Futebol Internacional
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The Special One

A história de um tradutor português que se tornou um dos técnicos mais prestigiados do mundo

postado em 05/05/2012 09:14

AFP PHOTO/ PIERRE-PHILIPPE MARCOU

Não espere de José Mourinho humildade. “Graças a Deus me falta modéstia. Não ajuda em nada”. Espere títulos. Já são 19 em 12 anos de carreira desse português de 49 anos que, desde a histórica conquista da Liga dos Campeões pelo Porto em 2004, ele se autointitula The Special One, O Especial, com ênfase no artigo definido. Se o posto de treinador mais bem pago do mundo (cerca de R$ 2 milhões por mês) e o fato de ser considerado um dos melhores da função dão brechas a contestações, os resultados lhe garantem o status de estrela: quarta-feira, ao vencer com o Real Madrid o Campeonato Espanhol com duas rodadas de antecipação, Mourinho se tornou o primeiro técnico a levantar o troféu de quatro das principais ligas europeias – antes já havia sido campeão com o Porto (Portugal), Chelsea (Inglaterra), e Internazionale (Itália).

Vencer é um verbo frequente no dicionário de Mourinho, que ganhou 392 das 565 partidas como técnico desde que assumiu o Benfica, em 20 de setembro de 2000. O aproveitamento é de quase 70% de triunfos, contra 109 derrotas e 65 empates. Em Madri há dois anos, Mou comandou os merengues em 115 jogos, com 88 vitórias, 16 derrotas e 11 empates – campanha satisfatória, mas ofuscada pelo brilhantismo do arquirrival Barcelona, que venceu tudo sob a regência de Messi e cia. Tirar dos catalães a hegemonia nacional foi uma conquista à parte.

Nascido em Setúbal, Mourinho vive o futebol desde o berço. Filho do ex-goleiro Félix Mourinho (que defendeu times locais de menor expressão nas décadas de 1960 e 1970) e de uma professora de primário, Mourinho era de uma família de posses. Mas a queda do regime do ditador Salazar em abril de 1974 levou a família a perder tudo. Aficionado pelo esporte, ele chegou a ser um discreto primeiro volante na década de 1980, defendendo Rio Ave (sob o comando do pai), Belenenses, Sesimbra e Comércio e Indústria. Na década seguinte, passou a ver de perto o trabalho de Félix, se formou em educação física na Universidade Técnica de Lisboa e foi assistente técnico no Estrela Amadora e Vitória de Setúbal.

TRADUTOR NO ARQUIRRIVAL
Além do português, Mourinho é fluente em francês, espanhol e italiano. Foi na função de tradutor que ele pôde ver de perto o trabalho do inglês Bobby Robson à frente do Porto e depois no Barcelona, em 1996. Naquela temporada, Mourinho mudou-se para a Catalunha com a esposa, a angolana Matilde Faria, com quem é casado desde 1989, e os dois filhos: Matilde e José Mário.

Aos poucos foi se tornando figura presente na comissão técnica de Sir Robson nas coletivas de imprensa e até nos palpites do esquema tático: o estilo ofensivo do inglês aos poucos foi se completando com as ideias defensivas de Mourinho. A parceria teve como fruto o título da Recopa Europeia. Com a saída de Robson, Mourinho permaneceu no Camp Nou para auxiliar o substituto holandês Louis van Gaal, quando passou a atuar como assistente técnico.

Em 2000, deixou de ser figurante para ser um dos maiores protagonistas do futebol europeu. Teve curta passagem pelo Benfica e União Leiria antes de levar o Porto aos anos mais vitoriosos de sua história: conquistou a liga nacional com 27 vitórias, cinco empates e duas derrotas e, em seguida, ergueu o primeiro troféu da Liga dos Campeões, em time que contava com o brasileiro Carlos Alberto. Não demorou para partir para o milionário Chelsea, do russo Roman Abramovich – com quem teria uma série de desentendimentos antes de ir para a Internazionale em 2009.

ELEGANTE E PROVOCADOR
Nos quatro clubes, Mourinho repetiu a história de sucesso. Montou uma verdadeira esquadra no Chelsea, que venceu os quatro principais torneios nacionais entre 2004 e 2007. Na Itália, levou a Inter ao título da Liga dos Campeões, desbancando o poderoso Barcelona nas semifinais, e deixou o clube antes do título do Mundial Interclubes. “Achei que ele ia me agradecer por um título que eu dei de presente”, alfinetou o técnico Rafa Benitez, que assumiu seu lugar.

Diante da queda de rendimento do Barcelona no fim da temporada, culminando com o pedido de demissão do técnico Pep Guardiola, Mourinho – que sempre aparece à beira do gramado com terno discretos e os cabelos grisalhos característicos –, caminha parar repetir seus feitos à frente do galático Real Madrid, de Casillas, Khedira, Özil, Kaká, Benzema e Cristiano Ronaldo. “Ganhar um campeonato qualquer um consegue. Mas ganhar, ganhar e voltar a ganhar não é para qualquer um”.