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50 ANOS DO TRI

Há 50 anos, craques de Cruzeiro e Atlético ajudavam a Seleção a conquistar o tri mundial no México

Zagueiro Fontana, volante Piazza e atacante Tostão, do Cruzeiro; e atacante Dadá Maravilha, do Atlético, ergueram a taça em 21 de junho de 1970

postado em 21/06/2020 07:00 / atualizado em 21/06/2020 15:06

(Foto: Arquivo EM)
Desde a inauguração do Mineirão, em 1965, e da conquista da Taça Brasil pelo Cruzeiro, um ano depois, o futebol mineiro mostrou ao país que poderia ser uma alternativa ao eixo Rio-São Paulo e ceder jogadores de qualidade à Seleção Brasileira. Pela primeira vez, os clubes do estado tiveram quatro atletas convocados para uma Copa do Mundo: o zagueiro Fontana, o volante Piazza e o atacante Tostão, do Cruzeiro; e o atacante Dadá Maravilha, do Atlético.

Do quarteto, Tostão foi o único que havia sido convocado e feito gol quatro anos antes, no Mundial da Inglaterra. Mas o craque celeste – um dos maiores ídolos do futebol mineiro – não tinha vaga assegurada no México por motivos médicos. Em 1969, ele havia recebido uma bolada no olho do zagueiro Ditão, do Corinthians, e teve de passar por cirurgia em Houston. Ele só voltaria a jogar três meses antes da competição e só recuperou a vaga de titular ao lado de Pelé dias antes do embarque.




Tostão fez dois gols e foi o destaque na vitória sobre o Peru por 4 a 2, pelas quartas de final. Mas foi o lance de gênio contra a Inglaterra – quando aplicou uma caneta em Bobby Moore – no gol da vitória marcado por Jairzinho, que garantiu o prestígio ao jogador até o fim do torneio.

Para o camisa 9 da Seleção, o maior mérito do time foi conseguir crescer o rendimento jogo a jogo. Durante a campanha, “o que mais me marcou foi a final, contra a Itália. Quando o Brasil fez o terceiro gol, eu comecei a chorar. Eu chorava em campo. Comecei a ter a certeza de que o título seria nosso”, relembra.

Outro detalhe importante ressaltado por Tostão foi o fato de os jogos serem transmitidos ao vivo pela TV para o Brasil. “Havia muita emoção, pois sabíamos que todos estariam vivendo o mesmo momento que a gente. Não foi em cores, mas me impressiona que até hoje falam daquela Seleção.”

Para Tostão, a conquista será eterna. “Foi e é marcante. Os pais contam para os filhos. Os mais novos não acham muita graça, mas não tem nada disso não. Nosso time era bom, muito bom. Passei a semana dando entrevista sobre a nossa conquista, não só para a imprensa brasileira, mas do mundo inteiro. Isso me fascina.” No retorno pra casa, Tostão sentiu uma emoção diferente com toda a festa preparada para os tricampeões do mundo. “Quando chegamos no Brasil foi que sentimos o que tinha significado para o nosso povo, o que tinha sido a conquista. Fomos recebidos em Brasília.”

(Foto: Arquivo EM)


Ele se lembra do presente dado pelo então prefeito de São Paulo aos jogadores e parte da comissão técnica: “O Paulo Maluf nos deu um Fusca, um para cada jogador. Lembro-me de que chegaram a processá-lo para que ele custeasse as despesas. Ganhou a ação na Justiça. Mas esse Fusca foi um símbolo pra mim, de uma grande conquista. Fiquei com esse carro por muito tempo.”

(Foto: O Cruzeiro/Estado de Minas)


Titular improvisado

Outro que teve participação importante foi Piazza, volante do Cruzeiro. Na Seleção, porém, foi deslocado para a zaga, para jogar ao lado de Brito, deixando o companheiro Fontana no banco. “Em um jogo-treino, eu atuava pela seleção B. O Leônidas estava machucado e o Baldocchi torceu o tornozelo. Imediatamente, eu tomei iniciativa e fui atuar como zagueiro. Terminei o treino ali. A partir de então, com dois lesionados, faltava um jogador para completar a equipe na defesa nos coletivos. Foi quando o Zagallo viu que a minha participação na zaga poderia contribuir. Ele me perguntou se eu poderia colaborar e eu aceitei. Passei a treinar de quarto-zagueiro. A partir daí, fui muito elogiado”, relembra o ex-jogador.



Na visão de Piazza, o título mundial ajudou a amenizar a difícil situação que vivia o país em 1970: “Vivíamos um período muito complicado, com censura e repressão. Mas entendíamos que o futebol era o principal, para darmos alegrias ao povo. A Copa do Mundo exige uma preparação bem-feita, já que você pode ser eliminado se errar num momento. Por isso, lutaríamos muito para tentar trazer o título. Sou muito grato de ter feito parte dessa geração”.

Fontana seria o titular na Copa, até para aproveitar o entrosamento com Brito nos tempos de Vasco – eles jogaram juntos de 1962 a 1968. Mas, no fim das contas, Zagallo optou por Piazza improvisado. O único jogo de Fontana na Copa foi a vitória sobre a Romênia, quando o companheiro foi deslocado para o meio-campo.
Nesse jogo, o Brasil cometeu algumas falhas defensivas e o cruzeirense não voltaria a jogar mais no Mundial. Ele encerrou a carreira em 1972, aos 31 anos, e morreu em 1980, depois de sofrer infarto durante uma partida com amigos.

POLÊMICA E DEMISSÃO

Sem ter participado de um único jogo naquela Copa, o folclórico Dadá Maravilha foi pivô da polêmica que mudaria o comando da Seleção Brasileira a poucos meses do início da competição. Com João Saldanha no comando, ele havia sido preterido das convocações nos jogos preparatórios e nas Eliminatórias. Atuando pelo Atlético, ele marcou o gol da vitória por 2 a 1 sobre o time verde-amarelo em amistoso em 1969, com Pelé defendendo o Brasil. “O presidente Médici estava assistindo ao jogo e comentou depois: 'Por que este atacante, que é o melhor do país, não está na Seleção?'. Dias antes, ele havia me visto num jogo no Sul, contra o Inter, e gostou muito. Mas o João Saldanha havia falado que o Brasil tinha pelo menos 10 centroavantes melhores que eu. Ele acabou demitido e dizem que foi por minha causa. Eu fui para a Copa, sendo convocado pelo Zagallo.”

Dadá chegou à Copa como artilheiro do Mineiro pelo Atlético, com 58 gols em jogos oficiais pelo clube no ano anterior. Apesar disso, ainda era uma figura tímida no meio do qualificado time titular. “Cheguei com muita humildade na Seleção. E fiquei encantado com o ambiente. Pelé, Rivellino, Jairzinho, Tostão e Gerson eram craques que demonstravam simplicidade. Fiquei deslumbrado com tudo isso, até porque era fã deles. E aprendi muito com todos. Mas, ainda assim, no meio daquelas feras, tinha que sobrar um lugar para mim.” 
 

Craques que ficaram no Brasil


Se a Copa do Mundo de 1970 apresentou ao planeta a melhor geração de jogadores da história, outros craques que desfilavam pelos gramados do país acabaram ficando de fora da lista de Zagallo. Um deles é o armador Dirceu Lopes, que levou o Cruzeiro à memorável conquista da Taça Brasil de 1966 vencendo ninguém menos do que o Santos de Pelé por 6 a 2, no Mineirão. Zagallo preteriu o craque celeste da competição alegando que já havia muitos atletas para a posição. O mineiro de Pedro Leopoldo só jogaria 19 vezes com a camisa verde-amarela, tendo participado da Copa América de 1975, aos 29 anos. Quem também ficaria de fora pelo mesmo motivo foi o palmeirense Ademir da Guia, tido como o maior jogador da história do time alviverde. O zagueiro Djalma Dias, companheiro de Pelé no Santos, foi titular em todos os jogos das Eliminatórias, mas acabou ficando fora, já que o treinador preferia Brito como titular. Luís Pereira, também zagueiro, ídolo do Palmeiras, foi mais um que poderia ter atuado no México. Como Dirceu Lopes, o goleiro Raul Plasmann nunca foi lembrado por Zagallo.  
 

A festa em BH

Com pouco mais de 1 milhão de habitantes em 1970, Belo Horizonte viveu um carnaval fora de época com a chegada dos quatro campeões mundiais Piazza, Tostão, Fontana e Dadá Maravilha. A Seleção Brasileira havia desembarcado em Brasília no começo da tarde do dia 23 de junho, uma terça-feira, dois dias depois de vencer a Itália e garantir em definitivo a Taça Jules Rimet. Depois de desfile pelas principais ruas da capital federal e de almoçar com o presidente Emílio Garrastazu Médici, os jogadores seguiram para o Rio de Janeiro, onde foram novamente recepcionados com festa e passaram à noite. No dia seguinte, o quarteto que atuava em Minas chegou no fim da manhã ao aeroporto da Pampulha, sendo recepcionados por familiares e dirigentes de Atlético e Cruzeiro, com muita música executada por uma charanga. De lá, eles seguiram num carro do Corpo de Bombeiros até a Igreja de São José, na Avenida Afonso Pena, onde foi montado um palanque. Os campeões receberam homenagens do governador Israel Pinheiro e do prefeito de Belo Horizonte, Sousa Lima. Mesmo aparentemente cansados da viagem de volta do México, os jogadores permaneceram até o fim da festa.

 

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