Rodolfo Fernandez conviveu com Maradona por 50 anos e só vende camisas do Argentinos Juniors
É como se um bairro inteiro fosse uma biografia, e cada rua revelasse as páginas de uma história viva. O Corinthians vai visitar o Argentinos Juniors nesta quarta-feira (24), pela Libertadores, em um quarteirão cercado pelos feitos e pelas lendas de Diego Armando Maradona. É o lugar em que ele é mais amado em toda a Argentina, e onde ninguém é tão amado quanto ele — ou Ele, com maiúscula.
A começar pelo estádio em que o Corinthians vai jogar, chamado justamente Diego Armando Maradona. O campo ocupa um quarteirão no meio do bairro residencial de La Paternal, um pedaço tranquilo de Buenos Aires, a cerca de 20 minutos do trânsito e do barulho do centro. Ali, o sentimento por Diego é de adoração.
"Eu vi a primeira e a última vez de Maradona aqui"
A uma quadra do estádio, dentro de uma loja de artigos esportivos, um senhor se senta atrás de um pequeno balcão. Ele está cercado de camisas, autógrafos e fotografias de vários jogadores que fizeram história no Argentinos Juniors. Ali, nada que está à venda é de outro clube. Sua paixão por Maradona é tanta que ameaça escorrer dos olhos.
Rodolfo Fernandez, de 85 anos, foi uma das testemunhas da peneira do pequeno Diego no Argentinos Juniors, em 1969. Cinquenta anos depois, em 2019, também estava presente na última vez em que Maradona visitou o estádio do clube. Conheceu todas as casas do camisa 10, é próximo da família até hoje e tem as histórias e as lembranças para provar.
Fernandez poderia falar dias sobre Diego, sobre a saudade, as pessoas que ajudava sem nem conhecer, a última conversa, o abraço apertado que parecia uma despedida e até do gol mais bonito que fez –- contra o Huracán, diz, não contra a Inglaterra.
— Te conto uma história, e poderia contar mil. A última vez que nos vimos foi uma conversa de três horas. Perguntei porque ele nunca tinha vindo tomar um café com Francis e comigo, e ele me disse ‘porque são as únicas pessoas a quem não posso mentir e sei o que perguntariam’. Respondi: ‘então me olhe nos olhos e diga que agora torce mesmo para o Boca Juniors’. E ele disse ‘por isso mesmo que não fui, porque não poderia mentir’ —conta Fernandez.
Pizza à Maradona
Mesa em que Maradona comia virou peça de decoração
Bem ao lado da loja de Fernandez, um restaurante todo decorado com objetos de futebol se apresenta como “a lanchonete de Diego”. Não é exagero: Maradona costumava jantar ali quando o estabelecimento era a pizzaria La Cuneta. A mesa em que ele se sentava é mantida como decoração, com uma estátua sua sobre uma bandeira argentina. Também há um sofá original de uma das casas do camisa 10.
Pelo salão, painéis com o rosto de Maradona se confundem com cartazes, fotografias e tudo o que se pode imaginar que faça referência a ele. As mesas são decoradas com Copas do Mundo em vez de flores e têm imagens de lances icônicos. O menu tem medialunas, empanadas e pizzas, é claro.
Um santuário maradoniano
Diego tem santuário debaixo da arquibancada do estádio que leva seu nome
Em uma das calçadas do estádio, um pequeno portão revela uma pequena sala com uma pintura de Maradona ao fundo. É um local sacro-futebolístico. Três bancos de igreja e a pequena imagem de uma santa estão cercados por camisas, bandeiras e cachecóis de vários times, pendurados nas paredes.
O santuário foi criado no final de 2020, poucas semanas depois da morte do ídolo, e desde então fica aberto ao público. Quem quiser pode deixar algum presente com alguma mensagem, como a bandeira do Brasil que agradece Diego por tudo o que fez pelo futebol. No bairro em que ele começou, a autoproclamada “la tierra de Dios”, Maradona é eterno.
Corinthians vai jogar no bairro em que se come, reza e ama como Maradona
