas como está no começo, ainda não tem um salário. Mas a gente consegue produtos profissionalizados, de empresas boas, como volantes, cockpits e até computadores. Futuramente, crescendo o e-sport no automobilismo, conseguimos até um salário também.

Como foram os bastidores do evento e o encontro com Hamilton?

Estava tentando olhar uma possibilidade de fazer algumas sessões no simulador oficial da Williams, de Fórmula 1. Eles estão querendo que façamos umas sessões também. A gente está agendando e tentando fazer com que a coisa aconteça. Foi bem legal o Mundial de Gran Turismo. Depois teve uma festa, e representantes da Audi estavam lá. O Hamilton, ele não estava na festa e chegou na quinta-feira. Deu uma palestra lá, que foi muito legal e pude até fazer uma pergunta para ele. Foi bem interessante depois ter conversado um pouco com ele. Ele me parabenizando. E provavelmente vou me encontrar com ele na premiação e, com certeza, lá também terá muita gente importante. Sempre estar nesse meio é muito importante, e também tem um lado que, se você tiver um sonho. É sempre bom estar perto dele. Então acho que tem essas duas e continuar caminhando.

Chegar na Fórmula 1 é o principal sonho?

É a categoria principal do mundo. Ser campeão do mundo também na Fórmula 1 seria muito bom. É difícil falar. Amo automobilismo, então gostaria de ser campeão em todas as categorias se pudesse. A Fórmula 1 tem um gostinho a mais talvez.

Qual seu ídolo?

Meu ídolo é o Ayrton Senna, mas me inspiro muito em outros pilotos. Temos que tirar bons exemplos de todas as boas pessoas que estão por perto e pegar o melhor de cada um.

Pretende seguir no e-sports em 2018?

Tudo vai depender, pois os e-sports, como estão crescendo, não sabemos o que vai acontecer no ano que vem, pode ser maior ainda a premiação… Devemos sempre estar de olho, não acomodar com o título pois pode aparecer mais oportunidades também. E no real é tentar seguir nesse caminho até chegar na Indy.

Pensa em se mudar do Brasil?

Ainda moro em Ipatinga, mas estamos tentando acertar a papelada toda para começar a morar nos Estados Unidos, já que estamos competindo lá. É muito caro fazer esse grande número de viagens, é melhor ficar por lá e se mudar, mesmo que seja temporariamente.

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