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'Modernização', meta de títulos, reforços e crise no rival: dirigentes projetam ascensão e consolidação do Atlético

Vice-presidente Lásaro Cândido da Cunha e diretor de futebol Rui Costa concederam longa entrevista exclusiva ao Superesportes/Estado de Minas

<i>(Foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)</i>


Ao se deparar com os repórteres, Lásaro Cândido da Cunha brincou: “Não vou responder nada, perguntem para este cara aqui”. O vice-presidente do Atlético apontava para Rui Costa. O diretor de futebol alvinegro é daqueles dirigentes que, para blindar o elenco ou o próprio trabalho, sabem, com maestria, lidar com a imprensa e eventuais questionamentos ou críticas.

Depois dos cumprimentos, os dois se sentaram lado a lado. A pressa que aparentavam diante do primeiro contato com os jornalistas desapareceu assim que a entrevista começou. Lásaro e Rui falaram sobre o Atlético durante uma hora e quarenta minutos, em declarações que começaram a ser reproduzidas nessa sexta-feira e continuarão a ser publicadas em matérias do Superesportes/Estado de Minas.

Os dirigentes falaram sobre o processo de modernização do Atlético, adequação à nova realidade financeira, metas de títulos, busca por reforços, efetivação do técnico Rodrigo Santana, ‘caso Fred’ e crise vivida pelo Cruzeiro. Em outras reportagens, leia também sobre: construção da Arena MRV, críticas ao Mineirão, mudanças nas categorias de base e alterações na relação com o Conselho Deliberativo sobre as finanças do clubeSe não conseguir ver os vídeos, clique aqui.

Leia a seguir parte da entrevista de Lásaro Cândido da Cunha e Rui Costa ao Superesportes/Estado de Minas

Lásaro Cândido da Cunha sobre processo de modernização do clube

O Atlético, ao longo desse tempo, desses últimos dez anos, especialmente, estava numa situação dramática. E nós conseguimos, esse grupo todo, colocar o clube numa etapa, numa fase vencedora. Agora, nos últimos anos, nós precisamos passar por um outro processo. Um processo de modernização do clube, de profissionalização completa. Nesta gestão, o presidente Sérgio Sette Câmara tem pretendido conduzir o clube nessa direção. Para isso, ele conseguiu profissionais, a começar do Rui, no futebol, futebol de base, nas diretorias financeira e um CEO, para que o clube possa, nesses processos, capacitá-lo para vencer etapas e disputar em alto nível com grandes clubes que chegaram a essa condição. 

O Atlético tem uma estrutura incomparável. Uma estrutura física e muitos recursos humanos, mas precisava caminhar para essa direção. No início do ano nós fomos muito atacados, criticados, de tentarmos levar o clube para essa direção. E agora já começam os primeiros sinais de que esse processo tem que, ao contrário, ser aprofundado. Isso depende, obviamente, de todos os conselheiros, da torcida, especialmente. 

Rui Costa sobre processo de modernização do clube

Eu penso que chega de uma forma muito contundente, muito positiva. Porque quando você tem práticas atualizadas, modernas e corretas de gestão, todos aqueles que praticam isso no seu dia a dia se valorizam no mercado. Então, desde os primeiros contatos que eu tive com os dirigentes do Atlético, especialmente com o presidente Sérgio Sette Câmara e com o Lásaro, e depois com todos os profissionais que eles me apresentaram no dia a dia do clube, eu pude constatar sempre a mesma coisa. Um clube imbuído em fazer o melhor, em buscar sim a excelência desportiva, porque o core business do clube é esse. Mas com ritos muito claros de processos transparentes, de regras de compliance, de busca por um equilíbrio econômico-financeiro. 

Quando você tem uma diretriz de cima para baixo, de uma forma muito verticalizada, que te dá as garantias de que se você for cuidadoso com o trato das questões do clube você terá cada vez mais autonomia para fazer as intervenções que você precisa fazer, isso é excelente para qualquer gestor. O que eu identifiquei desde que eu cheguei aqui no Atlético é que a paixão do torcedor é respeitada na sua plenitude, mas a paixão não nos move internamente no clube. Ou seja, nós não fazemos uma gestão com paixão. Nós somos apaixonados pelo nosso trabalho, por nosso clube, mas não trazemos essa paixão para a tomada de decisão, para o comprometimento financeiro do clube. 


Lásaro sobre busca por transparência no Atlético

É um projeto do presidente que a gente tenha já a partir do segundo semestre, balancetes emitidos pelo menos a cada semestre ou trimestre. Para que a torcida, os conselheiros, a comunidade de um modo geral, possa acompanhar os processos. Mas é sempre oportuno dizer que transparência não significa também que a gente divulgue todas as etapas de uma negociação, porque pode comprometer negociações que o clube trabalha e faça, eventualmente. 

Lásaro sobre mudança de postura da diretoria

Eu estou há dez anos no Atlético. E várias pessoas começaram a articular, especialmente depois da fase do Profut, em 2015, que o clube teria que, em determinado momento, ingressar em uma outra etapa. Isso é um processo de convencimento e de necessidade. Nos processos do jurídico eu fui bastante criterioso em dizer que a gente precisava ter responsabilidade contratual. Quando eu cheguei no clube, em fevereiro de 2009, era uma desorganização completa. E aqui não vou atribuir responsabilidade a quem passou, porque dentro das suas circunstâncias, o futebol brasileiro era mais ou menos assim. 

Mas, desde que começou o processo em que um clube de futebol profissional deveria atender a uma série de exigências para participar de competições, por exemplo, de regularidade fiscal, era natural que a gente tivesse que avançar. E nesta gestão, o Sérgio me procurou, dizendo, ‘olha, eu recebi um convite das diversas lideranças e pretendo disputar a eleição’. Eu falei, ‘quais são suas propostas para o clube?’ Porque, até hoje, nós evoluímos muito, mas agora precisamos de um processo mais, digamos, completo de profissionalização. E disse a ele ‘pela experiência que nós tivemos no Profut, os clubes que não se organizarem, que não tiverem responsabilidade, vão sofrer’. Isso produzirá consequências muito graves em qualquer clube. 

E ele fez o seguinte diagnóstico: ‘o meu pensamento é que precisamos qualificar, profissionalizar o clube para deixá-lo melhor. Precisamos sair daqui melhor’. Como? Não é contratando de qualquer jeito. O projeto seria uma profissionalização. E de cara já pensou num processo de controle, que foi o SAP (Sistemas, Aplicativos e Produtos para Processamento de Dados), que nós apresentamos no conselho esse relatório. É a descrição completa e um rastro de qualquer registro de despesas, de gastos, tudo. Isso vai facilitando o processo. 

Rui Costa sobre fair play financeiro e a gestão no Atlético

No novo processo gestão, você tem que se aproximar da razão em detrimento da paixão. Você não vai poder exercitar sua paixão se não tiver um clube racionalmente gerido. A partir de 2020, teremos um período de transição que vai desembocar em 2021. No Brasil, ao que tudo indica, está previsto o fair play financeiro em sua plenitude. Ou seja: as gestões que vão ter cuidado com o seus orçamentos, as gestões que vão ter seu compliance estabelecido, suas regras claras, critérios para vender, para comprar e celebrar contratos, terão mais poder de competição. Ou seja, vai poder contratar mais, vai poder participar de melhores competições. 

Todos nós que fazemos uma gestão transparente e honesta - quando digo ‘nós’, falo de inúmeros colegas que tenho em outros clubes que adotam essa prática - vamos ser, ao fim e ao cabo, mais vencedores que os outros. Isso interessa ao torcedor, interessa à paixão. Hoje, nem sempre o clube que é melhor gerido é campeão. Às vezes, aquele que é pessimamente gerido conquista títulos importantes, que movimentam a roda, fazem o torcedor ficar com uma ilusão muito grande e consumir produtos. Isso aumenta muito o processo de paixão, mas compromete a longevidade do clube. 

Qual é a nossa expectativa? Que aqueles clubes que estabeleçam como pedra fundamental da sua vida, da sua gestão, estar de acordo com o que exige a lei, estar de acordo com o que estabelecem as regras mais claras de legislação orçamentária, com seus conselhos fiscais mais estruturados - nada que não seja a obrigação de um clube, de uma empresa - eles vão ter a reciprocidade competitiva, que hoje não existe. Vai fazer com que o torcedor tenha muito orgulho das conquistas, das taças que ele levantou. Mas ele vai saber que até esse caminho o clube foi rigoroso nas suas escolhas. 

O torcedor cada vez mais vai exigir que o clube tenha excelência desportiva, mas ele vai entender que não pode contratar um jogador por 20 milhões de euros ou que ele não pode fazer um contrato de um jogador de 30 e poucos anos que vai custar R$ 40 milhões em três anos. Por que? Porque isso vai tirar ele da Libertadores, vai impedir ele de ser campeão brasileiro, porque isso vai fazer com que o outro clube que está fazendo tudo certo vença sistematicamente as mesmas competições que disputamos. Isso vai acontecer de uma hora para outra? É claro que não. Nós ainda vamos continuar vendo os projetos com maior capacidade de investimento ganhando. Não tenho dúvida disso”

Lásaro relembra crises no Atlético e fala sobre situação do Cruzeiro

O projeto nosso é que o Atlético não passe essas experiências às quais o Atlético passou em determinado momento da sua existência. Em relação a outros clubes (Cruzeiro), o que a gente acompanha é pela imprensa. A gente não tem maiores detalhes. A gente precisa verificar o processo para ver como vai evoluir. Mas o futebol como um todo, é importante que ele tenha respeitabilidade. O fato de ocorrer em outro clube problemas só nos conduz na direção que a gente deve caminhar para a nossa profissionalização, para a nossa transparência, para a nossa evolução e para a nossa independência financeira e que nos vai capacitar para manter esse patamar cada vez mais alto. Essa é nossa compreensão. Não dá para fazer nenhuma outra avaliação, porque a gente tem apenas informações. Não temos os desdobramentos e, portanto, não temos condição de fazer essa avaliação

A gente não está muito preocupado com o que acontece no clube A ou no clube B. A gente está preocupado que o Atlético precisa subir um degrau - ou vários - para poder competir num parâmetro de âmbito nacional e internacional num nível elevado. Porque a gente tem consciência de que se isso não for feito, o clube, o nosso clube, o Atlético, passará por problemas que a gente não quer que ocorram. 

Eu e o Sérgio estamos lá transitoriamente. Eu já vivi situações, em 2009, quando entrei, dramáticas. Situações de absoluta dramaticidade. Passamos por processos complicados, tivemos conquistas. Mas a gente precisa evoluir. A gente sente que este é o processo. A gente já vem falando isso há algum tempo. Agora, isso não é só um processo de Sérgio, presidente, de Lásaro, vice, de Rui. 

Isso envolve conselheiros e especialmente a nossa torcida. Nossa torcida tem que se envolver também neste processo, reconhecer as pessoas que lutam para que o clube tenha substância para que ele possa continuar crescendo e conseguir as conquistas com respeito às regras, porque se não for assim daqui a pouco a gente não estará nem falando disso. Temos exemplos no futebol brasileiro que são dramáticos. E acho que as pessoas não entenderam até agora que, se isso não ocorrer, as tragédias desportivas serão cada vez mais dramáticas. É esse o nosso pensamento.


Rui Costa sobre meta de títulos no Atlético

Trabalho para o nosso torcedor. Meu trabalho, fundamentalmente, é gerar expectativa, sempre de forma muito responsável e muito coerente. O produto final de tudo o que nós fazemos aqui, seja de forma estatutária, seja de forma profissional, é o torcedor, é ver o torcedor alegre. Eu falei muito de paixão e razão aqui, mas eu, na minha racionalidade, sei o quanto é importante conquistar títulos no Atlético. E nós trabalhamos para isso. 

De forma alguma, ao pensar o futuro, vamos abrir mão do presente. O presente do Atlético é conquistar. O presente do Atlético é ser protagonista no cenário nacional e internacional. E isso é a base do meu trabalho. É para isso que eu sou provocado, é isso que me faz mobilizar os meus colegas de trabalho, os colaboradores do clube que estão de alguma forma vinculados a mim dentro de um processo de responsabilidade de gestão. Portanto, tenho muito claro que nossa meta este ano, por exemplo, desde que eu cheguei aqui, era intervir em métodos, era fazer uma análise muito criteriosa do elenco que temos, que é um elenco muito competente. 

Por isso que eu insistia muito que, se eu chegasse aqui com uma semana e contratasse oito jogadores, eu não seria um gestor adequado para um clube da grandeza do Atlético. Seria desconsiderar tudo o que este clube de mais de 100 anos fez, como se a minha chegada fosse um divisor de águas. Não. Eu tenho que me adaptar à grandeza do clube. Eu tenho que chegar no clube e rapidamente entender o que eu profissionalmente, com a capacidade que tenho, posso agregar nesse clube, e não transformar o clube, porque não tenho essa opção profissional. Mas nós identificamos problemas, identificamos soluções dentro do clube, temos um projeto muito claro de que nós temos que fazer processos que não são imediatistas, mas sem desconsiderar um fato que é fundamental: aqui tem que se ganhar, aqui tem que se conquistar.

Rui Costa comenta meta de títulos traçada pela diretoria

Este ano. Temos chance de conquistar uma Copa do Brasil, temos a chance de conquistar uma Copa Sul-Americana. Eu sei o quanto significa essa competição, porque recentemente tive o privilégio de ser campeão dessa competição e sei o que isso agrega para o clube, o que valoriza todos os profissionais, do porteiro ao grupo de atletas e aos executivos, aos diretores, à gestão do clube como um todo. Por mais que aqui estejamos o Lásaro e eu - e evidentemente o Lásaro numa hierarquia muito superior à minha - falando de processos de gestão, de racionalidade, de critérios, nós sabemos que quem veste esta camisa, que quem usa este rótulo no peito, tem que ganhar. Mas ganhar a qualquer custo? Não. Ganhar comprometendo o futuro do clube? Não, de jeito nenhum. Foi isso que aprendi aqui, na minha carreira e foi isso o que foi estabelecido a mim como uma meta a ser perseguida. 

O que nós queremos agora? Conquistar a Copa do Brasil. O que nós queremos agora? Conquistar, sim, o Campeonato Brasileiro. O que nós queremos agora? Conquistar, se possível, também a Copa Sul-Americana. Essas são as metas que estão estabelecidas. São factíveis? Elas são viáveis? Talvez, neste primeiro momento, elas sejam mais um desejo do que algo factível. Mas quem veste a camisa do Atlético, quem está neste clube, não tem limite para sonhar. Alguém aqui nesta sala pode deixar de acreditar que o Atlético pode ser campeão dessas três competições? Não. Pela grandeza do clube, pelo que temos, pelo que vamos fazer, pelo que já se fez neste clube. 

A meta é conquistar títulos. Agora, nós não vamos - e eu vou repetir, mesmo que seja enfadonho - fazer qualquer coisa para conquistar esse título. Por que? Porque isso pode representar a inviabilização desse clube não no futuro próximo, mas em médio prazo, por tudo o que falei antes naquela questão de como o futebol brasileiro está evoluindo.


Rui Costa sobre busca por reforços no Atlético

Eu sempre digo que o Atlético tem um grande elenco. Não é para fazer média com jogador, porque a conduta que tenho no dia a dia que fideliza e consolida uma relação com o atleta. Falo isso porque é a verdade. Mas o Atlético tem que sempre buscar jogadores de alto nível, conhecidos ou pouco conhecidos, mas que possam agregar algo diferente daquilo que temos em termos de perfil, de características, às vezes até para estimular uma competição. O atleta vive no ambiente competitivo o tempo todo.

 Estamos atentos ao mercado? Sim. Entendo que precisamos nos preparar para questões de médio e longo prazo, eventuais saídas. Quando cheguei no Atlético, encontrei um elenco com muitos jogadores, mas não necessariamente muitas alternativas. Passamos por um processo de depuração, não de pessoas e qualidade técnica, mas de adequacão financeira. Para trazer jogadores, eu preciso diminuir, de alguma forma, essa equação toda. Chegamos a ter 46 atletas, estamos com 36 e caminhamos para 33, 32. Se eu puder trazer jogadores que vão ampliar as opções para o Rodrigo Santana ter um perfil diferente, eu vou fazê-lo.

Rui, em quais posições o Atlético precisa de reforços?

Difícil te dizer isso. Difícil não é, posso responder as posições em dois segundos, mas não devo dizê-lo. Dentro da corporação, nossa transparência é absoluta, mas a nossa concorrência é muito dura. Temos que observar o mercado. Os concorrentes do Atlético são o Flamengo, Grêmio, Palmeiras, Corinthians, São Paulo, enfim, todos os clubes com muito poder aquisitivo. É inevitável. Todo diretor executivo fica de olho no que os outros estão fazendo, porque o mercado é muito restrito. 

Mesmo que eu queira ser legal com o nosso torcedor, falar que estamos trazendo um jogador em tal posição, alguém pode pegar o telefone e seduzir o atleta, falando que tem mais condições. Eu não posso fugir daquilo que o meu clube, a minha diretoria e o meu presidente me estabelecem como diretriz orçamentária. Eu perco o jogador, mas não faço loucuras. Não estamos fazendo loucuras. Pode surgir alguma situação, não vou mentir para o torcedor. Estamos tratando algumas situações, mas não posso dizer o nome e nem a posição.

Rui Costa fala sobre período de contrato de Rodrigo Santana (até o fim do ano) e aumento salarial do treinador

Não vejo o contrato como curto, pelo contrário, criamos condições para que ele seja longo, mais longo do que é usualmente quando um jovem treinador assume um clube da grandeza do Atlético. E ele sempre soube disso. O mais importante é que o Rodrigo nunca analisou outra situação que não fosse a verdade. Quando a gente entendia que ele deveria ser tratado publicamente como interino, ele sabia disso. Ele sabia quais foram os treinadores que eu me encontrei. Não precisaria fazê-lo, mas achava importante. Como ele trabalharia com esse treinador, eu tinha que ter, no mínimo, sensibilidade de dizer. Não foi discurso para agradá-lo e agradar a torcida. 

No dia a dia, ele reuniu condições, experiências e posturas de quem poderia nos conduzir numa temporada importante para nós. Nunca foi uma improvisação. Conversamos para saber como poderíamos construir um contrato que desse legitimidade necessária a ele. O Rodrigo passa a ter outra remuneração, completamente diferente da que ele tinha no clube. Isso é importante, senão vira só discurso. Temos que ter plano de ação. 

Criamos um mecanismo que, se tudo der errado no futebol, e às vezes isso acontece, a gente possa ter um profissional, que merece estar conosco, por um longo período. A não ser que ele não queira. Evidentemente, se tudo der certo, vamos sentar e conversar para que ele tenha uma remuneração, um contrato nesses patamares, que nem sempre são garantia de longo tempo no clube. Eu já vivi isso, treinadores com salários altíssimos, contratos longos e que, por essas coisas do futebol, vão embora depois de quatro, seis meses. A ideia foi sempre manter uma coerência daquilo que dissemos e praticamos. Por isso, o Rodrigo tem contrato até o fim da temporada 2019, mas poderá ter mais um ano ou dois.

Lásaro detalha bastidores da reunião de rescisão entre Atlético e Fred


Para ficar bem claro qual é a discussão: o Fred tinha um contrato com o Atlético que iria até o final de 2018. Ele ganhava quase R$ 1 milhão, e as pessoas sabem disso. A presidência deliberou e entendeu que não há condições. Nós vamos ver o que podemos fazer. Apareceu uma proposta do Flamengo. O Flamengo aventou a possibilidade de contratar o Fred. Qual foi o interesse dele? Ele tinha mais um ano só de contrato. Ele teria dois ou mais, ganhando o mesmo. O Flamengo estava disposto a pagar. Nessa transação, o Flamengo ia ceder um ou dois jogadores para o Atlético. Isso, então, caminhou dessa forma. Em razão disso, o Atlético foi logo fechando um pré-contrato com o Ricardo Oliveira, já deixando pronto. 

Pois bem, a negociação (de saída de Fred) estava toda pronta e encaminhada, quando, de repente, eis que o Fred disse que não iria mais para o Flamengo, mas que, mesmo assim, queria fazer a rescisão contratual. Foi nesse momento… Estávamos eu, o presidente Sérgio Sette Câmara, o agente do jogador (Francis Melo) e o Lucas Ottoni (advogado do Atlético). O presidente deu murro na mesa e disse: ‘Ah, isso eu não aceito. Quer dizer que você está querendo mudar, então. Você vai sair daqui e vai fazer contrato ali, ó (indicando que seria o Cruzeiro)’. Eu falei: ‘Não tem nenhum problema. Vamos fixar a multa’. 

Eis que o agente e seu advogado não colocaram qualquer obstáculo: ‘Não tem nenhum problema’. Qual é a multa do contrato? R$ 100 milhões. Ou seja: se ele tivesse os direitos econômicos vendidos, seria R$ 100 milhões (o preço). Então, para não ter nenhuma discussão de que é um valor abusivo, vamos colocar R$ 10 milhões. Para quem ganha quase R$ 1 milhão por mês, é parâmetro normal. Pois bem, (perguntei): ‘Vocês concordam que vamos fixar R$ 10 milhões de multa se ele for para a mesma praça (Cruzeiro)?’. (Responderam) ‘Concordamos, sem problema nenhum’. (Eu disse) ‘Mas há uma outra questão: nós vamos eleger uma câmara arbitral. Vocês concordam?’. (Responderam) ‘Concordo’. O advogado deles (Fred), super qualificado e que inclusive é advogado hoje da parte tributária do clube lá, do Cruzeiro, era o doutor Fernando. 

Nós redigimos em letras claras, objetivas, dizendo assim: ‘Vamos antecipar a rescisão contratual?’. Vamos. Quais são as condições para essa antecipação? Primeiro: você (Fred) tem a receber R$ 1.950.000,00. Vamos parcelar isso em dez vezes, você concorda? (Respondeu) Concordo. O Atlético vai abrir mão, então, do contrato que tem até o final do ano. Mas se você mudar para o outro clube, você vai pagar a multa de R$ 10 milhões valendo até o final do nosso contrato, está certo? (Responderam) Está certo. Colocamos tudo no papel registrado. 

Assinamos hoje. No dia seguinte, ele foi para lá (Cruzeiro). No nosso contrato de rescisão, colocamos uma cláusula que ele deveria dar ciência ao clube lá (Cruzeiro) que existia essa multa. Embora fosse ele o responsável, ele deveria dar ciência da multa. Foi o que ele fez. Nos mandou uma notificação, deu ciência ao clube: ‘Olha, clube, estou sendo contratado, mas eu tenho uma multa de R$ 10 milhões. Só para você ser informado. E eu só vou aceitar o contrato se você se responsabilizar a me ressarcir. Você assume?’. 

Eis que tem um documento em que o presidente do Cruzeiro e o vice-presidente (de futebol) do Cruzeiro, o senhor Wagner (Pires de Sá) e o senhor Itair (Machado), assinando o documento para ele nos seguintes termos, mais ou menos: ‘Assumo integralmente a responsabilidade de pagar os R$ 10 milhões e tal, dando a conta corrente e tal, e dizendo que o clube declara que não vai discutir isso em corte alguma’. Tem assinatura, com firma reconhecida e tudo. E mais: o jogador exigiu que um contrato em cartório fosse feito, em que o Cruzeiro daria a conta corrente como garantia, para saque na conta corrente. 

Eis que o jogador Fred não cumpriu com nada. O que fizemos? Fizemos, então, uma cobrança na Corte Arbitral. Pedindo o que? Os R$ 10 milhões corrigidos e compensando R$ 1.950.000,00 que ele teria de crédito ao longo dos períodos, em dez meses em que foram parcelados. Quando ele foi cobrado, eis que aparece o Cruzeiro, primeiro tentando ser réu também da ação. Nós não aceitamos, porque não é réu da ação. Aí a corte arbitral aceitou que ele (Cruzeiro) fosse assistente, obviamente porque tem responsabilidade de ressarcir. Para nós não interessa (quem vai pagar). Vamos cobrar do Fred. Fizemos toda a tramitação. 

Há lá, nos autos, várias outras confissões ainda, como uma declaração do senhor Itair Machado, que assinou o documento, dizendo assim: ‘Essa multa é baixíssima, esse é um jogador de R$ 20 milhões pelo qual tínhamos que pagar’. Qual a tese do Fred? É que a Lei Pelé e especialmente a lei da FIFA proíbe que o clube interfira no seu destino. Mas tanto não interferimos que ele foi para o clube e o clube assumiu a responsabilidade de pagar os R$ 10 milhões exatamente no período. 

Aí veio a sentença com 53 laudas dizendo o seguinte: a unanimidade, os cinco julgadores… O Cruzeiro arguiu a suspeição de um que trabalhou no Atlético. E ele saiu, entrou outro. A unanimidade, os cinco, condenou o Fred ao pagamento da multa dos R$ 10 milhões, mandando compensar os valores. Eis que ele ingressa com embargos declaratórios. Ele não entendeu as 53 laudas. Aí ele entrou com embargos declaratórios. 

A turma de julgadores, de novo, está muito claro, por isso, e ao final condenou, corrigindo monetariamente, mais juros e honorários dos advogados, que é 5% do valor global. Isso está hoje acima de R$ 12 milhões. Ele pode recorrer. Existe a possibilidade de recurso no Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem. Existe uma possibilidade de reversão (da decisão)? Existe. Isso aí faz parte, tanto é que existe o recurso. Agora, os fatos são esses. 

Tem mais fatos lá ainda, de confissões, uma atrás da outra. Então, não há seriamente - e estou falando seriamente, a não ser que queiram lançar um factóide - que é competência da justiça do trabalho. Não é competente para isso. É a câmara arbitral. Foi eleita a câmara arbitral. A consequência normal se alguém for para a justiça comum ou a justiça do trabalho é ela dizer que é incompetente (para julgar o caso), que a competência é da corte arbitral. O processo é esse. Agora, você faz a coisa tudo absolutamente respeitando as regras. Respeitando as regras, espera-se que o resultado seja final dentro desse cumprimento das regras. Mais nada além disso.

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